“De Férias da Família” é um filme curioso. Nos primeiros momentos, ele se sustenta no humor físico para gerar a graça imediata e prender a atenção do espectador. O longo do filme, porém, a comédia dirigida e escrita por John Hamburg (“Quem Vai Ficar com Polly”) ganha novas camadas que até nos fazem esquecer dos minutos iniciais.
O centro do filme é Sonny Fisher (Kevin Hart), um pai que cuida dos filhos enquanto a esposa, Maya (Regina Hall), trabalha. Sonny é ótimo com as crianças, faz trabalho voluntário na escola delas, mas talvez esteja rígido demais com as regras da casa. Maya então sugere ao marido um feriado de folga - ela iria para a casa dos pais com as crianças e Sonny ficaria livre para fazer o que quiser. Meio que sem saber o que fazer e com ciúmes da esposa, Sonny acaba na festa de 44 anos de seu melhor amigo desde a infância, Huck (Mark Wahlberg), uma estranha aventura no meio do deserto.
Desde a primeira cena, “De Férias da Família” ressalta o vínculo entre Sonny e Huck e a promessa de serem melhores amigos para sempre. A vida adulta, claro, cobra seu preço; enquanto Sonny se casou e começou uma família, Huck continuou se comportando de forma inconsequente, como um garotão, apesar de já ter 44 anos. O afastamento acabou sendo inevitável.
Kevin Hart, seguindo sua onda de papéis mais sérios desde que foi “cancelado”, vai muito bem. Sonny mostra real desconforto ao se deparar com a vida de Huck, um sujeito claramente influenciado pela cultura das startups de sucesso. Essa característica influencia diretamente na premissa de “De Férias da Família” e é surpreendentemente ensaiada com sutileza pelo texto ao apresentar uma personagem como “trabalho ao lado dele no WeWork” - para maior contextualização, o WeWork é uma empresa de cowork envolvidas em diversas fraudes, como registrado na série “WeCrashed”, da AppleTV+.
No desenvolver de seu segundo ato, “De Férias da Família” encontra seu ponto alto. É o momento em que Hart e Wahlberg se destacam, juntos, sem outras grandes distrações. A virada do filme é uma boa surpresa, mesmo que o roteiro tenha dado dicas sobre o assunto previamente, não se imagina a guinada que ela causaria na trama. Com a virada, o filme de John Hamburg ganha até ares mais aventurescos e agitados, fugindo um pouco da perspectiva “pai de família na balada com um amigo doidão”.
É interessante como o filme não faz questão alguma de disfarçar seus intuitos - tudo no texto busca a risada, mesmo que seja um riso constrangido por não acreditar no que está vendo ou sustentado pela vergonha alheia. Juntos, Hart e Wahlberg são ótimos, encadeando diálogos com rapidez até difícil de acompanhar em alguns momentos.
Apesar de vendido como um filme de dupla, “De Férias da Família” é um filme de Kevin Hart, que também assina como produtor executivo. O Huck de Wahlberg, no entanto, é ótimo, um sujeito cheio de boas intenções, mas que se enrola na vontade de fazer tudo funcionar sem se preocupar tanto com o futuro. O roteiro constrói bem as diferenças entre os dois, mas falha no arco de Huck, resolvendo tudo muito rápido para dar espaço à história de Sonny e sua família. Wahlberg funciona como escada para Hart e não parece se incomodar com isso.
O filme garante algumas risadas com humor físico e situações clichês, mas desperta empatia ao lidar com o drama familiar de Sonny. Ninguém o leva a sério como um homem que cuida dos filhos - mesmo que os filhos o considerem essencial, a “cola” da família, Sonny sofre com as piadas e os comentários dos outros pais na escola. “De Férias da Família” perde a oportunidade de ganhar profundidades dramáticas lidando com isso, uma perda que parece calculada, uma renúncia em favor de arcos de humor.
“De Férias da Família” oferece algumas boas risadas, com uma química excelente entre Kevin Hart e qualquer outro ator ou atriz que atue com ele. Em contrapartida, o roteiro é previsível e aposta em tudo o que já deu certo em diversas outras comédias. Ao fim, é uma comédia familiar razoável, com um pouco de ousadia, mas nada que exija a retirada das crianças da sala; um filme seguro conduzido pelo carisma de seu protagonista.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.