Para boa parte dos brasileiros, pelo menos aqueles que não colocam brincam com a saúde em tempos de pandemia, “Carnaval”, que chega à Netflix na próxima quarta, 2 de junho, deveria vir com um alerta de gatilho e imagens fortes (como brinca o próprio trailer) - não é fácil ver o carnaval de Salvador em tela e não saber ao certo quando a festa, ou qualquer outra aglomeração, poderá acontecer sem preocupações sanitárias no Brasil.
Dirigido por Leandro Neri (“Socorro, Virei uma Garota!”), “Carnaval” é a jornada de autoconhecimento de quatro amigas com personalidades completamente diferentes. Na trama, Nina (Giovana Cordeiro) é uma influenciadora digital de terceiro escalão, mas que acaba viralizando após virar meme. Em uma permuta, ela consegue ir para o Carnaval de Salvador com suas três inseparáveis amigas, a festeira Michelle (GKay), a nerd Vivi (Samya Pascotto) e a tímida Mayra (Bruna Inocêncio), que tem pavor de multidões.
Sem um grande roteiro, “Carnaval” se sustenta na busca de Nina pela fama e no status de sub-celebridade que adquiriu. O texto brinca bastante com os perrengues a que a jovem se submete pela fama, mas tem seus melhores momentos com as quatro amigas juntas, lidando com as peculiaridades de cada uma e explorando Salvador.
Quando essa dinâmica ganha a tela, Nina perde espaço para Michelle e Vivi, uma alternância narrativa que funciona como uma boa quebra. A primeira, personagem de Gkay, é falastrona, sem muita paciência para conversa fiada, e com a preocupação maior de beijar na boca e curtir a vida. Já a Vivi de Samya Pascotto é a personificação do jovem nerd que se acha intelectualmente superior por ter essa ou aquela referência - ela inclusive tem um questionário nerd que aplica cada vez que algum homem tenta se aproximar. Em alguns momentos até nos perguntamos, afinal, como se formou a amizade daquele quarteto de personalidades tão distintas entre si, mas a verdade é que a resposta não importa.
É justamente nessas diferenças que “Carnaval” tem sua mensagem. Em busca da fama, de ser tornar igual às outras, Nina decide seguir os passos de uma megainfluenciadora, Luana (Flavia Pavanelli, que tem mais de 18 milhões de seguidores no Instagram), e acaba colocando as amigas em segundo plano, pois elas seriam uma âncora para suas ambições.
Durante o filme, cada uma das jovens tem seu próprio arco e acaba se encontrando em meio à festa. Nesse aspecto, o filme de Leandro Neri funciona bem. Com sequências filmadas no Carnaval de Salvador e em alguns cartões postais da capital baiana, o filme é colorido, vivo e alegre durante a maior parte do tempo.
É interessante como o filme não vilaniza comportamentos e todos os personagens, até alguns secundários, têm seus arcos de redenção. Essas histórias de apoio, vale ressaltar, proporcionam as melhores viradas do filme, as que o espectador não imagina que irão acontecer antes mesmo de clicar no filme, apenas por ler a sinopse, como é o caso do arco principal.
“Carnaval” é uma comédia politicamente correta que brinca com alguns esterótipos de comportamento, mas não é ofensiva. A espontaneidade de Gkay e a personificação da nerd de Samya Pascotto garantem um frescor ao filme. A jornada de Mayra, no entanto, acaba sacrificada por ser a mais séria dentro de uma comédia. O pavor de multidões da jovem é, durante a maior parte do tempo, um recurso para a criação de uma situação no terceiro ato - é um acontecimento essencial à trama, mas que funciona mais pelo geral do que pelo individual da personagem.
O filme de Leandro Neri é, ao fim, um entretenimento que faz graça com as ambições de seu público alvo, ou seja, a fama, as parcerias, os mimos e tudo mais que se tornou tão comum à realidade paralela das redes sociais. Inteligentemente, o roteiro conta outras histórias, mesmo que superficiais e com conflitos resolvidos num piscar de olhos, e puxa as personagens deslumbradas de volta à vida real, ou ao que nos acostumamos a chamar de vida real no pré-pandemia.
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