Quando o primeiro trailer do terror austríaco “Boa Noite, Mamãe” (2014) ganhou as redes, ele logo se tornou viral. Simples e tenso o tempo todo, o filme de Veroniza Franz e Severin Fiala se consolidou como um dos melhores terror da década ao misturar elementos de diversos estilos. A história dos irmãos convivendo com uma mãe com o rosto coberto por uma gaze, e cujo comportamento não é mais o mesmo, é bem desenvolvida e embrulha o estômago com sequências de “body horror”, usando o corpo e a angústia física dos personagens para manipular o espectador. Um remake americano logo entrou em pauta e agora chega ao Amazon Prime Video com o mesmo título, mas era melhor que não tivesse sido feito.
No material de divulgação da nova versão, o diretor Matt Sobel (“Vingança Sabor Cereja”) afirma ter buscado “a mesma premissa, mas uma mudança de significados e talvez até de gênero”. Seu “Boa Noite, Mamãe”, de fato, é um produto diferente, mas isso não deveria ser motivo de orgulho - Sobel e o roteirista Kyle Warren tornam a história de Franz e Fiala mais palpável em um festival de diálogos expositivos, praticamente eliminando tudo o que havia de melhor do filme austríaco.
Assim como no original, conhecemos os gêmeos Elias e Lucas (Cameron e Nicholas Crovetti) quando estão prestes a passar um tempo na casa da mãe (Naomi Watts). Quando chegam lá, a encontram com uma máscara cobrindo o rosto, parte do processo de recuperação de uma cirurgia, segundo ela. O comportamento da mãe não é mais o mesmo, o que, aliado ao fato de ela esconder o rosto, desperta nos irmãos a desconfiança de ela ter sido substituída por outra pessoa. Quem seria aquela mulher na casa com eles?
Ao contrário do filme original, que constrói com calma a tensão de duas crianças que podem estar convivendo com um “monstro” em casa, o remake da Amazon é didático desde o início e não tem tensão alguma - Elias e Lucas não têm o desenvolvimento dúbio que fazia o espectador olhar para eles com a mesma desconfiança que eles conferiam à mãe. Ao invés disso, os irmãos são mini-detetives em busca de um mistério para desvendar.
“Boa Noite, Mamãe” opta por um suspense mais convencional, com alguns sustos fáceis e sequências de pesadelos que remetem ao filme refilmado. A primeira virada do filme, previsível como no material original, é prejudicada pela edição, que deixa tudo muito claro logo no início. A fotografia de Alexander Dynan pouco ajuda a construir a dinâmica entre os irmãos, com enquadramentos diretos e nada ambíguos, um dos aspectos mais legais do filme de 2015; resta pouca dúvida sobre eles pois é assim que o filme os constrói.
É quase inexplicável a opção de Sobel por eliminar a tensão. Seu “Boa Noite, Mamãe” raramente se permite aproveitar o silêncio e se render à dúvida. O texto se sustenta em diálogos constantes entre as crianças para eliminar qualquer subjetividade narrativa. Mesmo que a comparação ao original não seja a melhor maneira de se analisar um remake, é impossível entender o que leva o filme a eliminar justamente o que funciona de melhor no filme austríaco.
Com tom equivocado durante todo o filme, o novo “Boa Noite, Mamãe” nunca encontra seu ritmo, nem mesmo no terceiro ato, quando as viradas já estão expostas - neste ponto, o espectador já previu algumas delas há algum tempo. A versão americana do terror ainda sanitiza a violência e o sangue do filme original da mesma forma que elimina o tom niilista que causa o impacto definitivo na trama.
Nem o esforço de Naomi Watts, em boa atuação, justifica o remake de “Boa Noite, Mamãe”. Como terror, o filme não funciona como o original; já como o drama que se propõe a ser, não consegue se aprofundar em temas como a depressão, o luto e a saúde mental. É constrangedora a maneira como a indústria, disposta a ceder à preguiça estadunidense com legendas, insiste em trucidar um filme redondo e original como o dirigido por Severin Fiala e Veronika Franz em nome de um produto limpinho, inofensivo e completamente esquecível.
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