Quando o trailer de “Extrapolations” foi divulgado, poucas semanas atrás, o elenco da minissérie da Apple logo chamou a atenção. Nomes como Meryl Streep, Edward Norton, Marion Cotillard, Diane Lane, Kit Harrington, Judd Hirsch e Matthew Rhys não se envolveriam, afinal, com um produto ruim, certo? “Errou feio, errou rude”.
Uma espécie de antologia ecológica em oito episódios, “Extrapolations: Futuro Inquietante” conta histórias de personagens diferentes habitando o mesmo futuro, um planeta consumido pelo aquecimento global, com cidades litorâneas sendo inundadas pelo derretimento das calotas polares, incêndios, surgimento de novas doenças e agravamento de antigas.
Criada e dirigida por Scott Z. Burns, a série tem início em 2037, quando somos apresentados a alguns conceitos e a muitos personagens. O primeiro episódio apresenta vários personagens, mas tem dois arcos bem definidos, o da ativista Rebecca (Sienna Miller), prestes a dar à luz o primeiro filho com o diplomata argelino Omar (Tahad Rahim), e o do milionário Junior (Matthew Rhys). Com pouco ou nenhum desenvolvimento, os personagens já se enquadram no que o texto de Burns requer, heróis e violões.
Junior é caricato, um agente capitalista que trata todos a seu redor com desprezo e não se importa com nada além do dinheiro - acha ótimo, por exemplo, poder construir novos empreendimentos em lugares antes ocupados por grandes calotas polares. A série também apresenta Nick Bilton (Kit Harrington), um multimilionário supostamente “bonzinho”, um sujeito que se disponibiliza a ceder patentes, mas só depois de identificar nessa cessão uma possibilidade de ganhar dinheiro.
Do outro lado estão os idealistas. Rebecca vive dilemas, não sabe se vale a pena colocar uma criança naquele mundo e questiona se sua atuação não poderia ser mais eficaz se fosse parte do sistema, utilizando os recursos oferecidos por ele. O arco da personagem ganha mais força no segundo episódio, com um salto temporal até 2046, quando descobrimos também o que ocorreu com ela após o primeiro episódio.
“Extrapolations” tem ideias e conceitos interessantes, mas sofre demais com a surpreendentemente péssima qualidade do texto de Scott Z. Burns. Roteirista veterano na indústria, Burns tem em seu currículo filmes como “Contágio” (2011), que viveu um boom de popularidade no início da pandemia de Covid-19, em 2020, por “prever” alguns aspectos da doença que atingiria o mundo quase dez anos depois de seu lançamento. Na série, no entanto, Burns perde a mão não em suas previsões, pois se trata de uma ficção científica, mas no desenvolvimento dos personagens.
A série da AppleTV exagera na construção de heróis e vilões, assim como no imediatismo das consequências. Como uma semi-antologia com todos os personagens no mesmo universo, mas com arcos separados, “Extrapolations” busca introduzir uma história e encerrá-la no mesmo episódio, mas também trata de outros personagens que terão mais destaque adiante, ou seja, não há tempo para desenvolvimento. Assim, tudo é imediato e nunca nos apegamos a ninguém - nem mesmo alguns desfechos que deveriam ser satisfatórios funcionam dessa forma, pelo contrário, parecem apressados, como o final do primeiro episódio.
Não há meio-termo em “Extrapolations”, ou são bons, preocupados com o mundo, ou são capitalistas selvagens dispostos a deixar o mundo queimar em nome do lucro. O terceiro episódio, que trata de alguns questionamentos sobre punições divinas e a existência ou não de um deus, até ensaia algo mais próximo da área “cinza” na figura do rabino Marshall Tucker (Daveed Diggs), mas o recado dado pelas imediatas consequências é claro, acabando com qualquer sutileza, o que é reforçado pela cena final.
“Extrapolations: Futuro Inquietante” tem algumas ideias geniais, mas elas nunca são exploradas. Ao invés disso, talvez com o intuito de se tornar mais urgente, a série aposta no didatismo e na repetição de conceitos básicos já apresentados e compreendidos pelo espectador. É até interessante ver a entrega de alguns atores a seus papéis, mas o subaproveitado elenco nem de longe faz a série da Apple valer a pena.
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