Em uma cena do primeiro episódio de “As Seguidoras”, Liv (Maria Bopp) fala normalmente com seus 100 mil seguidores no Instagram enquanto a câmera passeia pela sala de sua casa. Vemos um corpo no chão envolto em uma poça de sangue e a protagonista agindo como se nada tivesse acontecido, com o rosto enquadrado entre a ring light, aquelas luzes redondinhas tão populares no universo dos influenciadores, como se apenas aquilo, seus seguidores, importassem para a jovem.
Com todos os seis episódios da primeira temporada disponibilizados em sua estreia, “As Seguidoras” chega dia 6 de março como a primeira produção original brasileira da Paramount+. A série protagonizada por Maria Bopp é uma grande sátira ao universo das influenciadoras digitais, afinal, nas palavras da própria protagonista, “é mais fácil matar, esquartejar, transportar, embalsamar, ocultar um cadáver do que passar pelo tribunal da internet”.
A série criada pela roteirista Manuela Cantuária tem produção do Porta dos Fundos e direção de Mariana Youssef e Mariana Bastos. Além de Maria Bopp, o elenco ainda tem Gabz (“Temporada de Verão”) e Raissa Chaddad (“Chiquititas”). A Liv de Bopp é uma sub-influenciadora que tenta seguir os passos de sua cunhada, a popular Ananda (Chaddad), e está disposta a tudo para isso, inclusive matar qualquer um que fique em seu caminho.
“As Seguidoras”, por se tratar de uma série de serial killer, logo desperta comparações com “Dexter”, mas Liv tem menos escrúpulos que o popular assassino vivido por Michael C. Hall. Na coletiva de lançamento da série, Manuela Cantuária preferiu trazer referências como a Villanelle (Jodie Comer) de “Killing Eve”. “Agora a gente tem anti-heroínas ganhando espaço no entretenimento, o que não existia antes”, explica Cantuária, citando também o tom da ótima “Barry”, da HBO, como influência para sua série.
A vontade da criadora era ver personagens femininas em papéis que sempre foram destinados a homens, como o serial killer traumatizado e conflituoso. “Foi um exercício entender como uma mulher se comportaria nesse contexto da investigação e da violência. Somos 50% da população e queremos nos ver em tela. Temos tantos anti-heróis que são uns babacas e são amados, por que não podemos amar uma mulher que faz isso?”, pondera.
Maria Bopp, cuja personagem é impossível de ser dissociada de sua Blogueirinha do Fim do Mundo, diz ter estudado influenciadoras e também serial killers. Em comum, ambos têm o desejo de chamar a atenção. “Às vezes é cômico de tão trágico. As pessoas levam até a última consequência a vontade de ter destaque, levantam polêmicas como ser nazista, racista”, diz a atriz.
Para a construção da protagonista, a atriz fez consultoria com Ilana Casoy, uma das maiores criminologistas do Brasil. “Queríamos entender como se cria um serial killer, como é o mecanismo de um psicopata para se tornar um assassino”, lembra a atriz, que se reconhece na Liv de “As Seguidoras” por acabar ela mesmo virando uma influenciadora. “As coisas que eu falava ecoavam na internet, tinham um peso e uma responsabilidade. Ao reconhecer a mim mesma como influenciadora, me reconheço na Liv”.
Mesmo tentando fugir das armadilhas que a popularidade nas redes traz, a atriz se entende uma refém da internet. “Quando tava com 900 mil seguidores fiquei louca, queria um milhão”, lembra, antes de completar: “Tem que ter engajamento, caixinha de pergunta, percebi que fotos com o corpo dão mais engajamento do que só de rosto, fiquei estudando porque ganhei tantos seguidores em uma semana e na outra nem tanto. Tem semanas que eu sumo, mas entendo que é meu trabalho, uma vitrine. Os produtores olham suas redes pra te chamar para testes. É cruel”.
Manuela Cantuária
Criadora e roteirista de "As Seguidoras"
"Temos tantos anti-heróis que são uns babacas e são amados, por que não podemos amar uma mulher que faz isso?"
Na série, Gabz vive Antônia, uma jovem que começa a investigar os possíveis crimes meio por acaso. A atriz se reconhece como fruto da internet não apenas para sua carreira nas artes, mas também na construção de sua identidade. “Fiz um slam que estourou, algo underground que não chegaria às pessoas sem as redes. A rede também construiu minha autoestima positivamente e me possibilitou ter acesso a material de estudo que eu, uma menina preta periférica, não tinha”, conta a atriz.
Apesar de toda toxicidade da internet, Gabz reforça que as redes apenas representam a sociedade. “Se a sociedade é racista e gordofóbica, capitalista e neoliberal, a internet vai ser igual. Quem vai ter mais seguidores são as meninas brancas vendendo corpos impossíveis. Se não fizermos do lado de fora, nada vai mudar sozinho”.
“As Seguidoras” tem uma construção de personagens interessantes, pois a série caminha entre o thriller e a comédia de exageros. “É uma sátira, mas o humor está na realidade”, afirma Gabz. Já Raissa, em seu primeiro trabalho mais adulto, garante ter estudado o texto para ver qual o tom se encaixaria melhor em cada cena. “Tive muita cena com a Maria para equilibrar isso, usar a ironia e a condescendência entre as duas”.
Como apenas o primeiro episódio foi liberado para a imprensa antes da estreia, é impossível aprofundar o texto com detalhes da narrativa, mas é possível dizer, no entanto, que o início de “As Seguidoras” é interessante. Desde o primeiro momento, a série ridiculariza a positividade tóxica das redes e influenciadores excessivamente “good vibes”, pessoas que constroem um padrão irreal e o vendem como ideal para seus seguidores. O fato de a protagonista se tornar uma serial killer é obviamente um exagero, mas representa justamente o quão nociva podem ser as redes.
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