Ao contrário de Sylvester Stallone, que fez sua recente estreia em séries em um papel mais dramático e relativamente distante do habitual em sua carreira na ótima “Tulsa King”, Arnold Schwarzenegger optou pelo lugar seguro. “FUBAR”, lançada pela Netflix, é facilmente relacionável com tudo o que o ator austríaco fez em sua carreira e sabe da força que isso tem em despertar nostalgia.
Em oito episódios de mais ou menos 45 minutos, a série tem Schwarzenegger como Luke, um agente da CIA prestes a se aposentar. Logo de início o vemos em uma missão na Bélgica, sempre com o suporte de Barry (Milan Carter), um talentoso agente que não pode ir a campo. Quando volta aos EUA, Luke se reúne com a família, a filha Emma (Monica Barbaro) e a ex-esposa, Tally (Fabiana Udenio), pessoas de quem precisou manter segredo durante muitos anos.
Antes da aposentadoria, porém, ele é convocado para uma última missão (sempre ela), lidar com Boro (Gabriel Luna), um possível terrorista em ascensão que vê Luke como um benfeitor – o agente se sentiu culpado ao matar o pai de Boro (que não sabe disso) e, por isso, bancou sua educação. A CIA já tem um agente em campo, mas ele está prestes a ser descoberto e precisa ser extraído com urgência. Ao chegar lá, uma surpresa: o agente em questão é Emma, filha de Luke, infiltrada na guerrilha de Boro com uma soldada americana que teria desertado.
Tudo isso acontece muito rápido, no primeiro episódio, que tem um arco relativamente fechado, com a solução para aquele conflito, ao mesmo tempo em que introduz a trama da temporada inteira. Vendida como série de ação, “FUBAR” funciona melhor como uma comédia familiar com alguns elementos de cinema de ação. Schwarzenegger, aos 75 anos (o personagem tem 65), obviamente não tem físico para viver as peripécias que o papel demanda – na verdade, tem até alguns problemas de mobilidade. Assim, é fácil perceber a computação gráfica ou os dublês em cena.
“FUBAR” depende que o espectador questione pouco seus conceitos. Como Luke e Emma, que trabalham na mesma agência, no mesmo prédio, nunca se esbarraram por lá? Pouco importa, o texto “explica” rapidamente e nunca volta atrás nesse arco. Pai e filha passam, então, a operar como em um filme de duplas, duas pessoas com personalidades e métodos diferentes tendo que atuar juntos em nome da segurança global, tudo temperado por rancores familiares, pois ambos foram enganados durante anos.
Criada por Nick Santora (“Reacher”), “FUBAR” em muito lembra o hoje clássico noventista “True Lies” (1994), principalmente na dinâmica entre os protagonistas. Mesmo não tendo envelhecido muito bem, o filme de James Cameron misturava ação de blockbuster com um agente da CIA (Schwarzenegger) tendo que trabalhar ao lado de sua esposa (Jamie Lee Curtis) que não fazia ideia da profissão do marido. O problema é que, com uma narrativa muito mais longa, a série da Netflix se repete com frequência, eliminando aquela sensação de o espectador estar assistindo a uma diversão rápida – uma temporada de oito episódios de 45 minutos requer compromisso.
“FUBAR” é mais interessante se analisada como uma comédia, um pastiche do cinema de ação de décadas passadas. O texto faz várias referências a filmes de Schwarzenegger e contrapõe a imponência do ator à figura meio “bobalhona” que a série constrói para ele. Às vezes funciona, como em algumas conversas mais íntimas de Luke e Emma ou quando ele descobre um vibrador da filha. Em outras cenas, porém, a relação parece artificial, o que se dá muito em função da construção de Emma como uma menina birrenta, uma tentativa do roteiro sugerir que ela está, sem saber, seguindo os passos do pai.
Entender “FUBAR” como uma série essencialmente cômica também ajuda a mascarar seus defeitos, como, por exemplo, a pouca importância da morte no roteiro. Inimigos são torturados e eliminados em meio a piadas trocadas pelos protagonistas, algo até meio sádico, sem que isso nunca seja tratado pela série com o devido peso. Tudo parece uma fantasia, característica recente do cinema de ação com pegada de humor, como o recente “Ghosted”, que sofre com o mesmo problema.
Se a ideia é remeter ao cinema de ação dos anos 1980 e 1990 para se garantir na nostalgia, a série se sai bem. A ação tem bons momentos, mas a maior parte das cenas é genérica, com coreografias e efeitos especiais bem questionáveis. Por isso, após o agitado primeiro episódio, a série se sustenta no humor familiar que garante algumas boas risadas.
“FUBAR” se repete em sua estrutura e é totalmente previsível, mas tem no carisma meio “duro” de Schwarzenegger sua grande força e seu maior atrativo. Fosse o protagonista um ator sem um histórico no gênero, a série dificilmente prenderia a atenção do espectador.
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