“Com a M3gan ao seu lado, ela vai tomar conta das coisas pequenas enquanto você gasta seu tempo com o que importa”, diz Gemma (Allison Williams) como um slogan para sua criação. M3gan, no caso, significa “Model 3 Generative Android”, e se apresenta como uma boneca acompanhante capaz de se adaptar, observar padrões e até agir por conta própria quando assim julgar necessário, ou seja, uma inteligência artificial capaz de mudar o mundo.
“M3GAN”, dirigido por Gerar Johnstone a partir de texto de James Wan e Akela Cooper, não apresenta novidades, mas entrega justamente o que o público espera a partir das prévias que circularam bastante nas redes. O filme lida com o medo do avanço tecnológico desenfreado e com os limites que devem ser impostos aos dispositivos - a boneca, por exemplo, ouve tudo enquanto está desligada e assimila os comportamentos das pessoas a seu redor. Quer medo mais atual?
O filme tem início em um carro em uma estrada cheia de neve. Os pais de Cady (Violet McGraw) discutem na parte da frente enquanto a menina de nove anos brinca no banco de trás com um boneco de inteligência artificial com certa autonomia. Após um violento acidente, somos levados a Gemma e sua equipe trabalhando às escondidas em um projeto de inteligência artificial avançado; os chefes querem um concorrente para o boneco com o qual Cady brincava, mas Gemma quer ir além, quer revolucionar a indústria e, quicá, o mundo.
Descobrimos na sequência que Gemma é irmã da mãe de Cady, que não sobreviveu ao acidente, e com quem ela desejava que filha ficasse no caso de sua morte. Assim, às voltas com os projetos e sem a menor aptidão para ser mãe, Gemma passa a cuidar da criança a seu modo. Ela acaba recuperando um projeto antigo, M3gan (Amie Donald), e a transforma em uma companhia para a sobrinha, mas a que custo?
Desde o primeiro momento, o filme já discute os limites da inteligência artificial como em um conto de Isaac Asimov (“Eu, Robô”) ou um episódio de “Black Mirror”. Não demora para M3gan distorcer e até ignorar suas diretrizes para agir como entende ser correto, binariamente. Ao mesmo tempo, o filme discute a dependência tecnológica e o uso dos dispositivos como muletas de afeto, pois a robô é amiga, professora, cuidadora e principalmente, uma companhia para Cady enquanto a tia se afunda em trabalho.
Enquanto M3gan é vista como algo revolucionário, um “brinquedo” de US$ 10 mil, ela também apresenta um comportamento preocupante. Algumas mortes misteriosas começam a cercar a família de Gemma às vésperas do lançamento oficial da boneca-robô, que também já demonstra muito mais autonomia do que deveria, inclusive fazendo download de informações por conta própria para se adequar ao comportamento das pessoas a seu redor. Óbvio que a ânsia capitalista pela nova revolução do mercado prefere ignorar todos os sinais e manter o lançamento apesar das ressalvas de Gemma.
Uma ficção científica de terror, “M3gan” muito lembra também “O Anjo Malvado” (1993), de Joseph Ruben. A influência do filme estrelado pelo então astro Macaulay Culkin e Elijah Wood garante ao filme de Johnstone uma carga de drama familiar. Esse arco, no entanto, acaba sendo superficial e nunca vemos sobrinha e tia criando vínculos - talvez seja justamente essa a intenção do texto, mas a impressão é que Gemma se preocupa menos do que deveria com o afeto de Cady a M3gan.
É bem verdade, vale dizer, que “M3GAN”, o filme, existe como veículo pop para uma boneca/inteligência artificial assassina. O roteiro tem plena ciência do poder pop que tem em mãos e cria sequências visivelmente existentes para serem transformadas em memes e vídeos curtos na internet. É curioso como o filme foi pensado e filmado para classificação etária de 17 anos, mas acabou passando por refilmagens e adaptações para baixar essa classificação para 13 após a popularidade do trailer entre adolescentes no Tik Tok. Até surpreende o nível de violência que conseguiram com essa classificação, mas o filme se tornou bem menos “gore” e com menos mortes do que o imaginado originalmente.
Cheio de referências aos filmes protagonizados por Chucky (“Brinquedo Assassino” e tudo que veio depois até chegar à excelente série disponível no Star+), “M3GAN” mostra ter aprendido direitinho com seu antecessor boneco psicopata no quesito cultura pop. Sem o visual icônico e facilmente reproduzível do colega, a robô aposta em danças e em seu potencial de viralização para se estabelecer de vez na indústria. Como o filme custou US$ 12 milhões e em menos de uma semana rendeu praticamente dez vezes esse valor, a inevitável continuação já ensaiada pelo fim do filme, devidamente intitulada “M3GAN 2.0”, já tem até data de estreia (17 de janeiro de 2025).
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