“Kill Boksoon”, filme coreano lançado pela Netflix, tem duas fortes e notáveis influências, a série de filmes “John Wick”, de Chad Stahelski, e os dois “Kill Bill” (a quem faz referência até no título), de Quentin Tarantino. A ironia é que tanto Stahelski quanto Tarantino foram influenciados pelo cinema de ação asiático, de épocas diferentes, para criar seus clássicos modernos, tornando o filme escrito e dirigido por Byun Sung-hyun (do bom “Kingmaker”) quase uma retroalimentação.
De “John Wick”, “Kill Boksoon” pega emprestado o aspecto organizacional dos assassinos. No mundo do filme há empresas de assassinos que normalmente fazem os assassinatos parecem mortes naturais, suicídios, briga de rua - um serviço normalmente utilizado por poderosos para eliminar rivais políticos, empresariais ou por pura vingança. Os assassinos são contratados dessas empresas que se organizam em um grande sindicato cheio de regras e consequências.
Gil Boksoon (Jeon Do-yeon) é uma lenda no ramo e ainda uma assassina de alto escalão. Quando a conhecemos, ela está prestes a assassinar um membro de alto escalão da máfia japonesa, a Yakuza, em um duelo que já dá o tom do filme. Há humor nos diálogos entre a protagonista e seu alvo, mas também há muito estilo nas lutas - aspecto em que a influência de “Kill Bill” aparece com mais força. É interessante como Boksoon pensa em todas as possibilidades do combate para criar uma estratégia no qual tem mais chances de sair vencedora, algo parecido com o que Guy RItchie fez em seus “Sherlock Holmes”.
Depois dessa introdução, porém, conhecemos a Boksoon mãe solteira da adolescente Gil Jae-young (Kim Si-A) e autora da frase “matar pessoas é mais simples que criar uma filha”. A jovem vive um período de descobertas e problemas na escola, não sendo mais tão próxima da mãe quanto antes. O filme traça breves paralelos entre a criação da protagonista e a de sua filha, mas nada que realmente importe à trama - o arco serve apenas para humanizar Boksoon diante do olhar do espectador, um recurso batido e nem sempre eficaz.
Durante uma missão, Boksoon se recusa a cumprir ordens e acaba se tornando um alvo de antigos colegas ávidos por seu posto na maior agência de assassinos do mundo. “Kill Boksoon” demora mais do que o necessário para chegar a este ponto, tornando parte de seus 130 minutos pouco atrativa. Quando o faz, porém, o filme traz ótimas sequências de ação que apostam em um combate mais físico, sem muita utilização de armas de fogo, outra influência do filme de Tarantino.
“Kill Boksoon” se perde um pouco ao tentar equilibrar os lados da protagonista, mas é interessante como o texto não coloca Gil Jae-young em risco como recurso para causar tensão ou movimentar o roteiro. As tramas se envolvem, sim, de maneira até bem sutil, fugindo das do cinema coreano pop. Mesmo não representando uma grande surpresa à trama, essa conexão é o que dá ao filme um mínimo de abertura à subjetividade do espectador. Não se engane, o didatismo e a exposição ainda existem, com personagens explicando todas as regras daquele mundo, como é característica do cinema coreano, mas nunca chega a incomodar.
O roteiro de Byun Sung-hyun tem mais méritos do que defeitos. “Kill Boksoon” se entende como filme pop e com necessidade de ser facilmente consumível em uma plataforma como a Netflix. A violência é gráfica, mas artificial, com muito sangue digital e câmera lenta para destacar a potência dos golpes. É nas coreografias e na inventividade das lutas que o filme se destaca, com muita utilização do ambiente durante os combates, algum humor e um senso estético interessante.
“Kill Boksoon” não é incrível, mas é um bom filme de ação com boas influências. Falta ao filme uma assinatura mais autoral e uma execução mais enxuta, mas o universo é bem estabelecido e as sequências de ação são ótimas, já fazendo o clique valer a pena para os fãs do estilo ávidos por mais “John Wick” ou órfãos de “Kill Bill”.
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