Crítico de cinema e colunista de cultura de A Gazeta

Bisneta afirma: “Monteiro Lobato não era racista”

Cleo Monteiro Lobato, bisneta de Monteiro Lobato, relança livro com "adaptações" em comemoração aos 100 anos do primeiro livro infantil do bisavô

Vitória
Publicado em 04/12/2020 às 18h00
Atualizado em 04/12/2020 às 18h00
Cleo é uma mulher branca, de óculo, que segura um livro com uma ilustração dos personagens do Sítio do Picapau Amarelo.
Cleo Monteiro Lobato, bisneta de Monteiro Lobato. Crédito: Acervo pessoal

Cleo Monteiro Lobato carrega o bisavô, motivo de muito orgulho, no sobrenome. Por isso, agora resolveu homenagear os 100 anos do lançamento do primeiro livro infantil dele, “A Menina do Narizinho Arrebitado”. Considerada uma das obras mais importantes da literatura brasileira, o livro foi lançado em dezembro de 1920.

Para comemorar a data, um evento on-line será realizado entre esta sexta-feira (4) e domingo (6). A programação tem conteúdos exclusivos, mesas de debate sobre a obra de Monteiro Lobato, podcasts, exposições de arte… Conteúdo para todos os gostos. As inscrições gratuitas podem ser realizadas em lobato.com.vc ou no site narizinho100anos.com.

De sua casa nos EUA, onde mora desde 1997, Cleo se sentou comigo para um papo sobre o evento, o legado do bisavô e as tão faladas questões raciais que têm sido foco de análise na obra de Monteiro Lobato nos últimos anos.

“Ele não era uma pessoa racista”, afirma Cleo, para completar em seguida: “mas vivia numa sociedade racista. Era uma pessoa boa, amorosa, que tratava todos bem”. Com o relançamento do material lançado pelo bisavô no início do século passado, ela revela estar revendo expressões e termos utilizados na época, mas que hoje não têm espaço na sociedade. A mãe de Cleo, vale ressaltar, conviveu próxima ao avô até os 18 anos.

Cleo Monteiro Lobato

Bisneta de Monteiro Lobato

"“Ele (Monteiro Lobato) não era uma pessoa racista, mas vivia numa sociedade racista. Era uma pessoa boa, amorosa, que tratava todos bem”"

“Se você olhar aqui (mostra uma página do livro original), personagens como Narizinho, Emília e Dona Benta mudaram muito ao longo do tempo, a Tia Anastácia não. Por que isso? É um ponto do racismo estrutural da sociedade”, pondera. “Quero aproveitar a obra do Monteiro Lobato para lidar com essa questão do racismo estrutural no Brasil. Aqui nos EUA essa discussão já está muito mais avançada e organizada”, conta.

Cleo conta que, via Instagram, percebeu que existe uma demanda para a obra de Monteiro Lobato nos EUA. Muitos imigrantes brasileiros, hoje na casa dos 40 anos, querem introduzir a literatura “lobatiana” em seus filhos até como maneira de alfabetização em português, um idioma do qual as crianças acabam se esquecendo um pouco.

“A obra do Lobato atravessa os anos. É por isso que foi importante para tantas gerações e funciona até hoje como porta de entrada na literatura, como foi pra mim e pra você”, defende Cleo.

A REINVENÇÃO PARA OS NOVOS TEMPOS

Junto com o ilustrador e quadrinista Rafael Sam, Cleo reinventou o visual dos personagens, que ganharam cores vivas e um ar bem moderno. “Eu sempre senti falta das ilustrações. Era uma criança lendo e imaginando, mas queria mais ilustrações. Agora a gente tem”, diz Cleo enquanto mostra a página para a câmera. O estilo mistura a magia cultura brasileira com o estilo mais Disney.

Página do livro
Página do livro "A Menina do Narizinho Arrebitado". Crédito: Rafael Sam/Monteiro Lobato Projetos Culturais

“A Menina do Narizinho Arrebitado”, obra em que Emília começa a falar, será apenas o primeiro lançamento realizado por Cleo e Nereide Santa Rosa, da Underline Publishing. Juntas, elas planejam para 2021 mais três livros: “O Sítio do Picapau Amarelo”, “O Marquês de Rabicó” e “O Casamento de Narizinho”.

Toda a programação do evento “Narizinho 100 anos” por ser conferida no site narizinho100anos.com. O evento terá palestras e debates com nomes como Pedro Bandeira, Sonia Travassos e Renata Codagan. Além disso, no campo “Exposição”, há várias ilustrações diferentes sobre os personagens, com áudios de seus autores explicando cada obra.

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Rafael Braz

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