Quando “Resgate” foi lançado, em abril de 2020, pegou todo mundo de surpresa. Dirigido por Sam Hargreaves, um ex-dublê no comando de seu primeiro grande projeto, e estrelado pelo astro Chris Hemsworth (o Thor da Marvel), o filme trazia excelentes cenas de ação e um espírito de blockbuster até então pouco visto nas produções originais Netflix. Na crítica do primeiro filme, encerro o texto com as palavras: “a Netflix tem em mãos uma possibilidade interessantíssima de franquia”. Felizmente eu estava certo.
“Resgate 2”, que chega dia 16 à plataforma, segue a fórmula do primeiro filme, mas tem plena ciência da obrigação de ser maior em tudo o que tenta. O longa tem início mostrando exatamente o que aconteceu com Tyler Take (Hemsworth) após os acontecimentos de Bangladesh, no filme anterior, mas o fato de Tyler ter sobrevivido provavelmente não espanta ninguém.
Em uma espécie de prólogo, acompanhamos o resgate e a recuperação do mercenário antes de sua suposta aposentadoria em uma casa isolada e cheia de animais. Claro que essa calmaria não dura muito e um misterioso e imponente homem aparece com uma proposta que Tyler até recusaria se não envolvesse a família de sua ex-esposa e, novamente, crianças. Nessa introdução também somos rapidamente apresentados aos antagonistas, dois irmãos georgianos que comandam um império criminoso na Armênia – há pouco desenvolvimento além de apresentá-los dando ao espectador a noção do tamanho da ameaça. Tudo isso não dura mais que 25 minutos, ou seja, ainda há muito tempo para a ação.
Quando menos percebemos, estamos no plano de resgate dentro de uma prisão lotada de sujeitos perigosos. Logo se percebe, também, a ausência de cortes na sequência da extração; se o primeiro filme tinha um suposto plano sequência de 12 minutos, o novo filme mira alto em uma ambiciosa cena de 21 minutos, supostamente sem cortes, envolvendo cerca de 300 figurantes, muitos embates físicos, perseguição de carros, um trem em movimento e até um helicóptero.
“Resgate 2” coloca o espectador dentro da ação de maneira impressionante, com uma violência crua, sem grandes espetáculos, e que parece perfeitamente plausível para quem já viu Rake em ação. As coreografias são ótimas e dão peso à ação sem que tudo pareça um grande balé sem alma.
Grande parte do filme se passa em Viena, na Áustria, uma localidade bem mais urbana que a do filme anterior. Há momentos grandiosos além da já citada invasão à prisão, como uma excelente sequência no prédio, na qual personagens utilizam o “chão” de vidro quase como recurso durante a luta. É também durante essa sequência que o filme traz rostos conhecidos do filme de 2020, como Nik (Golshifteh Farahani) e Yaz (Adam Bessa), que têm boas e intensas cenas de ação e seus momentos de brilho.
Se por um lado a ação é espetacular, por outro o roteiro não se preocupa tanto com a originalidade. Mesmo cheio de novos personagens, falta um como Saju (Randeep Hooda), que brilha nas sequências de luta do primeiro filme ao lado do protagonista – os gângsters georgianos são ameaçadores, claro, e têm um exército em mãos, mas nunca parecem à altura de Rake.
“Resgate 2” também sofre com a exposição de alguns diálogos, um problema recorrente nos textos escritos por Joe e Anthony Russo, que mais uma vez assinam o roteiro e a produção do filme. A sequência inicial é um festival de didatismo, com tudo sendo explicado em diálogos pouco criativos, uma muleta narrativa. Não é difícil, também, imaginar o destino de alguns personagens, pois há tão pouco desenvolvimento que um mínimo de arco dramático já indica o possível arco deles. Ainda assim, Tyler Rake tem um arco satisfatório que se conecta com o personagem apresentado em 2020 e faz com que o público até o entenda melhor.
Mesmo parte relevante no novo cinema de ação de filmes como “John Wick” (não por coincidência também comandado por um ex-dublê), “Resgate 2” ainda mostra influência de filmes como “Comando Para Matar” (1985), com Arnold Schwarzenegger, e outros hoje clássicos dos anos 1980 e 90. Com ótimo tempo de humor, mas entendendo o tom sério do filme, Chris Hemsworth desfere algumas sacadas e frases de efeito que nem sempre funcionam, mas que se encaixam no filme de forma meio torta, gerando até comentários e críticas de outros personagens.
Enquanto o filme anterior tinha um desfecho com ar de encerramento, a continuação abre de vez as portas para uma série de filmes, introduzindo novos personagens a serem desenvolvidos em histórias subsequentes. Falta, porém, sustância ao texto, um universo mais complexo para o qual o público anseie voltar para conhecer novas histórias. Por enquanto, a ação mantém o interesse vivo, mas até quando o fará?
“Resgate 2” talvez não surpreenda tanto quanto o primeiro filme, do qual ninguém sabia ao certo o que esperar, mas impressiona pela ambição de grandiosidade e, obviamente, pelas incríveis cenas de ação, sua principal razão de existir, e isso, da maneira que Sam Hargrave entrega, não é pouca coisa.
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