A primeira coisa a ser levada em consideração ao analisar “Cobra Kai” é o fato de a série ser uma grande comédia de “Sessão da Tarde”. Após duas temporadas discretas, ainda produzidas como série original YouTube, o derivado de “Karate Kid” se tornou um fenômeno na Netflix (que comprou os direitos da série) ao atingir em cheio a nostalgia e o fácil consumo. A fórmula busca sempre a referência anterior, se conectando com os filmes, mas também criando novos arcos para novos personagens e principalmente para o núcleo adolescente.
Em alguns momentos, como na quarta temporada, a série passa do ponto - John Kreese (Martin Krove) é um personagem unidimensional e caricato demais para ser desenvolvido com destaque, uma tentativa do texto humanizar o principal vilão da franquia. Essa escolha rouba tempo de tela e roteiro de arcos mais interessantes, com os dos jovens, com os quais o texto várias vezes parece não saber ao certo o que fazer.
A boa notícia é que a quinta temporada de “Cobra Kai”, que chega sexta (9) à Netflix com 10 episódios, aprende com erros anteriores da série e busca algum frescor, mesmo que nem sempre o alcance.
A nova temporada começa com todos lidando com os acontecimentos do fim da anterior e com uma incontrolável expansão do Cobra Kai no Vale de São Fernando. Assistimos a uma propaganda modernosa, falando das academias com discurso inspirador, de olho no futuro, agora com a gestão de Terry Silver (Thomas Ian Griffith), um milionário “que quer transformar vidas”.
Não demora para Daniel (Ralph Macchio) e Amanda (Courtney Henggeler) contextualizarem o espectador sobre o que aconteceu desde que os deixamos pela última vez - Daniel levou seu ex-rival Chozen (Yuji Okumoto), de “Karate Kid 3”, para morar com eles e o relacionamento do casal vive uma crise.
Para o núcleo jovem, a temporada tem início com Miguel (Xolo Maridueña) chegando ao México em busca de seu pai. O México de “Cobra Kai” é tão caricato quanto tudo na série, com filtro amarelo, pessoas suadas, bares suspeitos e pessoas perigosas em cada esquina. Johnny (William Zabka), com a desculpa de uma viagem para se aproximar do filho, Robbie (Tanner Buchanan), parte em busca de Miguel em uma road trip pelas estradas mexicanas.
Todo arco do México se desenvolve e é resolvido rapidamente, com encontros inusitados e soluções repentinas - a ideia nunca foi dar profundidade a Miguel, tanto que o ocorrido no México não tem influência nenhuma na trama, mas sim oferecer à série um refresco, uma troca de cenário ainda que breve. A ideia funciona se lembrarmos da afirmação inicial do texto: “Cobra Kai” é uma grande “Sessão da Tarde” e não se deve cobrar muito além disso.
É interessante como a série tem plena ciência dessa característica e brinca com ela o tempo todo ao potencializar situações e repetir arcos que reforcem isso. A quinta temporada, porém, dá um refresco na já tão explorada rivalidade de Daniel e Johnny e busca novos ares. Terry Silver é um vilão mais interessante do que Kreese justamente por ser menos maniqueísta; o bondoso milionário tem mais recursos além da pancadaria, o que o torna um adversário mais difícil de ser derrotado.
Em sua quinta temporada, “Cobra Kai” acerta também ao manipular a expectativa do público sobre aparições e novos arcos. Quando a história parece caminhar para um caminho de humanização de Kreese, por exemplo, algo já ensaiado desde a terceira temporada, mas não muito bem recebido, o texto dá uma guinada. Da mesma forma, um personagem misterioso que vinha sendo tratado como possível novo vilão tem função bem diferente no roteiro justamente para quebrar esse maniqueísmo e mostrar o poder de transformação das pessoas.
Os novos episódios têm nessa transformação sua “mensagem” e busca reforçar como o Cobra Kai transforma as pessoas negativamente - várias vezes a frase “você se lembra como é ser um Cobra Kai” é utilizada por personagens distintos para justificar o comportamento de algum outro e para deixar claro o foco da temporada.
“Cobra Kai” tem plena ciência de quão ridículo é o fato de todos os envolvidos levarem campeonatos regionais de caratê entre adolescentes como a coisa mais importante do mundo. É cômica a maneira como os personagens acreditam estar em uma luta do bem contra o mal, enfrentando um adversário que representa uma grande ameaça, quando, na verdade, o Vale de São Fernando não passa de um grande bairro.
A quinta temporada de “Cobra Kai” se repete, tem algumas muletas de roteiro ao buscar sempre a conexão com algum filme “Karate Kid”, mas a série diverte como poucas. A dinâmica entre Daniel e Johnny é ótima e fica claro que são eles quem sustentam a narrativa com boas piadas e alguns dramas da vida adulta nem sempre levados a sério. Em contrapartida, a série segue sem saber o que fazer com o núcleo jovem com encontros e desencontros no intuito de conferir alguma novidade, mas entregando uma repetição de arcos.
Por fim, é interessante como “Cobra Kai” ruma para uma bem-vinda ampliação de escopo, caminho que deveria ter sido introduzido na temporada anterior, mas que funciona muito bem nos novos episódios para que o texto olhe para o futuro. A série pode não ser a história mais interessante ou a narrativa mais inovadora do mundo, mas ela nunca falha em entregar diversão mergulhada em nostalgia.
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