Lançada no Brasil pela Netflix, a série israelense“Jornada de Heróis” acompanha quatro amigos que partem no que julgam ser uma missão suicida: encarar a selva colombiana para resgatar a irmã de um deles. Bem escrita e com personagens interessantes, a série mistura ação com arcos mais íntimos que têm os amigos lidando com traumas e fantasmas do passado. Em dez episódios, porém, a narrativa parece se arrastar e se repetir a partir de determinado ponto.
“Echo 3”, que estreia quarta (23) na AppleTV+, se baseia na série israelense, mas aposta em uma assinatura própria. Criada por Mark Boal, produtor de filmes de Kathryn Bigelow (“Guerra ao Terror”, “A Hora Mais Escura”), a série tem o que se espera de narrativas de guerra, com muitos tiros, arcos heroicos, sacrifício, redenção e bandeiras americanas tremulando sem motivo algum, mas busca uma ousadia narrativa inesperada em alguns momentos, tornando-se bem mais interessante para um público cansado de fórmulas de gêneros.
“Echo 3” acompanha Prince (Michiel Huisman) e Bambi (Luke Evans), dois soldados das Forças Especiais altamente treinados e experientes em operações de extração em solo estrangeiro. Após um breve prólogo, vemos Prince se casar com a irmã de Bambi, Amber (Jessica Ann Collins), e conhecemos um pouco da cumplicidade entre os colegas soldados, criando um necessário clima de camaradagem.
A lua de mel, porém, terá que esperar. Drifter (Dominic Fumusa), o líder do pelotão, recebe uma ligação e todos devem partir para uma missão no Afeganistão na manhã seguinte. Acompanhamos um pouco dos percalços da missão, que não sai como o esperado, e entendemos ainda mais a dinâmica de Prince e Bambi, assim como o modo deles pensarem e agirem como um grupo.
Quando retornam, as coisas não são mais como eram antes e é a vez de Amber, uma PhD em psicofarmacologia, partir em viagem para a Colômbia, onde realiza pesquisas sobre as propriedades de alucinógenos no combate à dependência química, e acaba sequestrada por um grupo de rebeldes que desconfiam de suas reais motivações. É óbvio que Prince e Bambi logo partem em busca de Amber para colocar a série em movimento.
É interessante como Mark Boal utiliza o tempo que tem para desenvolver seus personagens, construir situações e contar histórias diferentes - só na já citada sequência do casamento, já é possível conhecer um pouco mais os personagens que acompanharemos dali em diante. “Echo 3” poderia ser um filme ou uma minissérie em quatro ou cinco episódios, mas teria que sacrificar algumas camadas da série. Da maneira como se desenvolve nos cinco episódios iniciais, a trama toca em temas como a política da América do Sul, fala sobre vício e nos permite conhecer Prince, Bambi e Amber ao invés de simplesmente relegá-los a papéis pré-definidos de militares super treinados e americana em perigo nas mãos de milícias selvagens sul-americanas.
A cadência permite também que a ação de “Echo 3” tenha peso dentro da trama, pois acompanhamos a preparação para chegar àquele ponto e já sabemos previamente do que os soldados são capazes. Ao aproximar Prince e Bambi do público, o texto oferece a identificação e faz com que nos preocupemos com aqueles personagens, entendendo suas dores e suas motivações. Da mesma forma, o roteiro oferece texto a Amber, com um episódio completamente dedicado a ela e em seus sequestradores.
“Echo 3” também acerta ao filmar a América do Sul com diretores sul-americanos. Dos episódios disponibilizados para a imprensa, dois foram dirigidos pela peruana Claudia Llosa (“A Teta Assustada”) e outros dois pelo argentino Pablo Trapero (“Abutres”, “Elefante Branco”) - o outro, centrado em Amber, foi comandado pelo próprio Mark Boal. A série explora bem cenários e a geografia da selva colombiana para reforçar a dificuldade da missão de resgate. A selva é utilizada também nos momentos mais artísticos e reflexivos da série, quando a narrativa busca o silêncio em meio a ação e explora os belos cenários naturais que contrastam com a violência e os conflitos que são a essência da série.
Com base na primeira metade, “Echo 3” é ótima. A série tem plena ciência de suas limitações, como uma história pouco original, e, por isso, investe na assinatura de um autor. Mark Boal cria uma série de ação que foge do usual ao desenvolver seus protagonistas sem pressa e ao mesclar o cinema de ação com a arte, explorando os belos momentos de contemplação oferecidos pela narrativa.
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