Após uma breve sequência, quando a introdução de “O Diabo em Ohio” ganha a tela, fica claro o objetivo da série da Netflix de se aproximar de uma narrativa ao estilo “True Detective”, com um clima sempre perigoso no ar criado pela ambientação cheia de detalhes macabros e personagens estranhos. Ao longo de seus oito episódios, a minissérie se esforça para sustentar essa semelhança, mas fracassa monumentalmente.
Esse fracasso, no entanto, não é o que faz de “O Diabo em Ohio” uma série ruim, mas apenas um produto diferente daquele que ela finge ser. Baseada no livro de Daria Polatin, roteirista de séries como “Heels”, “Jack Ryan” e “Castle Rock”, a nova série da Netflix de cara se apresenta como uma história de traumas e cicatrizes. Emily Deschanel (“Bones”) vive Suzanne, uma psiquiatra que, por força da ocasião, leva para casa sua nova paciente, Mae (Madeleine Arthur).
A jovem sofreu um grande trauma e vem de um condado sobre o qual contam diversas lendas urbanas e histórias macabras das quais Mae parece ter sido parte. Tanto Suzanne quanto Mae carregam no corpo marcas que geram essa identificação imediata entre ambas - além do vínculo profissional, existe uma compreensão, a criação de uma bolha de segurança entre elas.
A série se desenvolve com Suzanne investigando as origens de Mae, a mesma função executada pelo recém-chegado detetive Lopez (Gerardo Celasco), o que gera mais repetição do que complemento. Nessa busca, a narrativa até se sustenta com certa desenvoltura, mesmo que as viradas e a construção do perigo sejam artificiais e sustentadas por muletas. O texto apresenta gradualmente o passado das protagonistas e a conexão entre elas; também introduz cultos sinistros, referências satanistas - uma prece satânica de Mae à mesa é risível e constrangedora.
“O Diabo em Ohio”, porém, segue outros caminhos em arcos como a relação de Mae com as filhas de Suzanne, ou o estranhamento como a primeira vez da jovem na escola. A relação da jovem com Jules (Xaria Dotson), filha do meio de Suzanne, ocupa bastante espaço na trama. Na necessidade de se encaixar, Mae busca o lugar social de Jules em uma dinâmica interessante à medida que ela busca se encaixar de vez no núcleo familiar comandado por Suzanne. Helen (Alisha Newton), filha mais velha, também tem um arco próprio
O excesso de melodrama familiar incomoda (o arco do marido é dispensável) e nos faz torcer por flashbacks mais sinistros que mergulham no culto. A série também abusa do didatismo e se esquece completamente da máxima “mostre, não fale” - o roteiro é cheio de momentos em que mostra, fala, mostra de novo e fala mais uma vez para deixar bem explicadinho e acabar com qualquer subjetividade do espectador.
“O Diabo em Ohio” poderia tranquilamente ser enxugada em um filme sem afetar a trama. Há personagens demais, tramas demais e ainda assim uma grande enrolação; a série alcança seu ponto de virada no quinto episódio, mas enrola durante os dois seguintes para chegar ao clímax no oitavo e último.
Ao fim, a minissérie é um produto genérico, com atuações e produções medianas que buscam apenas capitalizar com relações a produtos muito superiores - há referências ao terror folclórico de “Midsommar”, à estética de “Missa da Meia-Noite”, ao clima de “True Detective”... A série não chega a ser ruim ou a subestimar a inteligência do público como “Echoes”, mas não há nada nela que justifique resistir oito episódios quando há obras muito melhores disponíveis em qualquer plataforma.
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