Crítico de cinema e colunista de cultura de A Gazeta

Crítica: "O Homem Invisível" usa terror para falar de relações abusivas

"O Homem Invisível", com Elizabeth Moss e dirigido por Leigh Whannell, foge dos sustos fáceis e usa medos da vida real para construir um dos filmes de terror mais legais dos últimos anos

Publicado em 26/02/2020 às 14h48
Atualizado em 26/02/2020 às 14h53
Elizabeth Moss em "O Homem Invisível". Crédito: Universal/Divulgação
Elizabeth Moss em "O Homem Invisível". Crédito: Universal/Divulgação

"O Homem Invisível" sempre foi analisado dentro do espectro dos chamados Monstros da Universal ao lado de criaturas como Drácula, Frankenstein, Monstro da Lagoa Negro, etc. O filme de 1933, dirigido por James Whale, fez sucesso, rendeu alguns spin-of ("O Retorno do Homem-Invisível" e "A Mulher Invisível"), e faz parte da Era de Ouro dos monstros do estúdio. Apesar disso, a pegada da obra de H. G. Wells sempre foi diferente, uma ficção científica que lidava com questões reais de violência e abuso.

A Universal bem que tentou criar um universo compartilhado com esses monstros, uma espécie de Marvel monstruosa, mas começou muito mal. "A Múmia" (2017), com Tom Cruise, seria o filme a abrir este universo, mas é tão ruim e foi tão mal de bilheteria (o que talvez tenha importado mais) que desanimou planos mais ambiciosos no estúdio. Em 2019, a Universal cancelou seu Dark Universe, mas acertadamente manteve o lançamento de alguns filmes como "O Homem Invisível", que chega nesta quinta-feira, 27, aos cinemas.

Dirigido pelo jovem Leigh Whannell, do ótimo e pouco visto "Upgrade" (2018), o filme atualiza toda a trama para os dias de hoje. Elizabeth Moss ("The Handmaid's Tale") vive Cecilia, uma mulher cujo abusivo ex-namorado, Adrian (Oliver Jackson-Cohen), se mata e deixa para ela toda a fortuna que conquistou no ramo de tecnologia.

Desde o primeiro momento do filme, quando Cecilia volta à casa em que vivia com Adrian, o diretor deixa claro: seu "O Homem Invisível" é sobre traumas. Cada canto daquela casa guarda uma história de dor que é transmitida ao público por Eizabeth Moss com maestria. A atriz de "The Handmaid's Tale" entrega mais uma atuação forte e cria uma personagem que mesmo tendo supostamente deixado o relacionamento abusivo no passado, não consegue mais confiar nas pessoas, que também não acreditam nela, e não sabe muito bem como viver em sociedade.

Narrativa

"O Homem Invisível" em nada se assemelha a um filme de terror convencional. A narrativa do filme de Whannell constrói as etapas de uma relação abusiva na forma de uma ficção científica de horror. Após a morte de Adrian, coisas estranhas passam a acontecer com Cecilia e transformam sua vida em um inferno. Conhecendo seu ex (um gênio da tecnologia), ela acredita que ele fingiu sua morte e, de alguma forma, se tornou invisível - a teoria, claro, é considerada absurda por todos que a cercam. É uma história de violência em que ninguém acredita na vítima. Coincidência?

Elizabeth Moss em "O Homem Invisível". Crédito: Universal/Divulgação
Elizabeth Moss em "O Homem Invisível". Crédito: Universal/Divulgação

O diretor constrói a tensão e o suspense nos dois primeiros atos e deixa que a parte final de seu filme exploda em ação. Whannell entende o conceito principal da obra, uma ameaça invisível, e utiliza isso a seu favor; não há, por exemplo, sustos fáceis. Ao invés disso, o espectador lida sempre com a possibilidade de a protagonista não estar sozinha e trabalha bem os indícios de que isso seja verdade.

A narrativa, novamente fazendo referências a um relacionamento abusivo, desconstrói a credibilidade de Cecilia e em alguns momentos trabalha com a possibilidade de que ela esteja louca, ela é praticamente levada a acreditar nisso.

"O Homem Invisível" é um filme de terror moderno, que relaciona os medos da protagonista à vida de quem está do outro lado da tela. Elizabeth Moss cria uma personagem fragilizada por tudo o que passou, mas ainda capaz de enfrentar tudo. O elenco de apoio, mesmo com pouco tempo de tela (um deles, afinal, é invisível), também acrescenta ao filme, que ganha ainda mais força com mixagem de som e fotografia. Leigh Whannell entende os medos e horrores da sociedade moderna e cria um longa com possibilidade de se tornar clássico.

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