Recém-lançada pela Netflix, a série espanhola “Prisioneiro da Madrugada” daria um filme totalmente razoável, daqueles que encerrariam um sábado na televisão de forma satisfatória com uma trama misturando ação, drama, reviravoltas e alguma tensão. Como série, no entanto, o lançamento da Netflix é frustrante.
A série tem início com o choque ao acompanharmos um Simón Lago (Luis Callejo) enterrar uma mulher ainda viva. Logo entendemos se tratar de um perigoso serial killer, o maior da história da Espanha, e o vemos ser preso pelas autoridades. No caminho para a prisão os policiais recebem uma ordem: Simon deve ser levado à penitenciária Baruca, responsável pelos presos em tratamento psiquiátrico. Por isso, Hugo (Alberto Ammann, de “Narcos”), diretor da instituição, é chamado às pressas, na véspera de Natal, para o trabalho.
O título original da série, “La Noche Más Larga” (“A Noite Mais Longa”) faz mais jus à maneira como ela se desenvolve em seus seis episódios dessa primeira temporada. Logo entendemos haver um plano em movimento, um esquema que vai transformar aquela véspera de Natal em algo inesquecível, pois um grupo fortemente armado corta a energia e todas as comunicações da penitenciária para colocar em prática um plano para resgatar Simon. Agora, carcereiros e detentos terão que trabalhar juntos para impedir que o grupo invada o local e mate todo mundo no processo de resgate do serial killer.
Sem entrar em spoilers, é possível dizer que “Prisioneiro da Madrugada” faz bom uso dos clichês, mas também é totalmente refém deles para criar os conflitos iniciais. Alguns arcos, com o dos filhos de Hugo, são um excesso para a série que já tem na outra filha dele, fora da prisão, seu grande drama. Há também um excesso de personagens secundários que até poderiam render boas histórias, mas que são tratados com descaso pelo texto - a única que ganha certo desenvolvimento, a interna vivida por Cecília Freira, é responsável pelo melhor conflito paralelo da temporada, mas que também é resolvido sucintamente.
“Prisioneiro da Madrugada” passa muito tempo tentando construir o clímax, mas se torna desinteressante e repetitiva no processo. Os episódios de meio da temporada são sempre uma tentativa de quem tá dentro de ir de ponto A ou ponto B, ou uma nova estratégia dos invasores para quebrar o bloqueio. Ao solucionar algumas questões muito rapidamente, a tensão da série é momentânea e o drama se esvai com facilidade.
É só no quinto episódio que a trama encontra um ritmo interessante, pouco antes de se encerrar ao final do sexto. “Prisioneiro da Madrugada” frustra o espectador ao encontrar seu foco perto do fim da temporada - inicialmente vendida como uma minissérie, a história será ainda mais desastrosa se não houver uma segunda temporada para sua conclusão.
O texto faz escolhas questionáveis ao preterir dilemas éticos clássicos, como quantas vidas precisam ser perdidas para que se salve uma, por exemplo, em relação a arcos mais novelescos e puxados para o melodrama - talvez uma tentativa em remeter a “La Casa de Papel”, fenômeno espanhol em que a nova série da Netflix claramente busca inspiração em alguns arcos.
O roteiro abusa de algumas caricaturas para justificar algumas escolhas supostamente difíceis dos personagens. Assim, a série traz um festival de decisões e escolhas atropeladas e injustificadas apenas para que o destino daquele personagem não tenha um peso tão grande. Ironicamente, nos únicos momentos em que o texto poderia ousar e partir para escolhas mais duras, ele não o faz, o que mostra a óbvia intenção de “Prisioneiro da Madrugada” ser um produto de alcance comercial mais amplo, mas falta algo.
A nova série espanhola da Netflix não é um produto pop já devidamente embalado como “La Casa de Papel” ou tampouco tem o festival de reviravoltas de “O Inocente”, ambas séries espanholas da mesma plataforma e com semelhanças entre si. Ao invés disso, temos uma série que até tem boas ideias, mas as dilui em arcos desnecessários e desinteressantes que desembocam em uma conclusão que passa longe de recompensar o espectador. Poderia ser um bom filme, mas é uma série medíocre.
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