“Ghosted: Sem Resposta”, comédia de ação da AppleTV+, busca um resgate a filmes como “Sr. e Sra. Smith”, “O Caçador de Recompensas”, “Encontro Explosivo” e até ao clássico noventista “True Lies”. A fórmula, sem segredos, é colocar um interesse romântico em meio a muita ação, uma mistura de gêneros que agrade tanto quem busca uma comédia romântica quanto quem prefere o barulho das explosões. O lançamento da AppleTV+, no entanto, tem uma influência que não faz questão de esconder, o Universo Cinematográfico Marvel.
A ideia de transformar “Ghosted” em uma comédia romântica de super-heróis fora de um universo cinematográfico vem da gênese do filme, que pretendia reunir Scarlett Johansson, e Chris Evans, respectivamente a Viúva Negra e o Capitão América do Universo Marvel. A atriz desistiu do filme e acabou substituída por Ana de Armas - a ideia, no entanto, permaneceu.
Dirigido por Dexter Fletcher (“Rocketman”), o filme logo introduz seus protagonistas. Sadie (Ana de Armas) é uma curadora de artes que viaja o mundo sem criar vínculos; quando chega a Washington, ela conhece o charmoso Cole (Chris Evans), um fazendeiro ingênuo com vasto conhecimento de botânica e agricultura, mas que pouco conhece do mundo. A atração é imediata, com trocas de olhares, flertes e muita tensão sexual - dali, eles saem direto para um café, que vira um encontro, que vira uma noite bem agitada.
No dia seguinte, ele acredita ter encontrado o amor de sua vida, mas não tem mais notícia dela, que não responde suas mensagens, ou seja, Cole tomou um “ghosting” de Sadie (daí o título do filme). Incentivado por seus pais irritantemente positivos, ele descobre que ela está em Londres e ouve o péssimo conselho: “por que você não vai até lá atrás dela”? Assim, o jovem, que nunca havia saído do país, parte para a capital inglesa, é sequestrado após a chegada, dopado e confundido com um misterioso super agente chamado “Taxman” (que rende boas piadas com a música homônima dos Beatles) antes de descobrir, na verdade, que Sadie é uma agente da CIA. Os dois viram alvos de uma organização criminosa comandada pelo personagem de Adrien Brody, que está atrás de uma arma superpoderosa, e acabam tendo que salvar o mundo da ameaça. Isso tudo, claro, em meio a flertes, brigas e provocações.
“Ghosted” tem ótimos e grandiosos momentos de ação, todos ao estilo Marvel, com cenas rechegadas de computação gráfica, inimigos genéricos que atacam em hordas e nenhuma gota de sangue, mesmo queo número de mortes impressione. Incomoda o descaso dos personagens com a violência, pois eles passam grande parte do tempo trocando diálogos rápidos durante a ação, mantendo o bom humor o tempo todo - exceção feita a uma cena em que Cole se sente incomodado por matar um capanga, incômodo este que passa bem rápido.
Dexter Fletcher é um diretor bem correto, sem grandes ousadias, mas capaz de entregar o prometido (até por isso foi chamado para terminar o péssimo “Bohemian Rhapsody” após a saída de Bryan Singer). Com roteiristas oriundos dos filmes de heróis (“Deadpool” e os mais recentes “Homem-Aranha”), o diretor cumpre bem a premissa básica, a inversão de gêneros, com Ana de Armas no lugar da talentosa agente e Chris Evans como o ingênuo bonitão em perigo, mas que também coloca a mão na massa. A atriz, que já mostrara seu talento para a ação em “007 - Sem Tempo Para Morrer” e que foi escolhida para “Bailarina”, spin-off de “John Wick”, brilha sempre que tem que enfrentar inúmeros e inexpressivos vilões (números para a pilha de corpos). Evans, por sua vez, vai bem na ação e mantém uma artificialidade canastrona que funciona quase como ingenuidade, mas sofre nos poucos momentos mais dramáticos ou quando o texto pede algo além de ser bonito.
A relação entre os protagonistas, a alma do filme, convence no início, antes de toda ação, mas se torna expositiva demais no decorrer das duas horas de filme - diretor e roteiristas optam por “falar, não mostrar” a profundidade dessa relação, tornando cansativo e frustrante que o casal a todo tempo expresse suas emoções em diálogos repetitivos.
Não há picos de emoção ou construção de tensão, o final é inevitável desde a primeira cena, a razão do filme existir, e todos sabemos para onde o filme caminha. A jornada, por isso, ganha importância, mas “Ghosted” é um filme sempre no mesmo tom, seja na ação, seja no romance ou seja no humor. Isso não é necessariamente um demérito, uma vez que o filme busca essa leveza, entregando algumas boas piadas e ótimas participações especiais que, mais uma vez, e intencionalmente, o conectam ao universo de super-heróis.
“Ghosted: Sem Resposta”, ao fim, é uma bobagem divertida, um passatempo a ser brevemente esquecido, mas que não irrita por sua efemeridade. A necessidade de o roteiro repetidamente nos dizer como devemos nos sentir a respeito da inversão de gêneros, ao invés de fazer com que o espectador sentisse isso, quase põe tudo a perder. Com outros atores, o filme nem chamaria atenção, mas com Ana de Armas, linda, e Chris Evans, lindo, uma comédia romântica dificilmente passaria despercebida.
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