A gente tem o hábito de classificar obras segundo nossa memória afetiva. Tem o filme “Sessão da Tarde”, o thriller erótico “Cine Privê”, os suspenses “Supercine”, e por aí vai. A primeira das três classificações sempre foi a melhor delas, com filmes antigos, mas que fizeram sucesso e hoje fazem parte do imaginário popular, moldando caráteres nos anos 1980 e 90. As outras duas “sessões” listadas, porém, sempre foram de gosto duvidoso.
O “Cine Privê” era o lugar de obras baratas, de qualidade baixa, mas que continham alguma nudez. Já os filmes “Supercine” eram, em sua maioria, suspenses lançados diretamente para as locadoras ou filmes que tiveram pouco sucesso nos cinemas, obras simples, que utilizavam fórmulas batidas, às vezes com algum rosto conhecido no elenco. Todas essas produções agora se encontram no mesmo lugar, as plataformas de streaming, e acabam fugindo de seus nichos. “Por Trás da Inocência”, por exemplo, poderia estar no “Cine Privê”, mas está na Netflix; “A Mulher na Janela”, poderia passar nas noites de sábado da Globo, mas está na mesma plataforma; “The Voyeurs” curiosamente poderia estar em qualquer uma das duas, mas está no Amazon Prime.
“Intrusion”, que chegou nesta quarta (22) à Netflix, seria um filme ideal para fazer companhia a Serginho Groisman num sábado à noite. Dirigido por Adam Salky (do bom “I Smile Back”) e escrito por Chris Sparling (“Destruição Final: O Último Refúgio”), o filme traz a história do casal Meera (Freida Pinto) e Henry (Logan Marshall-Green) em seus primeiros dias na casa dos sonhos em uma cidade pequena e pacata.
Meera e Henry se dão bem, brincam um com o outro, se provocam o tempo todo e parecem ter um casamento feliz. As coisas mudam, porém, quando eles voltam de um jantar e encontram a casa revirada. O casal instala um sistema de alarme, mas logo a casa é invadida novamente, e agora com eles dentro.
Ao contrário do normal em filmes do gênero, a invasão em si não é a narrativa principal de “Intrusion”. A situação é resolvida, mas a vida de Meera e Henry muda para sempre com o surgimento de alguns segredos e de histórias mal contadas entre o casal. O que será que realmente está acontecendo naquela casa?
Adam Salky é sutil em um primeiro momento, fazendo bom uso de profundidade e sombras durante a invasão, mas essa sutileza é deixada de lado instantes após ser bem utilizada. É após a invasão também que o filme começa a se desenvolver e nos apresentar a péssima construção de Henry - a ideia é clara, o roteiro quer que desconfiemos dele desde o início e ele se comporta justamente para isso acontecer.
O roteiro depende demais da construção de Henry como um suspeito para funcionar, e é neste ponto que reside sua fraqueza. A atuação de Logan Marshall-Green se torna caricata e o personagem, odiável. Assim, independente de culpado ou inocente, nunca nos sentimos culpados por desconfiar dele. É importante ressaltar que algumas reviravoltas até são bem pensadas, mas executadas de maneira quase preguiçosa; uma delas, envolvendo a prisão de um personagem, é risível.
O terceiro ato de “Intrusion” tem mais uma grande virada para tentar fechar o filme de forma surpreendente, mas o faz da maneira mais didática possível, com flashbacks para mostrar o óbvio e com um das piores e mais absurdas explicações de um vilão de que me recordo.
“intrusion” é mais um exemplo de filme genérico no catálogo das plataformas de streaming. Um roteiro com personagens que entram e saem de cena, sem importância alguma, com uma ambientação interessante e uma trama até razoável, mas que tenta confundir o espectador e acaba se entregando sem grandes surpresas. As atuações rasas ajudam na sensação de que falta algo ao suspense. Seria um tapa buracos razoável na programação noturna da TV aberta, mas ganhará uma tração que não merece na Netflix.
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