Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

"Lou": Sucesso na Netflix, filme de ação beira o constrangimento

Apostando na fórmula de Liam Neeson em "Busca Implacável", "Lou" coloca Allison Janney em um filme de ação que tem mais cenas constrangedoras do que de ação

Vitória
Publicado em 25/09/2022 às 02h29
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Filme "Lou", da Netflix. Crédito: Liane Hentscher/NETFLIX

Desde que o sucesso de “Busca Implacável” (2008) ressuscitou a carreira de Liam Neeson, as tentativas de filmes de ação com atores improváveis se multiplicaram. Jennifer Garner, Pierce Brosnan, Zoe Saldaña, Nicole Kidman, Bob Odenkirk... Foram várias as tentativas de replicar a fórmula, mas poucas funcionaram. “Lou”, lançado pela Netflix, é mais uma dessas tentativas, mas infelizmente se encaixa no grupo dos que não deram certo. O filme tem Allison Janney no papel de uma mulher isolada do mundo que se vê obrigada a voltar a um passado quando o vilão sequestra uma menina da vizinhança.

Dirigido por Anna Foerster, cineasta com experiência em episódios de séries (“Outlander”, “Criminal Minds”) e poucos filmes (o péssimo “Anjos da Noite: Guerras de Sangue”), “Lou” é genérico desde o início e não se esforça para fugir disso. Conhecemos Lou (Allison Janney), uma senhora que vive isolada do mundo com seu cachorro, Jax, pouco antes de ela apontar um rifle para a própria cabeça - ela não tem nada a perder e o texto deixa isso claro.

De uns tempos para cá, Lou tem alugado o trailer ao lado de sua casa para Hannah (Jurnee Smollett), a mãe da menina sequestrada, Vee (Ridley Asha Bateman), mas não se dá muito bem com a inquilina. Lou é agressiva, cobra o aluguel sem muita flexibilidade e não faz questão nenhuma de ser simpática. Quando a criança é sequestrada, porém, Lou entra em ação.

O filme faz questão de mostrar a personagem-título queimando documentos secretos, pois temos que comprar a ideia de que Lou é especial e dona de habilidades únicas. O recurso funciona em um primeiro momento, mas também oferece um ar de clichê do gênero ao filme - quantas obras já não trouxeram um ex-agente ou ex-militar isolado que acaba tendo que usar suas habilidades para salvar alguém?

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Filme "Lou", da Netflix. Crédito: Liane Hentscher/NETFLIX

Ambientado na primeira metade dos anos 1980 (não que faça alguma diferença), como vemos pelos discursos de Ronald Reagan na TV, “Lou” falha muito na construção da tensão e no desenvolvimento dos personagens. Philip (Logan Marshall-Green), o vilão da história, é construído de maneira risível - sério, a cena da borboleta é uma das mais constrangedoras dos últimos tempos.

De forma didática, o roteiro nos explica que Phillip é um ex-soldado das Forças Especiais que tocou o terror na América Central, região onde os EUA interviram violentamente apoiando ditaduras e regimes autoritários em nome da “luta contra o comunismo”. As forças especiais americanas mataram e torturaram quem se colocava no caminho do exército americano, ou seja, guerrilhas locais e soldados dos próprios países invadidos. O personagem de Marshall-Green é apresentado como um especialista em bombas logo após, quem diria, deixar uma simpática bomba para matar a protagonista, pois é assim que "Lou" funciona, mostra e explica tudo para que não reste um pingo de subjetividade ao espectador.

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Filme "Lou", da Netflix. Crédito: Liane Hentscher/NETFLIX

O filme corre de maneira bem convencional até um pouco depois de sua metade, quando a virada se oferece ao espectador em uma revelação implausível e absurda. Não há nada até aquele momento que justifique ou explique o acontecimento. Além disso, o desenvolvimento do filme a partir deste ponto é ruim, abandonando personagens e situações pré-estabelecidas e se preocupando mais em criar algumas sequências visualmente interessantes.

“Lou” se vende como um filme de ação, um “Busca Implacável” em uma locação erma e estrelado por Allison Janney, mas não entrega o que promete. O filme de Anna Foerster busca um drama desnecessário e acaba refém das viradas do texto, que não funcionam. Assim, a ação, que normalmente justifica esse tipo de filme, acaba relegada a um trocentésimo plano - o que é uma pena, pois a primeira delas, com Lou na cabana, é ótima. É curioso notar como há poucas cenas de ação com a protagonista, algo impensável para um filme do gênero e que carrega o nome da personagem.

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Filme "Lou", da Netflix. Crédito: Liane Hentscher/NETFLIX

A direção de Anna Foerster desperdiça oportunidades e dá pouco destaque à dinâmica entre Lou e Hannah, o que daria peso ao terceiro ato. Ao invés disso, “Lou” é sempre superficial e didático, entregando a informação de maneira expositiva e esperando que o espectador compre aquilo, mesmo que o roteiro não faça esforço algum para vender aquele arco. O texto abusa do maniqueísmo na construção dos personagens e ignora o “cinza”, aquele espaço entre o bem e o mal que torna tudo mais interessante e de fácil identificação.

Allison Janney até se sai bem, mas é prejudicada pelo péssimo roteiro de Maggie Cohn e Jack Stanley. Mesmo com algumas poucas boas cenas de ação (poucas mesmo), “Lou” não se justifica e acaba refém da linguagem televisiva - um acontecimento um pouco mais grandioso no terceiro ato ocorre de forma constrangedora, com efeitos visuais dignos da novela "Mutantes". E quando achamos que talvez o constrangimento tenha passado, a cena final ganha a tela para provar que “Lou” possui mais momentos constrangedores do que boas cenas de ação.

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