“‘Gueto’ é uma forma de celebrar de onde eu vim, celebrar as conquistas, meus contratos. É sobre ser uma mina preta, retinta, da zona norte do Rio, estampando comerciais, uma coisa que eu nunca tinha visto. Queria levar esses sentimentos pra outras pessoas e fazê-las se se sentir assim”, conta Iza, logo na primeira resposta da entrevista para o lançamento de “Gueto”, seu novo clipe.
Uma das maiores estrelas da música pop brasileira desde o lançamento de “Dona de Mim”, em 2018, a cantora carioca voltou-se para suas raízes e para dentro de si no novo single. “É a primeira vez que falo tanto assim de mim. Acho que é bem pessoa. Esse tempo todo dentro de casa, olhando pra mina cara, tem que ter resultado em alguma coisa, né (risos)?”, brinca, antes de completar: “fiquei muito comigo em 2020 (risos). Acho que tô amadurecendo… Trinta anos, né?”
Iza também afirma ter conseguido tempo para refletir durante o isolamento social imposto pela pandemia. Segundo ela, o ritmo de trabalho, gravações e estrada não a permite realmente enxergar “o que tá rolando”. “Mesmo que eu tivesse me sentindo mal, uma farsa, sempre tem gente aplaudindo, que faz festa quando me vê, dando carinho. Quando eu tava em casa, sem cílios postiços, sem aplique, tive que olhar pra mim e lidar com minhas inseguranças”, revela.
Esse olhar para o interior é notado em “Gueto”. Na letra, Iza relembra a infância na periferia com nostalgia e valorizando sua luta para chegar aonde chegou. Filmado em três dias, o clipe tem momentos distintos. Algumas sequências foram filmadas em uma fábrica em São Paulo, onde a equipe recriou o clima dos subúrbios cariocas. A autenticidade vem mesmo é com as cenas gravadas no tradicional santuário de Nossa Senhora da Penha, um dos cartões postais da zona norte do Rio de Janeiro. “Foi um trabalho grandioso, parecia um filme. Fazer tudo com os devidos testes (para Covid) e com segurança fica muito caro”, pondera a cantora.
A música abraça diversas características tão comuns aos subúrbios Brasil afora, um gueto colorido, cheio de vida, lúdico, bem cuidado e animado. Uma característica, porém, chama a atenção: as ruas pintadas com clima de Copa do Mundo. “Eu amo essa coisa de pintar a rua, fiz em todos os subúrbios em que morei. Era criança, não sabia que era liberado, não precisava de autorização nem nada. Se tivesse uma fitinha na rua, não passava nem caminhão”, brinca.
A lembrança afetiva da cantora ganha até outro sentido. Como em Copa do Mundo, bandeiras do Brasil, que infelizmente ganharam outros significados políticos recentes, invadem as ruas de “Gueto”. “A bandeira é linda e é nossa. Tá foda? Tá, mas a gente é foda! Eu amo nossa bandeira e quero que as pessoas me vejam jogada na BR em cima dela”.
Iza
Cantora
" Num momento em que é tão difícil fazer arte, tudo muda, tudo é ressignificado. Não é legal ser exceção, não quero que as coisas sejam assim. Acho que é a primeira vez que eu falo de mim na música, mas não é sobre ser eu, é sobre abrir as portas pra tanta gente incrível, tanta gente que é vetor de mudança musical e não tem visibilidade. "
“Gueto” tem uma mensagem forte de representatividade. Iza quer mostrar que é possível, quer ser para um público o exemplo que ela nunca teve. “A gente precisa se ver fora dos lugares que a sociedade enxerga pra gente como esterótipos. Isso já melhorou, mas tem que melhorar muito mais. Eu sei que não represento todas as mulheres negras”, explica.
A letra de “Gueto”, inclusive, faz referência à Globo. Iza, vale ressaltar, é uma das juradas do “The Voice Brasil”. “Quando eu falo ‘mama, eu tô no Plim Plim’, é como se fosse a famosa placa ´mãe, tô na Globo´. Não é sobre estar na Globo, mas sobre a mudança que a empresa que me contrata resolveu fazer dentro dela. Toda vez que uma empresa me contrata, ela faz uma mudança, contrata uma mulher preta, de Olaria”.
A presença de Iza em tela é gigante. Linda e carismática, a cantora se comunica com diversos públicos e busca cada vez mais, de forma natural, servir de inspiração para seus pares. “Não tem como falar pra onde eu tô indo se eu não souber de onde eu vim. A gente tem que contar as nossas histórias. Eu não fazia ideia, por exemplo, que as escravas escondiam arroz nas tranças pra alimentar as crianças. Por que eu não aprendi isso na escola? A Beyoncé, com o ‘Black is King’, me encourajou muito a falar de onde eu vim. Espero que meu trabalho tenha o impacto na vida de ao menos uma pessoa da mesma forma que o dela me inspirou a encontrar minha voz”.
E parcerias, será que teremos surpresas? “Eu ia amar fazer música com a Ludmilla. A Lud é a maior cantora negra do país. Agora, toda a história do Sam Smith foi um delírio coletivo, né? (risos). Seria uma honra, mas o brasileiro não tem limite e saiu marcando a gente em todos os posts (risos)”.
O lançamento do clipe é o primeiro passo para o aguardado segundo disco. Ainda sem poder fazer shows e sair em turnê, Iza tem pensado em soluções audiovisuais para levar o trabalho para seu público. A tendência, agora, é que “Gueto” ganhe companhia de novas músicas no segundo disco de Iza. A cantora garante que não haverá nenhuma mudança musical brusca, mas que vai haver a variedade que sempre a acompanhou com ritmos de reggae, R & B, trap, dance hall, uma mistura brasileiríssima. As músicas, segundo ela, já estão prontas, falta apenas selecionar as que entrarão no disco.
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