Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

Lançado pelo Star+, "O Menu" é um dos filmes mais legais de 2022

Estrelado por Anya Taylor-Joy e lançado pelo Star+ após passagem discreta pelos cinemas "O Menu" mistura comédia, terror e alta gastronomia

Vitória
Publicado em 17/01/2023 às 18h37
Filme
"O Menu" mistura terror, comédia e alta gastronomia. Crédito: Star+/Divulgação

A guerra de classes sempre esteve presente no cinema, de “Anjo Exterminador” (1962), do surrealista Luis Buñuel, ao recente vencedor do Oscar “Parasita” (2019), de Bong Joon-ho, mas a sensação satisfatória de ver bilionários se dando mal tem crescido à medida que cresce também a exposição deles (alô, Elon Musk!) e o sentimento de que a existência dessa concentração de renda não é socialmente benéfica. Assim, séries como “Succession” e “The White Lotus” e filmes como “Glass Onion” (2022), de Rian Johnson, e o vencedor da Palma de Ouro em Cannes “Triângulo da Tristeza” (2022), de Ruben Östlund, ganham relevância. Em comum, narrativas que ridicularizam os bilionários, seus comportamentos e a indiferença com que tratam o resto do mundo.

“O Menu”, de Mark Mylod, é mais um desses filmes. Com passagem discreta pelos cinemas no Brasil, o filme, um dos melhores de 2022, chega nesta quarta (18) ao Star+ com pegada similar à dos citados no parágrafo anterior, mas abrangendo outras pessoas também facilmente “odiáveis”.

O filme tem início com Margot (Anya Taylor-Joy) acendendo um cigarro antes de ser interrompida por seu acompanhante, Tyler (Nicholas Hoult), afirmando que ela estaria “matando o paladar” - “então meu paladar vai morrer feliz”, responde a jovem. Logo, outras pessoas chegam ao local de embarque, entre eles Lilian (Janet McTeer), uma renomada crítica gastronômica, e um astro do cinema vivido por John Leguizano (personagem que nunca tem seu nome revelado), ambos com seus acompanhantes. A eles se juntam um casal de idosos e um grupo de homens arrogantes funcionários de uma big-tech. Eles então partem para uma experiência no exclusivíssimo restaurante do chef Slowik (Ralph Fiennes), uma construção imponente, numa ilha paradisíaca de onde o chef e sua equipe tiram tudo o que precisam para suas receitas.

A princípio, todas as esquisitices parecem ser parte da excentricidade do meticuloso chef, mas tudo logo toma rumos inesperados. Antes da primeira grande virada, o texto é ótimo ao desenvolver os personagens e fazer com que o público entenda quem é quem ali enquanto cria teorias e tenta entender exatamente o que está acontecendo. O grande destaque da primeira metade de “O Menu” é o clima de que tudo pode acontecer, dando ao filme de Mylod um ar que mistura perigo e encanto. Essa preparação é ótima justamente para que o público se sinta parte do risco quando o caos toma conta do filme.

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"O Menu" mistura terror, comédia e alta gastronomia. Crédito: Star+/Divulgação

Sem entrar em spoilers desnecessários, “O Menu” mistura comédia e horror com muita eficiência. As belíssimas imagens dos pratos sendo preparados parecem saídas de especiais culinários e contrastam com a crescente sensação de perigo prato a prato apresentada pelo chef e por sua equipe.

Ralph Fiennes é ótimo como um sujeito metódico cujo único medo parece ser que a situação fuja do que foi planejado por ele. Da mesma forma, Anya Taylor-Joy funciona como alguém que visivelmente não se sente parte daquele mundo; sua Margot não compra os discursos de Slowik e representa uma “ameaça” ao chef para o desespero de Taylor, seu entusiasta acompanhante, um jovem de comportamento tóxico e disposto a tudo para agradar o chef até nos momentos mais sinistros.

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"O Menu" mistura terror, comédia e alta gastronomia. Crédito: Star+/Divulgação

Há a sensação de que o roteiro poderia explorar mais o passado dos personagens individualmente, mas isso acarretaria, por exemplo, em uma justificativa do texto para fazer com eles o que faz. Da forma como é apresentado, os passados incompletos funcionam também para reforçar os absurdos do chef e de toda a situação.

“O Menu” passa longe da sutileza e da inteligência de “The White Lotus” ou “Succession”, mas o filme de Mark Mylod não busca essa característica, pelo contrário, ele busca o desconforto imediato, o choque e o estranhamento oriundo do impacto causado justamente por essa falta de sutileza.

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"O Menu" mistura terror, comédia e alta gastronomia. Crédito: Star+/Divulgação

É justamente quando busca o desconforto que o filme agora lançado pelo Star+ é melhor. No início do terceiro ato, o texto dá indícios de um final mais convencional e menos recompensador, mas felizmente logo retoma o rumo do que foi apresentado até então. Mesmo que a saída final não seja tão boa quanto o resto do filme, ela ao menos não é a mais fácil que o roteiro poderia tomar, e isso já é um grande mérito para um filme com os objetivos de “O Menu”.

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