Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

"Meu Namorado Astronauta", da Netflix, erra feio em tudo o que tenta

Série polonesa da Netflix sobre um homem que volta do espaço 30 anos depois tem boas ideias de ficção científica e romance, mas parece não saber o que fazer com elas

Vitória
Publicado em 21/02/2023 às 17h24
"Meu Namorado Astronauta", série polonesa da Netflix. Crédito: Michal Klusek/Divulgação
"Meu Namorado Astronauta", série polonesa da Netflix. Crédito: Michal Klusek/Divulgação

“Meu Namorado Astronauta”, nova série polonesa da Netflix, navega por alguns gêneros distintos. Em sua premissa, é uma narrativa de ficção científica, a história de Niko (Jędrzej Hycnar), um astronauta polonês escolhido para fazer parte de um projeto russo. Em sua essência, a série é um melodrama sobre a arrebatadora paixão de NIko por Marta (Vanessa Alexander, em 2022, e Magdalena Cielecka, em 2052), mulher que conhece um mês antes de partir para o espaço. Em nenhum dos dois gêneros, porém, ela chega perto de ser boa.

Com seis episódios de 45 minutos, “Meu Namorado Astronauta” tem início quando a nave de Niko, lançada e desaparecida em 2022 como um teste de dispositivo furtivo, reaparece misteriosamente em 2052, três décadas depois de Niko ser dado como morto. Ao resgatarem o piloto, a surpresa é o fato dele não ter envelhecido um dia sequer desde o lançamento. O que teria acontecido no espaço durante esses 30 anos?

A ideia funcionaria para diferentes arcos se bem explorada. Para Niko, foram só algumas horas entre decolagem e pouso, mas para Marta, por exemplo, se passaram 30 anos, período em que ela se casou com o antigo rival de Niko, Bogdan (Jakub Sasak, em 2022, e Andrzej Chyra, em 2052) e teve uma filha. Será possível reacender uma paixão dessa forma, em uma situação tão atípica?

A narrativa alterna linhas temporais, mas, nos primeiros quatro episódios, passa mais tempo no passado, construindo o triângulo amoroso de Niko, Marta e Bogdan e a rivalidade entre os pilotos, uma relação que, em momentos, beira o homoerotismo do primeiro “Top Gun”, por exemplo. Marta, ao centro, é a única personagem que realmente ganha algum desenvolvimento, mas, ainda assim, nada que mereça destaque. A falta de carisma dos personagens e a pouca identificação que eles geram com o público torna tudo desinteressante - pouco importa, na verdade, com quem Marta vai ficar.

"Meu Namorado Astronauta", série polonesa da Netflix. Crédito: Michal Klusek/Divulgação
"Meu Namorado Astronauta", série polonesa da Netflix. Crédito: Michal Klusek/Divulgação

Inicialmente, o arco do futuro parece ser mais profundo, mas essa expectativa logo é abandonada. O texto demora mais que o necessário para “acordar” Niko após ele retornar à Terra, dando a impressão de se arrastar durante a maior parte da série - a ideia da série, afinal, é um astronauta que volta 30 anos depois, sem envelhecer um dia, se reencontrar com seu grande amor, uma mulher agora envelhecida. Há também boas ideias no futuro da série, alguns conceitos que poderiam ser explorados, mas que se tornam detalhes de um competente design de produção, com uma criação de mundo razoável.

“Meu Namorado Astronauta” abandona as boas ideias e se repete durante a maior parte de seus seis episódios ao mostrar Niko e Bogdan em uma “competição” de quem é mais “macho”, ambos querendo se exibir para Marta, que em momento algum se mostra muito em dúvida. A questão é que resta pouca dúvida do que vai acontecer, pois já sabemos que Bogdan e Marta estão juntos no futuro e em uma relação que não funciona, ou seja, fica claro que ela vê em NIko seu grande amor perdido.

"Meu Namorado Astronauta", série polonesa da Netflix. Crédito: Michal Klusek/Divulgação
"Meu Namorado Astronauta", série polonesa da Netflix. Crédito: Michal Klusek/Divulgação

Ao partir para seu lado ficção científica, “Meu Namorado Astronauta” se mostra pouco interessante. O roteiro revela a virada principal muito antes de seu clímax, deixando para o fim da série algumas informações apenas irrelevantes. O texto também guarda para seus minutos finais uma guinada para o thriller e o cinema de ação, mas é tudo tão apressado que não sobra muito tempo para a fuga de Niko e seu reencontro com Marta e Bogdan, um arco com potencial para emocionar o espectador e finalmente despertar alguma identificação, mas é tudo praticamente imediato e sem peso algum.

Ao fim, “Meu Namorado Astronauta” é esteticamente atrativa, tem boas ideias e algumas boas cenas mais picantes filmadas com competência e sem cortes rápidos para evitar mostrar demais. A série, porém, pouco aproveita o que tem de bom, dando a impressão de ter sido pensada como um filme de duas horas que precisou ser esticado para uma narrativa com mais que o dobro desse tempo de duração. O resultado é uma série que nunca sabe o que fazer com suas ideias e acaba falhando feio em quase tudo o que tenta fazer.

"Meu Namorado Astronauta", série polonesa da Netflix. Crédito: Michal Klusek/Divulgação
"Meu Namorado Astronauta", série polonesa da Netflix. Crédito: Michal Klusek/Divulgação

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