Segredos, mentiras, traições e muitas reviravoltas, a parceria entre Harlan Coben e Netflix ganha mais uma minissérie. “Confie em Mim” é uma produção polonesa com tudo o que se espera de uma adaptação dos livros de Coben e um resultado que não é necessariamente bom, até passa bem longe disso, mas que oferece tudo o que os fãs do estilo do autor esperam.
Sétimo livro de Coben a virar série na plataforma (o contrato prevê 14), “Confie em Mim” é mais uma história sobre uma família “perfeita” que se vê em situações atípicas. Na trama, após a morte acidental de um jovem, seu melhor amigo, Adam (Krzysztof Oleksyn), desaparece. Tem início então uma busca por Adam, com os pais do jovem, Anna (Magdalena Boczarska) e Michal (Leszek Lichota), assumindo até o papel de protagonismo nas investigações - “Confie em Mim” é mais uma série que depende de uma atuação pífia da polícia para que seus protagonistas se destaquem na investigação.
A série também acompanha algumas tramas paralelas que se cruzam em algum momento, mas nem sempre de forma satisfatória. É esse excesso de arcos que enfraquece a narrativa, pois alguns parecem deslocados, principalmente a do professor da escola às voltas com a acusação de causar o bullying de uma aluna. Os arcos se esforçam para se justificar ao final, mas esbarra nas limitações do roteiro com resoluções atropeladas e descobertas repentinas.
Como todo texto de Coben, “Confie em Mim” se sustenta nos segredos e parte da premissa de que todos os têm. Anna e Michal instalaram um app de espionagem no telefone de Adam, que já havia fugido de casa anteriormente e tinha dificuldade em confiar em adultos. Adam, por sua vez, carrega uma culpa pela morte do amigo, que estava envolvido com drogas. O roteiro busca a identificação com o público a partir desses segredos, como se perguntasse o que faríamos e quais limites estaríamos dispostos a atingir para proteger os nossos.
A trama principal, o desaparecimento de Adam, tem bons desdobramentos e viradas inteligentes, mesmo que algumas sejam previsíveis. Os outros arcos, porém, se perdem nas caracterizações dos personagens, que já indicam quem é “bom ou mau” na trama, e em subtramas completamente desnecessárias.
Mesmo com mortes, desaparecimentos e assassinatos, “Confie em Mim” tem uma aposta interessante no drama familiar - a confiança do título, afinal, é a base de sustentação para as relações. A minissérie opta por não incluir um arco melodramático do livro mesmo utilizando sua dinâmica com um arco novo que dialoga com a questão da confiança, mas tem uma conclusão um pouco constrangedora.
É curioso como a minissérie alterna o ritmo de seus episódios. Toda a teia de relacionamentos e personagens é construída nos quatro iniciais, deixando a resolução e as amarras para os dois últimos. Assim, enquanto os primeiros têm problemas de cadência, os últimos são atropelados, pois há muito o que mostrar em pouco tempo.
É muito interessante como a minissérie é pouco didática, com diálogos pouco expositivos, mas acaba abusando da exposição nos instantes antes de seu fim - algo muito similar ao final da péssima “Fique Comigo”. O problema, assim como na série anterior, não está nos acontecimentos mostrados, mas no fato de o texto guardar tudo para ser revelado no fim, priorizando o impacto, mas se esquecendo de oferecer uma recompensa para o espectador.
“Confie em Mim”, a série, se perde em sua necessidade de surpreender o espectador e acaba deixando de lado questões de afeto e confiança que “Confie em Mim”, o livro, traz. Publicado em 2008, o livro se sustenta na relação entre pais e filhos e tira o foco dos segredos individuais para levá-lo à questão dos limites: o que uma mãe e um pai são capazes de fazer para proteger seus filhos? Sem isso, a história de Coben se torna vazia e pouco interessante mesmo em uma série com boas atuações e a capacidade de surpreender.
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