O que torna “Sex Education” uma série tão legal? Em suas duas temporadas, a comédia da Netflix lidou com dramas adolescentes sem subestimá-los e também tratou o sexo como algo normal, sem moralismos ou regras a serem cumpridas. O sucesso da série britânica foi gigante e era questão de tempo que sua fórmula passasse a ser copiada… Ou pelo menos que tentassem copiá-la.
“Sexify”, série polonesa lançada nesta quarta (28) pela Netflix, seria o processo de evolução natural de “Sex Education” - sai o ambiente colegial e entram a universidade e o mercado de trabalho. No primeiro episódio conhecemos Natalia (Aleksandra Skraba), uma jovem programadora às voltas com o desenvolvimento de um aplicativo para o sono. Conhecemos também Paulina (Maria Sobocinska), amiga de infância de Natalia, e Monika (Sandra Drzymalska), a rebelde filha de um milionário que leva uma vida livre, transando com quem quer quando tem vontade.
O caminho das amigas se cruza com o de Monika quando ela se muda para o quarto ao lado no dormitório da universidade. A reação inicial é de conflito - Monika é barulhenta, leva homens para seu quarto e atrapalha Natalia em seu projeto. Típica nerd estereotipada, a programadora não tem vida social e sua personalidade é construída dentro dos estereótipos de pessoas do espectro autista, mas nada sobre isso é mencionado em momento algum.
Já Paulina é uma mulher de vida sexual ativa com o noivo, mas não sabe o que é sentir prazer durante a relação. A jovem, com formação rigidamente católica, vive com a culpa cristã que seus pais e sua comunidade colocaram em sua cabeça.
Assim, quando Natalia resolve tornar o aplicativo do sono em um aplicativo para ajudar mulheres a chegar ao orgasmo, algo que ela nem sabe o que é, ela precisa de ajuda de mulheres com mais experiência no assunto. É quando se forma o trio de protagonistas, cada uma com suas peculiaridades, para trabalhar em função do sucesso da startup - a nova grande ambição nas narrativas de mercado de trabalho.
“Sexify” se esforça, desde sua sequência de abertura, para ser sexy - e até consegue em vários momentos. A série, no entanto, se concentra demais em tentar ser picante e acaba se esquecendo de um ponto que nunca pode ser deixado de lado, o desenvolvimento de personagens. Entendemos que Natalia é uma “nerd”, isso é reforçado pelo texto várias vezes, mas o roteiro apenas superficialmente aborda sua relação com a mãe e a avó.
Assim, quando no clímax surge uma cena que deveria ser comovente, ela não tem peso algum. O mesmo acontece com as outras personagens com suas relações prévias - nunca entendemos ao certo a dependência de Monika com seu ex-namorado ou o contexto familiar de Paulina, construída apenas como uma mulher infeliz e religiosa. O exagero na construção das personagens é intencional e realizado de forma a gerar conflitos entre elas e delas com o mundo do sexo, foco do aplicativo, mas falta dar conteúdo às protagonistas além disso.
A série tem um início meio lento, o que acontece principalmente em função da descrença do público em Natalia, uma mulher a princípio chata e irritadiça. A partir do terceiro episódio, porém, a trama passa a caminhar melhor quando encontra seu foco. A experiência de assistir às oito partes que integram a primeira temporada, ao final, é satisfatória. “Sexify” levanta bons temas e mesmo sem inovação narrativa alguma, prepara bem o espectador para seu fim, que quase surpreende e acaba sendo uma recompensa ao público, um conforto.
Mesmo tendo alguns bons arcos, “Sexify” não os explora como poderia. As referências de “Sex Education” são quase explícitas, com um negócio de sexo e até uma mãe como uma espécie de guru/terapeuta sexual. As semelhanças também estão na maneira como o texto trata o sexo, quase sempre sem problematizá-lo, e na estrutura narrativa, sobre a qual não vou revelar spoilers aqui. Há, vale ressaltar, algumas questões mal resolvidas pelo roteiro e atitudes que incompreensivelmente permanecem sem consequência alguma.
“Sexify” não é “Sex Education”, é bom que isso fique claro. A série polonesa não tem a qualidade narrativa da britânica e tampouco sua profundidade, mas isso não significa que ela seja ruim. “Sexify” é um entretenimento leve, às vezes meio picante, com um conteúdo central ótimo, a sexualidade feminina, mas o explora apenas superficialmente e com pouco carisma. Quando as personagens começam a ficar realmente interessantes, a primeira temporada chega ao fim.
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