Há obras que têm na confusão seu sentido, sua força motriz. Há casos clássicos em produtos mais pop, como “Lost”, todas as cópias que a sucederam nos anos 2000, e as mais recentes como “Dark” e “1899” (não por acaso criada pelos mesmos produtores após o sucesso da primeira). O recurso pode funcionar, prender o espectador, gerar discussões, mas também irrita e afasta uma audiência não disposta a ser enganada o tempo todo.
Sucesso na Netflix, a minissérie “Depois da Cabana” opta por um caminho contrário. Adaptação do livro de Romy Hausmann, o texto confunde intencionalmente, mas essa confusão nunca parece uma trapaça, pelo contrário, ela é parte essencial da série.
Em seis episódios de cerca de 40 minutos cada, a série tem início com uma mulher em fuga. Ela é atropelada por um carro, fica em estado grave, e a única testemunha de tudo é Hannah (Naila Schuberth), uma menina de comportamento estranho e de falas pouco confiáveis, misturando realidade e fantasia. Segundo Hannah, a mulher é sua mãe, se chama Lena (Kim Riedle), e fugiu após uma violenta briga em casa.
Lena tem o mesmo nome e características físicas de uma mulher desaparecida há 13 anos em um caso nunca resolvido. Sua aparição causa alvoroço nos pais da mulher desaparecida e em outras pessoas envolvidas com o antigo caso, mas será que elas são a mesma pessoa?
“Depois da Cabana” tem o mérito de ser uma série movimentada, nunca permanecendo no mesmo lugar. A história caminha, segredos são revelados e viradas ganham a tela episódios após episódio sem nunca parecerem forçadas. O roteiro coloca o espectador em meio à confusão, mas os personagens estão tão perdidos quando o público, que vai entendendo melhor o ocorrido e a trama ao lado dos policiais responsáveis pela investigação e com algumas pistas plantadas pelo texto.
A minissérie alemã se sustenta na construção do clima e do mistério. Entende-se que Lena e Hannah eram mantidas em um sinistro cativeiro, mas quão envolvidas elas estão com o sequestrador? A série é inteligente ao transmitir ao espectador a sensação de que as personagens são controladas pelo medo nascido do abuso de uma relação controladora – esse controle é tudo o que Hannah conhece. A narrativa utiliza a voz do sequestrador para explicar a força desse trauma/poder.
Quando se aproxima do fim, no entanto, “Depois da Cabana” perde um pouco da força dos episódios iniciais. Os arcos vão se conectando e vamos conhecendo a verdade, mas ela talvez não seja tão interessante quanto algumas das possibilidades plantadas pela série anteriormente. Cria-se possíveis rumos e suspeitos, mas a solução apresentada não faz jus à excelente construção de mistério.
Ainda assim, a série mantém um clima de incerteza durante os seis episódios, mantendo a dubiedade de alguns personagens até o clímax e oferecendo uma boa recompensa ao final. Não é incrível, mas tampouco é uma daquelas séries de sucesso injustificado.
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