Quem é Erin Carter? A minissérie britânica da Netflix, devidamente intitulada “Quem é Erin Carter?”, faz essa pergunta o tempo todo, como se o espectador precisasse ser lembrado, de 20 em 20 minutos, o nome da série a que está assistindo. Mas, de fato, quem é Erin Carter?
A série tem início com um breve prólogo em que vemos Erin (Evin Ahmad, da boa “Dinheiro Fácil”) e sua filha, Harper (Indica Watson), fugindo no meio da noite, de barco, com a promessa de que irão para um lugar ensolarado. Cinco anos depois, mãe e filha estão em Barcelona, onde Erin é professora de crianças e pré-adolescentes. Ensaiando pra uma peça, Harper agride um colega e acaba expulsa do musical.
A caminho de casa, elas param em um supermercado e Erin dá lições de moral do tipo “não resolvemos problemas com a violência”, mas também ensina a garota a dar um soco com a mão firme para não se machucar. As duas acabam no meio de um assalto e, com a filha em perigo, Erin briga com um dos assaltantes, que a reconhece antes de ser levado pela polícia e deixa novamente a questão no ar: “Quem é Erin Carter?”
A Erin que conhecemos é uma professora atenciosa e tem uma vida confortável, com uma bela casa, em uma ótima vizinhança, ao lado do amoroso Jordi (Sean Teale), mas fica claro que ela tem um passado, algo que o texto nunca tenta contestar. Assim, Erin, que tentava ser o mais discreta possível, se torna o assunto mais comentado da região após a briga com o assaltante e vê seu passado bater à porta.
“Quem é Erin Carter?” se vende como uma série de ação, quase como um derivado dos filmes de Liam Neeson, mas é um produto diferente. A minissérie tem pegada confortável para o público da Netflix, uma audiência que anda consumindo séries turcas e filmes poloneses em demasia, obras com narrativas pouco ousadas, que nunca desafiam o espectador. Assim, de olho nesse público acostumado ao convencional, às narrativas novelescas, a série produzida pelos responsáveis por “The Crown” até tem algumas boas ideias, mas tudo é sempre muito convencional, abusando dos clichês em busca de gerar conforto.
É irônico como a ideia é ter Erin como uma mulher “normal”, alguém que poderia ser sua vizinha, mas a personagem é tudo menos uma pessoa comum. No quarto episódio, talvez o melhor da série, conhecemos o passado da protagonista e o texto ganha mais ares de uma série de espionagem, com todos os clichês do gênero. Os arcos paralelos, como o de Harper, são deixados meio de lado pela série, o que é até um lamento, pois Watson é ótima atriz.
“Quem é Erin Carter?” abusa das convenções e das muletas que caracterizam os roteiros do gênero. Em muitos momentos, Erin quase é descoberta, mas dá um jeito de escapar e manter seu segredo. A série tropeça muito na relação da protagonista com o vizinho policial, um dos responsáveis por investigar o assalto ao supermercado; Emilio (Pep Ambròs) é uma das trapaças que a série usa para movimentar o roteiro na falta de boas ideias, aparecendo em momentos e locais improváveis.
Como obra de ação, a nova série da Netflix sofre com coreografias pobres e uma montagem que remete às séries dos anos 1980 e 90, e não às boas séries. A edição tem cortes rápidos e faz de tudo para esconder o rosto dos atores (e a utilização de dublês), resultando em cenas pouco interessantes e nunca criativas. Os diálogos seguem o mesmo caminho, com muita exposição e repetição que expõem os vícios e as fragilidades do texto de Jack Lothian, roteirista com currículo recheado de séries de qualidade duvidosa na TV aberta.
“Quem é Erin Carter?” é uma série de ação para quem não consome série de ação, um drama de espionagem para quem não consome espionagem – é como uma novela que resolve ser uma obra de gênero, mas sem poder renunciar a todas as convenções que garantem a ela um público cativo. Ao fim, a nova série da Netflix é descartável e esquecível, o que é uma pena, pois a protagonista é até uma personagem interessante. Apesar disso, a série tem tudo para funcionar com uma audiência que cresce na plataforma e, por isso, se torna seu grande foco.
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