“Nossa, isso é muito ‘Black Mirror’”. Quantas vezes você ouviu essa expressão nos últimos anos? A série britânica aos poucos deixou seu nicho “cult” de ficção científica e caiu no gosto popular. O resultado disso é controverso: há quem ame as novas temporadas lançadas pela Netflix, mas também existem aqueles saudosos do “Black Mirror” raiz.
Lançada pela Amazon Prime Video na última semana “The Feed” tenta agradar a segunda turma com uma pegada mais próxima da realidade, criando um futuro plausível - não há uma tecnologia revolucionária ou nada que pareça muito distante da nossa realidade. O “feed” do título diz respeito a uma tecnologia que funciona como um Google Glass mais avançado, um dispositivo implantado no cérebro que permite que pessoas mandem mensagens, assistam a vídeos e até alterem a percepção do que os cerca com um simples comando mental, ou seja, a internet toda ao alcance de um simples desejo.
“The Feed” se baseia no livro homônimo escrito por Nick Clark Windo e cria uma sociedade dependente da tecnologia criada e constantemente aperfeiçoada pela família Hatfield, o que confere a série ares de drama familiar. O pai, Lawrence (David Thewlis), tenta se reconectar com o filho, Tom (Guy Burnet), enquanto Meredith (Michelle Fairley, de "Game of Thrones"), mãe e esposa, funciona como o rosto da empresa que deseja tornar o dispositivo menos restrito - uma maneira, segundo eles, de alcançar uma conectividade universal e promover a paz no mundo, mas é claro que não é bem assim. O problema se torna ainda maior quando um grupo de hackers rebeldes passa a invadir os sistema e tomar o controle da mente de pessoas inocentes as transformando em cruéis assassinos.
Na primeira metade da temporada (são 10 episódios no total), “The Feed” mergulha no drama familiar dos Hatfield e na desumanização da sociedade. Tom, por exemplo, lida com viciados em tecnologia com pesadas crises de abstinência. A nova sociedade da série, tal qual a nossa atual, é obcecada por popularidade e jovens chegam a extremos para conquistar seus “likes”.
Por mais atual que seja o tema, não é nada inédito. “Black Mirror” já tratou do assunto à sua maneira no episódio “Nosedive” (o primeiro da terceira temporada) e vemos isso diariamente nas redes sociais. A série também discute a privacidade (ou a falta dela): até que ponto os assistentes virtuais registram conversas? Qual o limite da privacidade?
“The Feed” não é desinteressante, mas tampouco traz novidades. Ainda, o roteiro parece ignorar outros problemas latentes como racismo (Lawrence tem um discurso quase eugenista). Ao deixar de lado questões relevantes, a série limita seu discurso à paranoia tecnológica, algo já discutido diversas vezes pela ficção e até mesmo pelo jornalismo.
Ao fim, a nova série da Amazon (que ironicamente é acusada de espionar usuários da Alexa, sua assistente virtual) não é ruim, mas erra no discurso generalista e ao não sair do lugar comum. A ideia funcionaria melhor se fosse focada na família Hatfield tendo a tecnologia como pano de fundo, pegada similar à da brilhante “Years and Years”, ou se margulhasse mais fundo no leque de possibilidades aberto pela premissa.
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