Crítico de cinema e colunista de cultura de A Gazeta

"Rede de Ódio", da Netflix, discute fake news em bom suspense

Lançamento polonês da Netflix, "Rede de Ódio" mostra como funciona a rede de criação e distribuição de notícias falsas além de discutir seus davastadores efeitos

Publicado em 04/08/2020 às 05h00
Atualizado em 04/08/2020 às 05h02
Filme
Filme "Rede de Ódio", da Netflix. Crédito: Netflix/divulgação

Em “Corpus Christi”, indicado ao Oscar de Melhor Filme Internacional em 2020, o diretor Jan Komasa mergulha na ambiguidade da fé de um ex-prisioneiro transformado pela religião. O filme oferece uma parábola religiosa, de transformação, perdão e amor ao próximo, mas também tem momentos perturbadores, muito em função da forte atuação de Bartosz Bielenia como o jovem, sofrido e explosivo protagonista.

Em seu novo filme, novamente parceria com o roteirista Mateusz Pacewicz, Komasa cria uma jornada inversa - “Rede de Ódio”, disponível na Netflix após curta carreira nos cinemas pré-pandemia, é a história do jovem Tomasz (Maciej Musialowski) e o desenvolvimento de sua personalidade em meio ao culto de egoísmo e maldade das redes sociais, um filme que involuntariamente até dialoga com "Suicide Room", obra escrita e dirigida por Jan Komasa lançada em 2011.

Na primeira cena, quando conhecemos o personagem, já somos apresentados a um sujeito carismático e manipulador, sempre com cada passo planejado para alcançar um objetivo e pouco se importando com as pessoas em seu caminho. Com esse perfil, Tomasz se encaixa perfeitamente em uma empresa de mídia digital responsável por construir e destruir reputações no mundo virtual. Os primeiros “cases” envolvem influenciadores, marcas concorrentes e polêmicas plantadas, mas logo Tomasz se vê parte de campanha de difamação contra um candidato progressista na capital polonesa que vive uma onda de ódio contra imigrantes. 

Em uma sociedade às voltas com notícias falsas, gabinetes especializados em campanhas de difamação e robôs influenciando campanhas políticas mundo afora, “Rede de Ódio” não poderia ser mais atual. Sim, o filme exagera na construção de seu protagonista e na maneira como algumas situações se desenvolvem, uma escolha utilizada para mostrar que Tomasz está disposto a quebrar normas de comportamentos, éticas e morais, mas consegue mostrar a que veio.

Filme
Filme "Rede de Ódio", da Netflix. Crédito: Netflix/divulgação

A escolha narrativa, como dito, faz o espectador entender o modus operandi do personagem, mas também o afasta da realidade, um aspecto até reforçado pelas sequências em animação que se passam dentro de um jogo. Apesar desse distanciamento, que aproxima Tomasz de um caso particular de psicopatia e o afasta de um sujeito real, o filme utiliza essa escolha para mostrar que não há vencedores e que todos são afetados pela máquina de destilar ódio nas redes.

“Rede de Ódio” mostra como funcionam as campanhas de manipulação de opinião pública e difamação, mas tira isso de foco para se concentrar na jornada de Tomasz - quando faz isso, porém, o filme se afasta também de seu espectador. Ao longo de seus excessivos 134 minutos, “Rede de Ódio” tem problemas de ritmo e alguns arcos desnecessários, mas se sustenta pela ótima atuação de Maciej Musialowski, que cria um personagem nunca confortável e que até parece sentir o peso de suas escolhas, mas nunca lida com as consequências diretas delas porque, por um motivo ou outro, elas nunca recaem sobre ele.

Komasa é bom diretor e brinca muito bem com a fotografia e o jogo entre silêncio e a música - o clímax do filme e a cena da boate são exemplos disso. Ao fim, “Rede de Ódio” tem problemas e até cansa um pouco, mas apresenta uma narrativa interessante e atual, o que gera uma fácil identificação e bastante possibilidade engajamento, o que talvez seja justamente seu objetivo.

A Gazeta integra o

Saiba mais

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.

A Gazeta deseja enviar alertas sobre as principais notícias do Espirito Santo.