Inicialmente programado pra ser lançado em 13 de abril de 2018, “Os Novos Mutantes” talvez tenha se tornado o filme mais malfadado de uma geração inteira. Os adiamentos constantes do filme de Josh Boone fizeram com que ele se tornasse cultuado pelos motivos errados - o longa baseado nos quadrinhos da Marvel se tornaram motivo de piada e o receio de um novo “Quarteto Fantástico” (o do Josh Trank em 2015) era inevitável mesmo que Boone negasse com frequência que o filme havia passado por refilmagens e uma nova roteirização para tentar salvá-lo.
Veio a pandemia e, com ela, o motivo perfeito para “Os Novos Mutantes” ser despejado no Disney+ a fim de alavancar assinaturas ou algo tipo, mas, para a surpresa de muitos, inclusive a minha, a Disney insistiu no lançamento nos cinemas. O filme chegou no final de agosto às poucas salas reabertas nos EUA e na Europa e, agora, com a reabertura das salas do Brasil, é o primeiro “grande” (atenção às aspas) lançamento durante o período de pandemia (não vou usar pós-pandemia…).
A notícia boa é que o “Os Novos Mutantes” passa longe de ser tão ruim quanto o já citado “Quarteto Fantástico”. Na verdade, o filme de Josh Boone é tão razoável que chega a surpreender ter sido deixado na geladeira por tanto tempo - o limbo é resultado do fato de ser um filme de mutantes produzido pela Fox após a aquisição dos direitos dos heróis pela Disney.
O roteiro é bem simples: Mancha Solar (Henry Zaga), Magia (Anya Taylor-Joy), Lupina (Maise Williams) e Míssil (Charlie Heaton) são jovens mutantes confinados a um centro de pesquisa para os estudos da Dra. Cecilia Reyes (Alice Braga), mas tudo muda com a chegada de uma nova paciente, Danielle Moonstar (Blu Hunt), também conhecida como Miragem. Os jovens começam a presenciar acontecimentos estranhos, com cada um deles tendo que lidar com seus anseios e medos mais íntimos. Obviamente, eles terão que trabalhar juntos para entender a ameaça que os cerca e eliminá-la, afinal, estamos assistindo ao surgimento de uma nova equipe. A estrutura narrativa é bem similar à de “It - A Coisa” (2017), com cada um dos jovens mutantes tendo um arco próprio antes de terem que se unir.
“Os Novos Mutantes” provavelmente funcionaria bem como uma série, com cada personagem ganhando seu próprio episódio antes de enfrentarem a ameaça final. O início do filme é didático e expositivo em excesso, mas o segundo ato ganha estranheza e profundidade com a apresentação mais completa dos poderes de cada um deles. É também este o momento em que os jovens atores ganham destaque e se tornam o pilar de sustentação do filme.
O elenco é carismático o suficiente para que nos importemos com aqueles personagens. É Blu Hunt quem comanda a turma, mas Maise Williams (a Arya da “Game of Thrones”) também se sai bem. Os mutantes de “Os Novos Mutantes” ainda aprendem a lidar com seus poderes, que não lhes trazem orgulho ou felicidade, pelo contrário, os jovens vivem as angústias da adolescência ou do início da vida adulta com fragilidade e insegurança - os poderes e as situações não são tão sutis nas metáforas.
Apesar de um bom elenco e de um texto correto, “Os Novos Mutantes” ainda não passa a sensação de cinema; como dito antes, poderia muito bem ser uma série de heróis da Netflix - com certeza faria sucesso em um público menos exigente. O roteiro, que apresenta um segundo ato interessante, se enrola um pouco no final, deixando de lado algumas possibilidades que antes pareciam incríveis, como o Mancha Solar, por exemplo.
O problema de “Os Novos Mutantes” é que eles está bem longe de ser o filme de terror prometido, apesar de ser praticamente construído como uma adaptação de Stephen King, e também não engrena como filme de super-heróis. Intencionalmente ou não, o filme acaba funcionando bem como uma jornada de descobertas à la John Hughes - há referências diretas ao clássico “Clube dos Cinco” (1985).
O filme de Josh Boone não é ruim, mas é muito datado. Ele se encaixaria bem entre os dois primeiros “X-Men” (2000 e 2003), há quase duas décadas, e abriria possibilidades para a tão almejada criação de um universo compartilhado dos mutantes, mas agora é uma franquia que já nasce morta e chega aos cinemas para minimizar os prejuízos.
Ao fim, “Os Novos Mutantes” não é um filme que merecia o percalço por que passou, mas tampouco vai encher as salas e os bolsos dos executivos. O filme é superior aos últimos dois “X-Men” e aos dois primeiros “Wolverine”, com boas referências, boas atuações e um roteiro razoável. Ele traz uma boa dose de estranheza e frescor ao gênero, mas seu potencial nunca é totalmente desenvolvido - e nunca será.
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