Em algum momento no início da década de 2000, Hollywood descobriu o terror japonês. Sucesso no oriente no final da década de 1990, “Ringu” (1998) virou “O Chamado” (2002) e deu início a uma febre mundo afora. Mesmo sendo um produto de Hollywood, o filme de Gore Verbinski era diferente do que se fazia no ocidente e respeitava bastante o material original. Com uma pegada mais de suspense do que de terror durante a maior parte do tempo, o filme não era explicitamente violento - ao invés disso, criava tensão com trabalho de ambientação e trilha sonora. Foi um sucesso.
Não demorou para que os remakes dos filmes de terror japonês invadissem a indústria. “O Chamado” ganhou uma continuação três anos depois e “O Grito” (2004), impulsionado pela popularidade de Sarah Michelle Gellar, foi sucesso de bilheteria e se tornou uma franquia. Até Walter Salles, à época em alta após “Central do Brasil” (1998), “Abril Despedaçado” (2001) e “Diários de Motocicleta” (2004), dirigiu o hollywoodiano “Águas Negras” (2005), talvez a mais original das adaptações de terror japonês, mas um fracasso de bilheteria.
A moda passou, o terror americano se reinventou primeiro com a franquia “Jogos Mortais’, mais centrada nos medos urbanos, e com “Sobrenatural” (2010), de James Wan, que estabeleceu de vez o novo estilo com o universo de “Invocação do Mal” (2013). A fórmula de Wan, no entanto, começa a dar sinais de esgotamento, mesmo que ainda vá bem nas bilheterias; quantos “Annabelle” ou “A Freira” o público é capaz de consumir? O lado positivo é que a fórmula prevê filmes baratos - “A Maldição da Chorona”, lançado ano passado, teve críticas péssimas, mas teve lucro 10 vezes superior a seu custo de produção (US$ 9 milhões).
Em uma tentativa de reviver o terror oriental nos EUA, “O Chamado 3” foi lançado em 2017. Dirigido pelo espanhol F. Javier Gutiérrez, o filme é um horror (com o perdão do trocadilho) - foi detonado pelas críticas por reciclar fórmulas do clássico e até por humanizar a eterna e ameaçadora Samara. Apesar de tudo isso e da péssima bilheteria nos EUA, o filme foi bem em mercados de grande apelo como Brasil e China. Então é meio culpa do público brasileiro, um dos maiores mercados para o cinema de terror do mundo, que o remake de “O Grito” (um remake do remake?) esteja em cartaz por aqui.
Por quê?
O filme de Nicolas Pesce cria uma atmosfera surpreendente, com muito contraste de preto e branco, e uma fotografia granulada para acompanhar três histórias paralelas sobre a já conhecida maldição. Em uma delas, a detetive Muldoon (Andrea Riseborough) chega à cidade com o filho para reconstruir a vida após a morte do marido. Ao lado do detetive Goodman (Damián Bichir), ela investiga um misterioso corpo apodrecido. Essa investigação é a espinha do filme, mas ele também conta com outras tramas, em linhas temporais distintas, que mostram a maldição por diferentes pontos de vista.
O público que vai ao cinema conferir o novo “O Grito” talvez saiba o que esperar: sustos no banho, na pia, no espelho, no canto da tela, motivados por sons… tudo como manda o manual do terror japonês. Uma diferença interessante desta versão do filme é sua classificação etária “R”, que nos EUA significa que ele é proibido para menores de 17 anos. Assim, Pesce pode trabalhar com uma estética crua e violenta.
Com pouco tempo de tela (94 minutos), o filme é raso e não se aproveita da boa atmosfera criada. Ao invés disso, se resume a sustos simples e a fórmulas que não surpreendem mais. “O Grito” é um terror cheio de estilo, mas preguiçoso - e talvez Nicolas Pesce seja o menos culpado de tudo isso. O diretor até imprime sua assinatura ao filme, mas, amarrado pelo estúdio e por produtores, acaba entregando um filme seguro.
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