Algumas vezes durante os seis episódios da primeira temporada de “Nada é o que parece ser”, a protagonista, Emma (Malaika Mosendane) é questionada acerca de quem ela é - em uma delas, a jovem responde: “É o que estou tentando descobrir”. Não é difícil entender que a busca por uma identidade e uma sensação de pertencimento é o foco narrativo da série dinamarquesa lançada pela Netflix, mas há mais.
“Nada é o que parece ser” é criada por Jannik Tai Mosholt, Kaspar Munk e Christian Potalivo, trio responsável pela série “The Rain”, disponível na Netflix. A série se passa em uma cidadezinha no interior da Dinamarca, local onde há 17 anos caiu um meteoro e tornou a cidade conhecida. É lá que conhecemos Emma, trabalhando justamente no museu do meteoro; após um pequeno acidente, ela percebe que tem algo estranho com toda aquela história. Ela se junta então a um grupo de jovens que investigam o meteoro e tudo o que sucedeu a sua queda.
É interessante a maneira como as séries adolescentes nórdicas se apresentam, com os textos apresentado aos personagens problemas que poderiam ser de adultos, mas nos quais acabam envolvidos enquanto ainda passam longe da maturidade. Não há tramas escolares ou problemas com os valentões, ao invés disso, o cenário e a constrção narrativa de “Nada é o que parece ser” lembram mais o clássico “Arquivo X” do que dramas teen americanos.
O roteiro determina o ritmo da série da forma eficaz, apresentando conceitos aos poucos e colocando os jovens em meio a uma história já em andamento. Assim, os pilares já existem e somos apresentados a eles à medida das descobertas de Emma e sua turma. É até curioso como, ao final do primeiro episódio, tudo parece ter ficado claro, mas o trunfo de “Nada é que o parece ser” é justamente buscar a fuga do previsível, o que nem sempre consegue.
O elenco adolescente se sai muito bem, conferindo um mix de empolgação juvenil e seriedade aos personagens e às suas relações. Com apenas seis episódios, no entanto, o texto opta por desenvolver apenas Emma, deixando de lado todas as pessoas que a acompanham na aventura. Seria mais atrativo aprendermos mais sobre Marie (Andrea Heick Gadebjerg, de “Loucos por Justiça”) ou Fred (Andreas Dittmer), os interesses românticos de Emma, assim como conferir alguma profundidade a Mads (Albert Rudbeck Lindhardt, de “Druk - Mais uma Rodada”) além de sua cadeira de rodas.
A curta duração da temporada também afeta a fluidez narrativa. Os dois primeiros episódios são ótimos, mas a qualidade cai no meio da temporada antes de se encontrar para o arco final. Esses seis episódios mais parecem uma primeira metade de temporada como estamos acostumados a ver, inclusive com um bom gancho, mas que jamais deveria ser usado sem uma segunda temporada confirmada.
Os elementos de ficção científica espelham a jornada de descobertas de Emma, uma mulher em busca de pertencimento e autoconhecimento. A questão inicial deste texto e a resposta da jovem fazem sentido para a ficção científica e para o drama adolescente. Emma não sabe quem é, o que busca, experimenta com sua sexualidade e quer sair daquele lugar.
A série aproveita bem o cenário de isolamento da cidade para falar de solidão. Não há nada além de Middelbo e o vazio que a cerca - o clima de cidade portuária que já viu dias melhores aumenta o clima de mistério com o que acontece ali. Toda ambientação funciona para reforçar o não-pertencimento de Emma.
Entre idas e vindas narrativas, “Nada é o que parece ser” é uma experiência leve e mostra o potencial da produção audiovisual dinamarquesa. O clima de cidade pequena combina com o mistério da ficção científica, o que também acontece na conterrânea “Post Mortem”, mas o que mais chama a atenção é o cenário adulto para uma trama adolescente. A tem problemas narrativos, mas eles são compensados por boas atuações e pela dualidade da construção do mistério central.
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