Em poucas palavras: “1917”, de Sam Mendes ("Beleza Americana"), é um espetáculo daqueles que merecem ser conferidos nas salas de cinema. O épico da Primeira Guerra Mundial é grandioso e merece todos os prêmios técnicos, além de ser um marco incrível de direção que coloca Mendes como o favorito ao Oscar na categoria. O diretor já ganhou o prêmio no Globo de Ouro, que também premiou a obra como Melhor Filme Drama.
“1917” é a jornada de dois jovens soldados britânicos que recebem uma ingrata missão: atravessar a linha inimiga para entregar uma mensagem a um batalhão prestes a cair numa armadilha que pode custar 1.600 vidas. Ao receberem a ordem, os cabos Blake (Dean-Charles Chapman) e Schofield (George MacKay) partem imediatamente rumo ao desconhecido.
O filme se passa em pouco menos de um dia, atravessando a noite até seu desfecho final. O tal “take único” prometido é mais uma sensação transmitida ao espectador do que um esmero técnico. Sam Mendes é perfeito ao não tentar esconder os seus pontos de cortes; qualquer um que tenha noção de cinema é capaz de identificar a grande maioria deles. Com a opção do grande plano-sequência, o cineasta coloca o espectador dentro da ação. O filme ganha tensão de um thriller, pois estamos lado a lado com Blake e Schofield e acompanhamos com eles todas as descobertas e os sufocos.
A fotografia de Roger Deakins (14 vezes indicados ao Oscar, vencedor por “Blade Runner 2049”) é um capítulo a parte. O filme mescla cenários abertos, enlameados e destruídos, a outros mais claustrofóbicos e escuros iluminados apenas pelas luzes dos sinalizadores e das chamas dos destroços. Toda a sequência noturna é impecável, mas o desespero visual da “terra de ninguém” (território não ocupado por nenhuma das partes da guerra) também é um deslumbre.
Merecem destaque também a mixagem e a edição de som, que fazem o público saltar da cadeira em alguns momentos e ajudam a criar a tensão em outros - o som distante de bombas, tiros e aviões são responsáveis diretos pela imersão na história.
Se por um lado a escolha do "plano-sequência" torna o filme uma jornada espetacular, por outro ela cria algumas sequências estranhas. O formato às vezes esbarra em um excesso de teatralidade não habitual ao cinema (foram seis meses de ensaio). Em um ponto, por exemplo, os protagonistas se encontram completamente sozinhos, mas em um piscar de olhos o local está completamente tomado, o que até poderia acontecer, mas não sem que eles percebessem. Situações como essa às vezes fazem o público se sentir parte de um jogo, um “Call of Duty” da vida, acompanhando as instruções e as conversas à espera de assumir o controle e partir para a ação, o que nunca acontece.
A escolha pelo formato de “tempo corrido” também atrapalha a identificação do público com os personagens. Queremos que eles não sofram nada simplesmente por estarmos acompanhando as jornadas deles, não por identificação ou empatia. Há alguma estranheza também na maneira como os coadjuvantes surgem em tela, cumprem seu objetivo na trama e em seguida desaparecem.
Ciente dessas limitações, Sam Mendes cria um filme com poucos diálogos e muita ação. As atuações da dupla principal casam com o tom de urgência e desespero do filme, que também ganha coadjuvantes do peso de Mark Strong, Benedict Cumberbatch, Colin Firth e Andrew Scott.
“1917”, como dito nas primeiras palavras deste texto, é espetacular. Sam Mendes entende as limitações que suas escolhas trazem e foca o aspecto sensorial que sua obra desperta. É cinema em grande escala, mas que consegue ter momentos íntimos. É uma obra que mostra o desespero de guerra sem nunca perder seu foco principal, o entretenimento.
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