No primeiro episódio de “Ozark”, lançado em 2017 pela Netflix, alguns personagens de destaque inicial na trama, alguns atores de rostos até conhecidos, como Josh Randall, por exemplo, morrem. Esse impacto inicial serve para avisar a audiência que ninguém ali está seguro e, obviamente, para colocar a família Byrde em movimento tendo plena ciência do que pode acontecer quando se tenta enganar um cartel mexicano.
Desde então, em suas três temporadas, a série da Netflix permaneceu em uma crescente constante, com planos ambiciosos sendo colocados em prática pelos Byrde, mas sempre funcionando apenas como um alívio temporário para o grande conflito - para complicar, os filhos de Marty (Jason Bateman) e Wendy (Laura Linney), Charlotte (Sofia Hublitz) e Jonah (Skylar Gaertner), se envolveram nos negócios da família, tornando todo problema ainda mais complicado.
“Ozark” nunca foi um sucesso absoluto na plataforma, mas teve bons números. Além disso, foi aclamada pela crítica e indicada a alguns prêmios. A série se beneficiou desse crédito com uma narrativa enxuta, sem tramas vazias, algo que poderia ser encerrado sem grandes problemas se a Netflix resolvesse não estender a série por muito tempo. Bastaria, por exemplo, uma resolução diferente na terceira temporada e o final seria satisfatório.
Felizmente, a Netflix decidiu conceder ao showrunner Chris Mundy uma “supertemporada” para encerrar tudo. Dividida em duas partes de sete episódios, a quarta temporada de “Ozark” chega nesta sexta (21) à plataforma. Ainda não há uma data confirmada para o lançamento dos episódios finais, mas não deve demorar - a estratégia deve ser similar à de “La Casa de Papel”, que teve três meses entre as partes finais da última temporada da série.
QUARTA TEMPORADA: PARTE 1
“Ozark” retorna de onde parou, com Marty e Wendy retornando de uma visita a Omar Navarro (Felix Solis), no México, e com várias complicações. Os Byrde têm que lidar com Darlene (Lisa Emery), Mel (Adam Rothernberg), um detetive particular investigando o sumiço de Helen (Janet McTeer), Javi (Alfonso Herrera), um violento e impulsivo sobrinho de Omar, e, para completar, com Jonah, que resolve trabalhar para Ruth (Julia Garner).
Sem revelar spoiler algum, é possível dizer que a quarta temporada é o que os americanos chamam de “slow burn”, uma narrativa com pavio mais longo e, por isso, com menos impacto imediato. Ao longo dos sete episódios, “Ozark” constrói a tensão para os dois últimos dessa primeira leva. Os Byrde vão buscando uma forma de legalizar suas atividades, mas as tramas vão se misturando, com novos jogadores entrando em cena e algumas possibilidades de conclusão sendo ensaiadas.
É interessante como a temporada se constrói espelhando personagens. Jonah quer ser o pai, que até sente orgulho das operações do filho; já Charlotte começa a entender melhor a mãe, que, por sua vez, tem comportamentos assustadoramente similares aos de Darlene. Em meio a tudo isso, é Ruth quem mais uma vez mostra ser a força motriz da série.
Em meio a tantos personagens complexos, a de Julia Garner é de longe a mais rica. Ao contrário dos Byrde, ela não teve outra escolha na vida. Quando a conhecemos, ela era funcionária de um hotel aplicando golpes em hóspedes, cria de uma família de bandidos conhecidos na região. A parceria com Marty deu a ela a possibilidade de vislumbrar de seu sonho americano - “estamos nos EUA. Ninguém se importa de onde vem o dinheiro”, brada uma personagem em determinado momento. Ruth entende isso e, talvez até como uma espécie de gratidão, ainda tem um vínculo forte com Marty.
A quarta temporada de “Ozark” faz boa escolha ao ampliar seu escopo, com mais participação do FBI (e por consequência do governo americano) e também colocando em pauta a sempre questionada indústria farmacêutica; o consumo de remédios à base de ópio é uma epidemia nos EUA. A narrativa é tensa o tempo todo, principalmente pela presença de Javi, já apresentado como imprevisível, e pela subtrama do detetive, que em um primeiro momento parece até deslocada, mas provavelmente se encaixará ao final de tudo.
“Ozark” bebe bem na fonte de “The Sopranos” e foi muito comparada a “Breaking Bad” quando de seu lançamento. Apesar disso, a série da Netflix tem uma assinatura própria; os Byrde sempre estiveram no meio de tudo e, por isso, conseguem ser tanto as pessoas comuns envolvidas em situações extraordinárias quanto quem dá as cartas.
A narrativa enxuta possibilita com os conflitos sejam bem desenvolvidos ao longo das temporadas. Assim, chegando à quarta, eles estão todos bem definidos e o texto não precisa nos reintroduzir a eles. As dinâmicas entre os personagens já estão ali e dão sequência ao que vimos antes, sem a fórmula do “vilão da temporada”, por exemplo, mesmo que novos personagens sejam introduzidos.
A primeira parte da quarta temporada de “Ozark” é justamente o que se espera da série, uma trama tensa, bem trabalhada, com ótimos personagens e um final explosivo condizente com uma das melhores, quiçá a melhor, série original da Netflix.
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