É fácil tentar vender “Gangs of London” como uma espécie de “Peaky Blinders” moderna, afinal, tal qual a série sobre a família Shelby, ela se passa na Inglaterra e trata de gangues lutando pelo controle de uma cidade - sai Birmingham e entre, obviamente Londres. Ainda, a série tem Joe Cole, o John Shelby de “Peaky Blinders”, como protagonista. Há, no entanto, diferenças que fazem “Gangs of London” uma série distinta.
Seu criador, Gareth Evans, ficou famoso com os dois filmes “The Raid” (que por aqui ganharam os péssimos títulos de “Operação Invasão”), obras fortemente influenciadas pelo cinema asiático de ação dos anos 2000, ou seja, cheias coreografias complexas e violência crua, daquelas que fazem com que o espectador contraia o rosto em diversos momentos, dividindo, de certa maneira, a dor dos personagens.
Lançada no Brasil pelo Starzplay, serviço com bom catálogo ("Normal People" é incrível), mas que ainda não engrenou, “Gangs of London” tem início com o assassinato de Finn Wallace (Colm Meaney) um chefão irlandês da máfia londrina. O texto já nos apresenta o assassino, mas sabemos tão pouco quanto os outros envolvidos sobre quem é o mandante do crime e quais os interesses estão por trás dele, que obviamente deixa uma lacuna de poder no crime organizado de Londres.
A morte do mafioso deixa a organização nas mãos de quem o ajudou a construí-la, Ed (Lulcian Msamati), melhor amigo de Finn desde os anos 70, quando a Inglaterra viveu uma onda racista que discriminava irlandeses e negros ("no black, no irish"), que, por sua vez, uniram forças. Após a morte do amigo, Ed tenta manter as coisas no lugar e tomar cuidado com cada passo dado. Em posição oposta está Sean (Joe Cole), o filho mais velho e ávido por vingança de Finn.
No meio da confusão toda está Elliott (Sobe Dirisu), um policial infiltrado na organização e que acaba se envolvendo mais do que deveria com os cabeças das gangues. A série ainda traz Michelle Fairley (a Catelyn Stark de “Game of Thrones”) ótima como a matriarca dos Finn, uma personagem bem mais complexa do que aparenta a princípio.
Dividida em nove episódios de cerca de uma hora cada (o primeiro tem 90 minutos), “Gangs of London” mistura a violência crua do trabalho de Gareth Evans a elementos investigativos e tramas que cadenciam a trama. Apesar de explícita, a violência, na maior parte do tempo, não é gratuita, apenas parte daquele mundo, quase um estilo de vida para algumas pessoas. É curioso perceber que algumas subtramas se estendem demais apenas para render boas sequências de ação.
Apesar do título se referir a Londres, “Gangs of London” é uma série que mostra a globalização do crime - mafiosos da capital britânica têm ligações na Nigéria e na Turquia, por exemplo, e tudo se encontra na moderna e cosmopolita Londres.
É interessante como Gareth Evans mostra as famílias de forma diferente das já trazidas por cineastas como Guy Ritchie. Os mafiosos de “Gangs of London” têm muito mais similaridades com a máfia italiana, elegantes e até refinados, com belos ternos e aquele ar de “O Poderoso Chefão”. O texto também se preocupa em mostrar o funcionamento de uma organização criminosa cada vez mais preocupada em legalizar seus negócios e deixar de vez o crime - o que, claro, não é uma tarefa fácil.
“Gangs of London” tem um bom texto, boas atuações e reviravoltas convincentes, mas ela se destaca mesmo é por sua ação. Sob toda a premissa de uma luta por poder, há ação para nenhum fã do gênero botar defeito - quem conhece o trabalho prévio de Evans sabe o que esperar. Poucas séries e poucos filmes recentes têm tamanha qualidade em cenas de brigas, trocas de tiro ou perseguição; é tudo bruto, violento e bem filmado ao extremo. Um espetáculo que confere à série um ar de imprevisibilidade em que tudo pode acontecer e tememos por todos os personagens.
Lançada pelo serviço HBO Max em abril deste ano nos EUA e na Inglaterra, a série já foi renovada para a segunda temporada, o que é um alívio, pois o gancho deixado ao fim do décimo episódio é ótimo. "Gangs of London" funciona muito bem como uma história de máfia, uma disputa por poder, uma trama sobre traição, família e lealdade, mas é imperdível mesmo é para os fãs de cinema de ação que talvez nunca tenham visto esse nível de qualidade em uma série.
Este vídeo pode te interessar
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.