Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

"Por Trás da Inocência": suspense da Netflix é constrangedor

"Por Trás da Inocência", suspense erótico disponibilizado pela Netflix, tem atuações ruins, roteiro medonho e viradas sem sentido

Vitória
Publicado em 22/03/2021 às 20h57
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Filme "Por Trás da Inocência", da Netflix. Crédito: Netflix/Divulgação

Pensa num filme ruim. Pensou? Agora pense em outro, ainda pior. Foi? É bem provável que nenhum desses dois filmes chegue ao nível “Por Trás da Inocência” de ruindade. Lançado pela Netflix na última semana e desde então na lista de mais vistos da plataforma, o filme de Anna Elizabeth James é puro suco de constrangimento.

O roteiro, também de autoria da diretora, é centrado em Mary Morrison (Kristin Davis), uma autora de sucesso que há anos não publica um novo livro. Quando a conhecemos, em uma reunião com representantes de sua editora, ela recusa a proposta de um novo livro de sua franquia de suspense. Nesse momento, com pouco mais de seis minutos de filme, um diálogo mal escrito já dá o tom do filme. Nele, uma personagem cobra de Mary uma espécie de gratidão; na cabeça dela, a escritora seria obrigada a escrever para “ajudar” a editora. Mas Mary prefere se manter longe dos livros, pois “se torna uma pessoa diferente quando está escrevendo”.

Pouco depois conhecemos a família da protagonista e Tom (Dermot Mulroney) se empolga com a proposta recebida pela esposa - o problema é que ele usou as reservas da família em um negócio arriscado e perdeu tudo. Mary, então, se vê obrigada a voltar a escrever para manter o orçamento da casa. Para isso, ela terá que contratar alguém para ajudá-la a cuidar das crianças. Após algumas entrevistas mal-sucedidas, surge, quase como uma Mary Poppins, a jovem Grace (Greer Grammer).

Grace é fetichizada desde sua entrada em cena. Com um ar colegial, ingênua, de saia curta e chegando de bicicleta à casa de Mary, ela exala inocência. O texto de “Por Trás da Inocência” parece criado como um daqueles romances eróticos vendidos em banca. A chegada de Grace muda tudo para Mary, que nunca havia sentido atração por uma mulher antes.

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Filme "Por Trás da Inocência", da Netflix. Crédito: Netflix/Divulgação

O problema é que a diretora não entende ao certo como criar essa tensão sexual entre as duas, o pilar de sustentação do roteiro, então enche o filme de cenas constrangedoras como, por exemplo, uma visita à longa de lingeries, onde a jovem parece precisar da ajuda da patroa para entender como se usa um sutiã - isso, vale ressaltar, no segundo dia de trabalho.

“Por Trás da Inocência”, no entanto, ao contrário dos romances de banca de revista, é uma obra que se leva a sério. Conduzido como uma espécie de thriller erótico que habitaria bem uma “Sexta Sexy” ou um “Cine Privê” nos anos 1990, na Band, o filme ironicamente é pouco sexy.

Anna Elizabeth James também parece ter algum fetiche em ser alimentada, pois filma Grace dando comida na boca de Mary, exatamente como para uma criança, em mais de um momento, todos eles constrangedores, com a intenção de criar um clima sensual. O constrangimento é reforçado pela gritante falta de química entre Greer Grammer e Kristin Davis.

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Filme "Por Trás da Inocência", da Netflix. Crédito: Netflix/Divulgação

O filme tampouco funciona como suspense. Como desde o início o texto deixa claro que autora “se transforma” quando está escrevendo, o roteiro tenta brincar com o que é real e o que é imaginação, mas o faz muito mal. Toda a profundidade da personagem está no fato de ela beber uísque e fumar charutos, o que, na cabeça da diretora, faz de Mary o “homem da casa”, quase autorizando a protagonista a ter a relação extra conjugal. Além disso, se o novo livro de Mary for escrito com base no que ela imagina, seus leitores teriam em mãos um livro muito ruim e pouco imaginativo.

O roteiro aposta em viradas e surpresas que não fazem sentido algum. Personagens têm mudanças de comportamento bruscas, conversas expositivas são ouvidas “do nada” para colocarem o texto em movimento. O terceiro ato do filme é construído somente com reviravoltas encadeadas que levam ao suposto clímax, que faz com que a audiência ria em descrença diante do que vê em tela.

“Por Trás da Inocência” não é somente um filme ruim, é um filme muito ruim, dos piores do catálogo da Netflix. Com atuações fracas, zero química entre os atores e um roteiro ridículo, o suposto thriller erótico não funciona nem como thriller e tampouco como erótico. O resultado é um filme constrangedor do início ao fim e cheio de ideias equivocadas.

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