Em 6 de março de 2013, quando soubemos da notícia da morte do Chorão, uma dúvida pairou sobre a então editoria de cultura de A Gazeta, o finado Caderno Dois: qual espaço deveria ser dado à morte do líder do Charlie Brown Jr.? Óbvio que o assunto seria capa do suplemento, mas uma página bastaria? Após discussões sobre a relevância da banda, a edição teve quatro páginas dedicadas a Alexandre Magno Abrão, uma cobertura bem maior que a usual.
A dimensão da cobertura, que inicialmente parecia um exagero, foi justificada no dia seguinte, na publicação do jornal, com os elogios de quem acompanhava a banda. Ninguém da equipe do C2 era fã e não tínhamos a real noção da importância de Chorão para uma geração que não era a nossa. O Charlie Brown Jr. foi responsável pela entrada de muito jovem no mundo do skate e da música, além de ter influenciado bandas de diferentes estilos, do reggae e do rap ao hardcore e o metal. Goste ou não, o Charlie Brown Jr. foi uma das grandes bandas da História do rock brasileiro.
“Chorão: Marginal Alado”, documentário sobre Chorão que chegou semana passada para locação e compra em algumas plataformas (Now, Google Play e AppleTV), resgata a história do controverso músico. De sua chegada a Santos e dos campeonatos de skate para a formação do Charlie Brown Jr. é um pulo. A partir daí, o filme dirigido por Felipe Novaes é um apanhado de depoimentos sobre a genialidade de Chorão, sua postura punk e seu lado humano, uma verdadeira narrativa de construção de uma lenda.
Como boa parte dos filmes - documentários ou não - centralizados em um artista popular, “Chorão: Marginal Alado” é extremamente simpático a seu protagonista. A já citada construção é extremamente favorável a ele, óbvio. Assim, pouco se fala sobre as polêmicas que Chorão acumulou ao longo de sua trajetória. Claro que algumas são inevitáveis, como a briga com Marcelo Camelo, do Los Hermanos, mas o filme tem sua versão e sua justificativa para tudo. Todos os pontos negativos da personalidade do músico são amenizados por depoimentos sobre a pressão que sofria com o sucesso, sua intensidade, seu perfeccionismo etc. "Roqueiro é assim mesmo, roqueiro dá porrada", diz o produtor Rick Bonadio.
Falta à narrativa mais detalhes da conturbada saída de Champignon, Marcão e Pelado da banda, em 2005. O filme apenas anuncia as mudanças, fala em alguns desentendimentos, mas nunca se aprofunda na relação que era bem mais complexa do que a construída pelo roteiro. Ao evitar essas questões, “Chorão: Marginal Alado” evita também um lado egocêntrico, vaidoso, controlador e centralizador do músico, além de não se obrigar a relatar outros olhares sobre o comportamento do músico, o que é sempre justificado como “mecanismo de defesa” pelo texto.
Por exemplo, o filme mostra uma bela cena em que ele chama uma fã perto da van, fala belas palavras e diz para ela não comprar o disco e sim baixar de graça e ilegalmente, mas não mostra, em contrapartida, a vez que fez uma jovem chorar após comentários agressivos no programa “Altas Horas”.
A narrativa também traz algumas cenas de shows que se tornaram populares da briga entre Champignon e o Chorão, mas não as desenvolve - não mostra o baixista deixando o palco após ser humilhado pelo vocalista. O suicídio do baixista, seis meses após a morte de Chorão e sete dias após a entrevista do filme, tem relação direta com a tormenta que viveu na banda e com a morte do amigo de longa data, mas vira quase uma nota de rodapé no roteiro.
Ainda, o filme pega muito leve em relação às drogas, como se apenas após a separação Chorão tivesse mergulhado na cocaína, prática que já fazia parte de sua vida bem antes disso. A primeira menção ao consumo de qualquer droga só é feita no minuto 57, a pouco mais de 20 minutos do fim e quando o filme já se encaminha para seu ato final, a morte de Chorão por overdose.
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Isso significa que o filme não valha a pena? De forma alguma! “Chorão: Marginal Alado” traz bastante material de estúdio, depoimentos interessantes e algumas cenas da intimidade do músico. O filme é um belo registro de um dos artistas mais importantes da música brasileira, quer você queira ou não, mas é uma obra muito mais feita como homenagem do que para contar uma história com diferentes lados e versões.
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