Quando “Bridgerton” foi lançada pela Netflix, no final de 2020, não fui um grande entusiasta, mas, ainda assim, pontuei que “A Netflix tem em mãos uma série que tem tudo para se desenvolver em várias temporadas”. A segunda temporada veio e a série se manteve como um sucesso apesar dela não ser tão boa quanto a primeira, mas o melhor ainda estava por vir. “Rainha Charlotte”, lançada pela plataforma, não apenas traz o passado de uma das personagens mais legais de “Bridgerton” como também, arrisco dizer, se apresenta como a melhor história já contada no universo desenvolvido a partir dos livros de Julia Quinn.
Funcionando tanto quando um prelúdio quanto como um interlúdio entre temporadas de “Bridgerton”, “Rainha Charlotte” se divide em duas narrativas. A principal, no passado, traz a rainha jovem (vivida por India Amartefio) e as consequências de seu casamento arranjado com o Rei George (Corey Mylchreest) para a sociedade inglesa da época. Ao mesmo tempo, a série traz algumas pequenas passagens da linha do tempo principal de “Bridgerton”, uma conexão entre temporadas.
Alguns rostos conhecidos, como o de Violet Bridgerton, aparecem nas duas linhas temporais, que funcionam bem juntas - é ótimo como o roteiro amarra as decisões da jovem Charlotte e mostra como elas afetam a linha principal e ajudam a construí-la. Na linha “presente”, acompanhamos também a saúde mental do rei se deteriorando e a rainha Charlotte ganhando ainda mais responsabilidades.
“Rainha Charlotte” se esforça para construir a relação entre os dois de modo que tudo o que foi mostrado em “Bridgerton” até hoje faça sentido. A jovem Charlotte é uma mulher decidida que encontra seu par no jovem e problemático George quando ninguém esperava que isso pudesse acontecer na alta sociedade da época.
A série se beneficia de um universo já conhecido pelo público e de personagens interessantes. Os jovens Charlotte, George e Lady Danbury (Arsema Thomas) são ótimos e carismáticos, e o mesmo acontece com vários outros de menos destaque na trama. Mesmo com algumas tramas paralelas, “Rainha Charlotte” não repete o erro da segunda temporada de “Bridgerton”, que sofre com a falta de foco e até mesmo na identificação de uma trama principal, de algo que conduza a série. Na nova série, as tramas menores acabam se misturando à principal e tornando-a ainda maior.
É bem frustrante que os seis episódios de “Rainha Charlotte” nunca abordem a questão racial de “Bridgerton”, pois a série deixa claro que foi o casamento deles que deu fim a essa questão. No fantasioso mundo de Julia Quinn levado à Netflix, o racismo não é mais uma questão, mas já foi - o texto pouco explora o que nos levou àquele ponto histórico. Não abordar o tema é claramente uma escolha da série, mas é também uma oportunidade desperdiçada pelos produtores, que preferem repetir na nova série as temáticas da série “principal”, amor e sexo.
Enxuta e direta, “Rainha Charlotte” tem no ritmo seu aliado. A história do casamento arranjado que se torna um grande amor poderia cansar ou se tornar brega, mas é contada com a cadência certa. India Amarteifio é ótima como a rainha, uma jovem ingênua e adoravelmente rebelde. A construção do romance dela com George também funciona, pois Corey Mylchreest é igualmente adorável; a química entre os dois não é imediata, mas acaba aparecendo.
“Rainha Charlotte” leva o sexo de volta a “Bridgerton”, com cenas bem filmadas e sensuais, e prepara o terreno para a terceira temporada da série, esperada no fim do ano, mas não é só isso. É interessante que já saibamos que o final é trágico, que não há um possível final feliz para aqueles personagens, e, por isso, há um clima de dor e luto que permeia a série até em momentos mais leves. Assim, mesmo cientes do fim, somos capazes de desfrutar daquela história, de rir com aqueles personagens e de sentir as angústias de um relacionamento amoroso ao lado deles. Ao fim, é bom o questionamento acerca de quão trágico pode ser aquele relacionamento se os dois se amaram e estiveram juntos durante tanto tempo. O que importa, afinal, é o fim ou a jornada?
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