Lá se vão mais de duas décadas desde que o “X-Men” de Bryan Singer tornou os heróis legais novamente. De lá para cá, vieram o Universo Cinematográfico Marvel, o DCU e diversas outras produções, de filmes e incontáveis séries, abraçando o estilo de alguma forma. Da franquia “Velozes e Furiosos” ao recém-lançado russo “Major Grom Contra o Dr. Peste”, passando por ‘The Boys” e “O Legado de Júpiter”, todos querem ser uma espécie de universo de heróis.
O francês “Como Virei Super-Herói” nem sequer disfarça suas intenções. Lançado pela Netflix na última sexta (9), o filme de Douglas Attal se baseia no livro de Gérald Bronner, mas deveria conter crédito para Brian Michael Bendis devido à sua semelhança gritante com a excelente HQ “Powers”, transformada em série razoável pela Sony numa trama que durou duas temporadas.
No filme, os super-heróis convivem entre nós e se tornaram subcelebridades em busca de fama. Os poderosos, no entanto, não existem em abundância e todos querem experimentar um pouquinho de poder. Por isso, não demora a surgir uma arriscada droga capaz de dar poderes a pessoas normais, mas o preço a se pagar pode ser alto demais. Como dito, a semelhança com a HQ de Bendis é enorme.
Nesse universo, cabe aos detetives Gary Moreau (Pio Marmaï) e Cécile Schaçtzmann (Vimala Pons) encontrar os responsáveis pelo tráfico e pela produção da tal droga que vem causando um estrago nos jovens parisienses. Para isso, eles contarão com a ajuda de dois veteranos super-heróis que já viveram dias de glória, Monte Carlo (Benoit Poelvoorde) e Callista (Leila Bekhtic).
“Como Virei Super-Herói” é um filme leve, divertido e até ciente de suas limitações. Assim, não há efeitos espetaculares ou grandes ambições narrativas. Douglas Attal faz boas escolhas ao manter o filme menor, com uma trama policial e não uma grande história de super-heróis e, consequentemente, supervilões. O problema do roteiro é o subdesenvolvimento de seus personagens, tanto mocinhos quanto vilões.
O texto vende um “passado” para o protagonista, mas é tudo muito superficial. Da mesma forma, a história dos heróis é rasa e pouco sabemos sobre eles para podermos nos importar. O único a despertar uma maior simpatia é Monte Carlo, que funciona como alívio cômico reforçado pelo carisma de Benoit Poelvoorde.
Tal qual “Major Grom Contra o Dr. Peste”, “Como Virei Super-Herói” usa recortes de noticiários como recurso estrutural, sempre informando tudo o que o espectador precisa saber antes de entender a próxima cena. Assim, os jornais informam sobre os dias de glória de Monte Carlo, os acontecimentos recentes em Paris, o risco da droga, etc. É um recurso funcional, mas, quando utilizado em excesso, parece uma muleta.
Com uma história pouco original desde sua premissa, o filme de Douglas Attal parece ter medo de ousar, talvez por uma necessidade de ser uma obra para toda a família. O resultado é uma aventura segura e certinha demais, que perde oportunidade de tomar decisões mais ousadas em determinado momento e opta pelas soluções mais fáceis e convencionais.
“Como Virei Super-Herói” seria um material viável para uma série, com arcos separados para cada personagem, com construção de uma trama e de um universo que nos fizesse entender o que significam aqueles antigos heróis e o que significa, enfim, se tornar um herói. O curioso é que o roteiro entende essas possibilidades ao já preparar terreno para as tão almejadas franquias, o sonho de qualquer estúdio, mas não as explora de imediato. Ao fim, o filme acaba funcionando como uma involuntária sátira às supersaturadas histórias de super-heróis - em um mundo em que eles não são novidades, passamos a tratá-los com certa indiferença.
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