Foi um filme de zumbis que colocou o hoje badalado Zack Snyder no mapa. Lançado em 2004, “Madrugada dos Mortos”, uma refilmagem do clássico homônimo de George Romero, é ótimo; um filme divertido, com estilo e boa ação, uma boa homenagem ao mestre Romero e também uma eficaz atualização no gênero.
O filme de 2004, curiosamente, é um dos poucos dirigidos por Snyder a não ter o roteiro escrito por ele - “Madrugada dos Mortos” foi escrito por James Gunn (“Guardiões da Galáxia”), quando sua carreira como diretor ainda engatinhava. O filme de zumbis e “Watchmen”, talvez os dois melhores filmes de Snyder, não têm roteiros escritos por ele. Coincidência?
Zack Snyder volta ao universo dos zumbis agora em “Army of the Dead”, que aqui no Brasil ganhou o subtítulo “Invasão de Las Vegas”, mas não demora para percebermos que o filme que chegou nesta sexta (21) à Netflix está muito mais para um filme de ação/ficção científica do que para uma obra de terror.
“Army of the Dead”, após um breve prólogo que “explica” a origem do surto zumbi, tem a apresentação dos créditos ao melhor estilo Zack Snyder, em câmera lenta. Mesmo sem ser inovadora, a sequência apresenta bem os personagens e com estilo - todos os clichês possíveis de Las Vegas: imitadores de Elvis, strippers zumbis, idosos jogando caça-níqueis, e por aí vai.
Conseguimos, assim, ter uma noção do caos causado pela infestação e do tamanho das perdas. Entendemos, também, que a infestação foi contida e Vegas, fechada. Uma zona de quarentena e isolamento se formou ao redor da Cidade do Pecado. A sequência funciona surpreendentemente bem e já dá o tom de ação “imprevisível” (as aspas são importantes) em que tudo pode acontecer.
Do lado de fora e alguns anos depois, somos devidamente apresentados a Scott (Dave Bautista), um dos heróis da evacuação de Vegas e atualmente fritando hambúrgueres. Ele recebe a visita de Tanaka (Hiroyuki Sanada), um grande empresário que faz a ele uma proposta milionária por um dia de trabalho. Dave precisa voltar a Las Vegas e invadir o cofre que guarda US$ 200 milhões.
O texto de Snyder então abraça o estilo filme de assalto, com Scott recrutando parceiros e cada um deles sendo brevemente introduzido. Após as devidas apresentações de personagens e cenários, a equipe entra na isolada Vegas acompanhada de Lilly, uma coiote, ou seja, uma mulher que faz a travessia para dentro da cidade - nunca fica muito claro o motivo das pessoas quererem entrar lá (além da trama do filme), mas imagina-se que seja por conta de dinheiro e objetos valiosos abandonados durante a invasão.
A coiote logo apresenta à equipe de Scott e aos espectadores as regras daquele mundo. Las Vegas se transformou em algo muito maior do que uma ocupação de zumbis. As criaturas de “Army of the Dead” são ágeis, fortes e algumas até inteligentes; há uma estrutura hierárquica e uma sociedade naquele lugar.
“Army of the Dead” tem tudo o que você espera de um filme de Zack Snyder: violência estilizada, grandes sequências de ação, muita câmera lenta e péssimos diálogos. Aqui volto ao início do texto e ressalto que Snyder entende de estilo (mesmo que se perca nele), mas constrói roteiros apenas com frases de impacto e exposição didática, se esquecendo completamente de seus personagens. Isso, em um filme de quase duas horas e meia, é imperdoável.
De certa forma, é interessante pensar como Zack Snyder parece escrever roteiro para jogos. Toda estrutura de um jogo de ação está presente em “Army of the Dead”, com chefes, sub-chefes, algumas dinâmicas diferentes e muita exposição. Os personagens são todos mal desenvolvidos, até mesmo o protagonista, e não é muito difícil percebermos quem morrerá em cada etapa e quem seguirá até a próxima fase, pois alguns personagens só estão ali para virar comida de zumbi.
“Army of the Dead” é divertido quando assume seu lado comédia, o que não faz sempre, mas acerta em alguns detalhes sutis como o discurso do presidente que planeja jogar uma bomba atômica em Las Vegas no dia 4 de julho (independência dos EUA). Há alguns bons momentos também de camaradagem principalmente entre o trio Scott, Maria (Ana de la Reguera) e Tig (Marianne Peters), mas a maioria dos personagens, alguns até bem interessantes, é pouco aproveitada.
Mesmo priorizando a ação ao terror, “Army of the Dead” tem seus bons momentos, mas Snyder pensa o universo (já há continuações acordadas) acima do filme - ele se preocupa mais com as criaturas do que com seus humanos, o que rende algumas cenas quase risíveis. A escolha por zumbis ágeis e inteligentes aproximam o filme do que poderiam ser sequências de “Eu Sou a Lenda”, histórias inclusive presentes no livro de Richard Matheson.
“Army of the Dead” talvez seja o melhor filme de Zack Snyder em muito tempo, o que não significa muita coisa. O cineasta cria um universo colorido e, ironicamente, vivo, uma vez que Las Vegas não poderia ser diferente. O filme até tem bons personagens, mas se foca mais no estilo do que com o conteúdo. Talvez seja a intenção de Snyder, “o que acontece em Vegas, fica em Vegas”, a cidade da diversão efêmera e rápida - ele só não precisava de um filme de duas horas e meia para isso.
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