Majoritariamente conhecido por suas comédias, Adam Sandler já não causa estranheza quando decide protagonizar dramas. Em papéis dramáticos, o ator já estrelou filmes de cineastas autorais como Paul Thomas Anderson (“Embriagado de Amor”), os irmãos Benny e Josh Safdie (“Joias Brutas”), Noah Baumbach (“Os Meyerowitz”) e Jason Reitman (“Homens, Mulheres e Filhos”). Todos esses filmes, no entanto, têm uma semelhança: nenhum deles foi produzido por Sandler e sua produtora, a Happy Madison, que até chegou a criar um subselo para filmes dramáticos como “Reine Sobre Mim”, de Mike Binder, e “Tá Rindo do Quê?”, de Judd Apatow, mas nunca, com o perdão do trocadilho, levou a ideia a sério.
“Arremessando Alto”, que estreou nesta quarta na Netflix, é o filme que mostra um Adam Sandler real, ou, para ser mais exato, uma versão de algum universo paralelo (multiverso tá na moda) em que o ator tivesse seguido outra de suas paixões, o basquete. No drama dirigido por Jeremiah Zagar (do bom “We The Animals”), Sandler vive Stanley Sugerman, um olheiro internacional do tradicional Philadelphia 76ers. A montagem inicial é bem eficiente em apresentar o personagem em busca de jovens jogadores mundo afora, uma vida entre voos, hotéis e quadras de basquete, uma rotina que o afasta de sua família, a esposa ,Teresa (Queen Latifah), e a filha, Alex (Jordan Hull).
Em uma dessas viagens, Stan se depara com Bo Cruz (Juancho Hernangomez), um jovem espanhol de origem humilde e sem formação profissional no esporte. Stan vê nele um talento único, um “unicórnio”, um jogador que reúne características físicas e técnicas de fazer a diferença na NBA. Ele leva o nome do jogador aos dirigentes do 76ers, que não se interessam pela aposta. Fica a cargo de Stan, então, provar o valor de Bo e, ao mesmo tempo, o seu valor como um profundo conhecedor de basquete.
“Arremessando Alto” é uma clássica jornada esportiva do herói. Não é coincidência que o filme se passe na mesma Filadélfia onde Rocky Balboa fez história - e o texto nem tenta esconder a referência, muito pelo contrário. Com uma estrutura clássica em mãos, o filme aposta em clichês do drama esportivo e mostra que, quando bem utilizados, os clichês geram conforto ao espectador.
As jornadas de Bo Cruz e Stanley são cheias de risadas, obstáculos, choros e segundas chances. O tempo de humor de Sandler faz a diferença em seus papéis mais sérios ao oferecer a piada no momento em que o texto pede, de forma orgânica. Atualmente jogando pelo Utah Jazz, Juancho Hernangomez se sai surpreendentemente bem em sua estreia nas telas; é fácil ver o potencial de Bo porque seu intérprete é, de fato, um jogador da NBA. O jovem tem personalidade fechada, o que se encaixa e contrasta perfeitamente tanto com a falta de prática de Henangomez na atuação como com o jeito expansivo de Sandler.
O vínculo com a liga americana de basquete é também um dos grandes trunfos de “Arremessando Alto”. O filme traz diversas montagens de treinamento e trechos de jogos cheio de estrelas e lendas da liga. Como o protagonista é um cara que vive o ambiente da NBA, jogadores e ex-jogadores (alguns interpretando personagens) entram e saem da história quase sempre de forma natural.
Entre os profissionais, quem tem mais destaque é o jovem Anthony Edwards, que vive um falastrão antagonista de Bo nas quadras, alguém que ele deve superar se pretende virar profissional. Além dos jovem armador do Minnesota Timberwolves, vemos também nomes como Julius “Dr. J” Erving, Kenny Smith, Mark Jackson, Charles Barkley, Allen Iverson, Luka Doncic, Dirk Nowitski, Trae Young, alguns com mais e outros com menos tempo de tela, uma recompensa para os fãs de basquete. Falta, no entanto, mais profundidade do roteiro acerca do draft e do “Combine”, traduzido como “peneira” nas legendas brasileiras, pois todo o processo parece confuso (e realmente o é) para quem já não tem o conhecimento prévio. Para quem não acompanha a liga americana de basquete, no entanto, isso pouco importa, pois o filme deixa claro que aqueles eventos e aquelas pessoas são importantes e significam algo.
“Arremessando Alto” é formulaico, às vezes até demais, mas entende suas limitações e suas forças. A paixão de Sandler pelo basquete fica clara, assim como seu entendimento do jogo, mas o filme não cobra essa mesma paixão de seu espectador, que pode não entender nada do esporte, mas que se pegará torcendo pelos protagonistas e suas jornadas. Adam Sandler está ótimo nessa versão dele mesmo e prova, mais uma vez, ser um bom ator dramático mesmo sem depender de ótimos diretores no comando dos filmes.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.