Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

"Arcane" é ótima até para quem não conhece "League of Legends"

Lançada pela Netflix, "Arcane" cria histórias pregressas para os personagens do jogo "League of Legends" em um universo rico e cheio de camadas interessantes

Vitória
Publicado em 08/11/2021 às 16h28
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Série "Arcane", da Netflix, baseada no universo do jogo "League of Legends". Crédito: Netflix/Divulgação

Talvez você, leitor habitual desta coluna ou alguém que chegou aqui via algorítimo de Google ou redes sociais, não saiba exatamente o que é o “League of Legends”, e não há problema algum nisso. Carinhosamente apelidado de LoL, “League of Legends” é o jogo mais popular do mundo. Sua gratuidade e seu formato de batalhas multiplayer em arenas online (Moba, em inglês) com ótima jogabilidade possibilitaram o jogo da Riot Games se tornar um fenômeno, com torneios globais e jogadores que se tornaram verdadeiras celebridades.

Só essa popularidade do jogo já sustentaria “Arcane”, série em animação que a Netflix lançou baseada nos personagens de “League of Legends”, mas a série vai além do jogo e entrega uma história surpreendentemente bem construída. Assim, mesmo que você não tenha o menor interesse por jogos multiplayer ou games em geral, não feche esta página ainda e leia mais um pouquinho sobre a série - é bem capaz dela te surpreender.

Para os já iniciados no universo, “Arcane” é um prelúdio, uma história que embasa rivalidades do jogo. Para quem nada sabe sobre aquele mundo, no entanto, a série traz uma história de nascimentos de conflitos, diferenças de opiniões, pensamentos e diversas dualidades alimentadas pelas escolhas de seus protagonistas. 

Somos apresentados às irmãs Violet e Powder, parte de uma turma de jovens que aplicam golpes nas ruas da cidade de Zaun e sua irmã rica, Pitlover. Paralelamente à história delas, acompanhamos também a relação dos cientistas Jayce e Viktor; o primeiro, em uma busca para criar magia e utilizá-la para salvar vidas, já o segundo, com interesses diferentes (e não expressados) em relação à pesquisa do colega.

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Série "Arcane", da Netflix, baseada no universo do jogo "League of Legends". Crédito: Netflix/Divulgação

Enquanto Violet e Powder concentram a ação da série, é na relação dos cientistas que “Arcane” parte para discussões mais aprofundadas sobre os limites das ciências. Os conhecemos trabalhando juntos, com um objetivo em comum, mas logo passam a representar diferentes visões na série e até a levantar questões filosóficas inesperadas para o texto.

“Arcane” tem animação tecnicamente impecável, rica em detalhes, cores vivas, com personagens parecendo pintados à mão, com peso em seus combates e uma cidade que mistura um universo steampunk a um mundo mágico. A série é violenta e não poupa personagens que aparecem com certo protagonismo no início da narrativa. Esse aspecto afasta a narrativa de uma pegada de literatura para jovens adultos e a aproxima de uma violenta distopia com clima denso e até agressivo - nada exagerado, vale ressaltar, mas com um tom surpreendentemente sério em alguns momentos.

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Série "Arcane", da Netflix, baseada no universo do jogo "League of Legends". Crédito: Netflix/Divulgação

É interessante perceber como o texto dá profundidade ao lore do universo do jogo e transforma a rivalidade entre as cidades de Pitlover e Zaun (mais uma dualidade) em uma guerra de classes. A primeira cidade é rica, se diz amante da ciência e dos avanços, enquanto sua vizinha pobre é um antro de criminosos que agora ganham camadas e desenvolvimentos.

É claro que “Arcane” atinge imediatamente os fãs do jogo, mas o roteiro não demora a engrenar para quem clicar sem ter ideia ao que vai assistir. Como os personagens de “League of Legends” não têm um passado tão explorado pelos criadores do jogo, tudo o que acontece na série abre possibilidades para que esses personagens ganhem uma história, para se entender suas motivações.

Neste ponto, inclusive, “Arcane” faz escolhas acertadas e com pouquíssimo maniqueísmo. Não há certo ou errado, não é o bem contra o mal, a luz contra as trevas. O vilanesco Silco, por exemplo, personagem inexistente em “LoL”, busca uma violenta revolução social a partir da energia misteriosa. Sua função na trama provavelmente será transformar Powder em Jinx. A série cria para ele também um oposto, Vander, uma figura paterna para Violet e sua turma, um personagem que ganha um passado a ser explorado pelo texto.

“Arcane” mistura personagens dos jogos e caras novas a quem dá profundidade - como os rostos já conhecidos precisam chegar até o fim da história (afinal são parte do jogo), a carga dramática recai sobre os novos nomes que, mal desenvolvidos, não cairiam no gosto do espectador. Na temporada com nove episódios, três disponibilizados a cada sábado, vários ganharão destaque (Caitlyn, por exemplo) e outros novos surgirão. Cada leva desses episódios mostrará um arco de histórias, quase como um filme, uma escolha que, pelo menos em um primeiro momento, parece funcionar muito bem.

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Série "Arcane", da Netflix, baseada no universo do jogo "League of Legends". Crédito: Netflix/Divulgação

“Arcane” surpreende por ter vida própria, não parecer um derivado de “League of Legends” ou tampouco ser um produto restrito para os fãs do jogo. Claro que estes encontrarão diversas referências e easter eggs na narrativa, mas nada disso é essencial à série. Quem quiser se aventurar pelo mundo de Runeterra encontrará uma aventura violenta, com bons personagens, uma animação belíssima e uma narrativa simples, mas que funciona muito bem no formato seriado.

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