Em uma época em que cada vez menos gente vai aos cinemas para assistir a filmes originais, os estúdios ficam ansiosos para (re)aproveitar suas marcas que um dia já foram sucesso. Não é coincidência que “Matrix”, por exemplo, tenha retornado contra a vontade inicial de suas criadoras, as irmãs Wachowski, após os sucessos de bilheteria dos retornos de “Jurassic Park”, “Star Wars” e do interminável e extremamente lucrativo Universo Cinematográfico Marvel. Neste cenário, é impraticável manter uma marca como “Pânico”, ainda reverenciada, parada por muito tempo.
É curioso como “Pânico” já havia ensaiado um retorno no razoável quarto filme, lançado em 2011, e na série de TV que não tinha conexões com os filmes, mas prestava homenagem a eles. Agora, 11 anos depois do último filme, a franquia está de volta aos cinemas devidamente intitulada “Pânico”. É o primeiro filme da franquia após a morte de seu criador e diretor de todos os filmes anteriores, Wes Craven, em 2015.
Como tem acontecido com todas as marcas que voltam em continuações, “Pânico” é uma mistura de continuação e remake. Os alardeados retornos de Sidney (Neve Campbell), Dewey (David Arquette) e Gale (Courteney Cox) funcionam bem e eles funcionam como uma espécie de mentores para a nova geração diante de um novo (ou de novos) assassino(s) mascarado(s).
Mesmo que o retorno dos personagens clássicos seja o grande atrativo, não são eles que conduzem a trama. O texto de James Vanderbilt (“Zodíaco”) e Guy Busick (“Castle Rock”) é ótimo ao misturar as gerações e ao introduzir os novos protagonistas. As irmãs Sam e Tara Carpenter, interpretadas por Melissa Barrera e Jenna Ortega são ótimas, assim como a intensa Mindy (Jasmin Savoy Brown, de “Yellowjackets”) e Richie (Jack Quaid, de "The Boys"), mas todos os novos personagens têm bons momentos.
O novo “Pânico” tem abertura similar aos outros quatro filmes e espelha o ataque do filme de 1996 em sua cena de abertura. É ótima a maneira como o texto atualiza o material original - quem, afinal, ainda atende telefones? - e também o cinema de terror, que abandonou um pouco o slasher dos anos 1980 para investir em obras mais complexas como “Hereditário” e “A Bruxa”.
A sequência inicial funciona para reambientar o espectador naquele universo e para reverenciá-lo, mas o filme é levado a novas direções na sequência. A trama retorna para Woodboro, uma cidade acostumada aos ataques de assassinos mascarados, para que que Sam e Richie busquem ajuda de quem já lidou com essa situação antes, Dewey. Aos poucos, a nova trama se desenrola e os personagens clássicos são reintroduzidos.
É divertido ver Dewey, Sidney e Gale de volta e o trio tem ótimas cenas, mas os diretores Matt Bettinelli-Olpin e Tyler Gillett acertam ao transformá-los em coadjuvantes. Os acontecimentos dos filmes anteriores mudaram as vidas deles e seus comportamentos talvez surpreendam quem espera encontrar os mesmos personagens de antes.
“Pânico” é cheio de metalinguagem, o que também parece funcionar para essas sequências. No universo do filme, existe uma série de filmes que conta os eventos anteriores em Woodboro como sendo baseado em fatos. Ainda, em determinado momento, uma personagem “entende” o que está acontecendo: estão recriando a mesma história, com novos personagens, e homenageando os que passaram por lá. O roteiro, talvez até como uma proteção prévia, aproveita para brincar com toda a bases de fãs e com argumentos como “arruinaram minha infância”.
Uma das características do novo filme é seu ritmo sempre acelerado, oferecendo ao espectador pouco tempo de respiro. Apesar de um tom frequente de humor, “Pânico”, os assassinatos talvez sejam os mais violentos desde o primeiro filme e os sustos são frequentes. O filme é brutal e entende a necessidade da violência como parte da construção de sua “nova” identidade. Assim, as mortes são explícitas, esteticamente ricas e com muito sangue. O filme nos faz torcer pelos personagens e, por isso, lamentamos quando alguns deles obviamente acabam assassinados.
“Pânico” é um divertido e violento recomeço para uma franquia desgastada não só pelos próprios filmes, mas também pelo excesso de cópias que a fórmula gerou. É interessante como a narrativa consegue equilibrar humor e tensão, brincando com as expectativas do público de maneira inteligente.
O filme dificilmente terá o mesmo impacto na cultura pop do original, mas ele nem mesmo busca isso. O novo “Pânico” é claro em sua intenção de divertir o público, homenagear os filmes originais e, principalmente, criar uma nova história da qual o estúdio possa tirar proveito nas bilheterias sem a necessidade de trazer antigos personagens de volta.
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