Desde os primeiros momentos de “Demais Pra Mim”, o filme italiano tenta quebrar alguns clichês e fórmulas do gênero das comédias românticas adolescentes. “Sabe aqueles filmes em que a heroína tem uma doença terminal, mas apesar da quimio e dos respiradores, é supergata? Esse não é o meu filme”, diz a protagonista, Marta (Ludovica Francesconi), nos primeiros momentos da projeção (e também do trailer).
É irônico, assim, que o filme lançado pela Netflix nesta semana seja justamente aquilo que vende não ser: uma dramédia romântica com uma protagonista bonita que tenta se passar por feia e conquista o cara colocado por ela em outro patamar.
Dirigido por Alice Filippi, o filme é todo centrado em Marta, uma órfã com uma doença genética crônica que pode apresentar complicações a qualquer momento. Apesar da fragilidade, ela leva uma vida normal ao lado dos amigos Jocopo (Jozef Gjura) e Federica (Gaja Masciale), a família que ela não teve.
Marta fica obcecada pelo bonitão Arturo (Giuseppe Maggio) e passa a persegui-lo de forma não muito saudável. Quando eles finalmente se conhecem, passado aquele estranhamento inicial por virem de mundos tão distintos, eles desenvolvem um surpreendente interesse mútuo, mas Marta não conta a ele sobre sua condição.
“Demais Pra Mim” é um filme ágil, que não desperdiça tempo e até paga o preço por isso. Há uma influência óbvia de “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain” (2002) na linguagem e também na composição da protagonista - do corte de cabelo ao jeitinho peculiar e à fala rápida. O filme dirigido por Jean-Pierre Jeunet também influencia na montagem de Luciana Pandolfeli e na trilha sonora de Marco Cascone, que em muito emula o francês Yann Tiersen com acordeão, piano e violinos.
A rapidez com que o filme se desenvolve tem muito a ver com a maneira como Marta leva a vida. Sem saber ao certo quanto tempo lhe resta, ela tenta aproveitar ao máximo - é justamente por isso que tenta conquistar o cara mais bonito que encontra. É interessante ver como o roteiro trata da construção de padrões; Marta é inteligente, uma típica jovem cult, mas seu interesse por Arturo é totalmente superficial. Em contrapartida, o roteiro constrói Arturo como um sujeito preso no que a sociedade espera dele: um cara bonito, que pratica esportes e se relaciona com mulheres bonitas, mas superficiais.
Como dito anteriormente o filme paga o preço por tentar ser ágil. O roteiro de “Demais Pra Mim” até ensaia uma subtrama com Jacopo e Federica, mas ela não vai a lugar nenhum, servindo apenas como alívio cômico e um pouco de estofo para a jornada de Marta. Ainda, tudo na relação da protagonista com Arturo parece um pouco atropelado. Em um dia eles estão se conhecendo e no outro já estão perdidamente apaixonados.
A falta de um desenvolvimento da relação tira o peso dela durante o clímax, no qual tudo acontece com a mesma velocidade do resto do filme. Há, ainda, um recurso de edição que tenta enganar o espectador no terceiro ato, mas tudo é tão rápido que nem sequer dá tempo para digerir a suposta informação.
O grande mérito de “Demais Pra Mim” é ser um filme positivo diante das adversidades de sua protagonista, mesmo que nunca tenhamos a visão sobre Marta que o texto tenta nos passar. O roteiro tenta nos convencer se tratar de uma jovem moribunda e praticamente repugnante, mas nunca se esforça para isso; a fragilidade da personagem se dá no máximo com a utilização de um tubo de oxigênio.
“Demais Pra Mim” é divertido, um típico “feel good movie”, ou seja, um daqueles filmes que você termina de assistir com um sentimento bom. Mesmo se vendendo como “diferentão”, ele é formulaico e superficial em diversos momentos ao lidar com o peso da proximidade da morte, o que pode ser um pouco irritante. Apesar disso, o resultado é uma dramédia engraçada, leve e com momentos capazes de emocionar o espectador.
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