Por que os doramas e os k-dramas fazem tanto sucesso? Os dramas orientais, produzidos no Japão e principalmente na Coreia do Sul (uma indústria cinematográfica gigantesca), conquistaram o mundo e um público vasto. Não é coincidência que o momento de sucesso dessas produções coincida com a ascensão do k-pop; os dois, na verdade, estão interligados a um projeto de expansão cultural, de soft power (relevância global a partir da cultura), uma prática não muito diferente da que tornou os EUA uma potência global décadas atrás.
Séries como “Round 6”, ainda hoje a mais vista da história da Netflix, conquistaram o mundo. A plataforma tem investido desde então cada vez em mais em conteúdos coreanos – tinha até uma área dedicada para essas obras no Tudum, evento global da marca. Assim, volta e meia alguma nova série sul-coreana aparece entre as mais assistidas, da violenta e madura “My Name” à ingenuidade novelesca de “Uma Advogada Extraordinária”, trama em que o novo sucesso, “Sorriso Real”, parece se inspirar bastante.
Com dois episódios semanais, “Sorriso Real” é um conto de fadas travestido de drama coreano. Na série, acompanhamos Cheong Sa-rang (Im Yoon-ah), uma jovem que sonha em ser concierge de um grande hotel. Quando a conhecemos, ela está em um processo seletivo para ser contratada como trainee do Hotel King por um mês. Sa-rang é uma batalhadora, não vai deixar que nada a atrapalhe em seu sonho, como pode-se ver na sequência em que é entrevistada para a vaga.
A série também acompanha Gu-Won (Jun-Ho Lee), um rapaz bonito cuja única característica dada pelo texto é ser herdeiro de um império que inclui o Hotel King. Para mostrar o quanto ele é “diferente”, a série o introduz enquanto salta de paraquedas, de terno e gravata, para chegar ao hotel da família.
Após um breve contato entre seus protagonistas, “Sorriso Real” tem uma passagem de tempo, de 2015 aos dias atuais. Nesse meio, Sa-rang subiu na carreira e ficou noiva, enquanto Gu-Won resolveu estudar. Quando ele finalmente precisa voltar ao hotel, o reencontro deles é inevitável. A série segue a batida, mas sempre eficaz, fórmula do “de rivais a amantes”, tudo, é claro, do jeito coreano.
Voltando à pergunta que abre este texto, os doramas funcionam devido a seu grande apelo popular. “Sorriso Real” segue a fórmula que deu certo em “Uma Advogada Extraordinária”, abusando da comicidade e da ingenuidade de seus personagens. A série também aposta muito, mas muito mesmo, no romance entre seus protagonistas.
A história de Sa-rang é a história da Cinderela, uma plebeia que ousa entrar na realeza mesmo que não seja qualificada para isso, como o primeiro episódio inicialmente reforça – o hotel é o palácio e Gu-Won, obviamente, é o príncipe. No intuito de manter aceso o interesse do público no romance, a série abusa do “quase”, com várias sequências nas quais o público pensa “agora vai”, mas os doramas não são assim, e o sucesso talvez venha justamente disso.
Há uma pureza intencional nos personagens de “Sorriso Real” e em sua trama, característica que reforça o aspecto conto de fadas da série e que pede que o espectador ignore todo o resto. Gu-Won não é interessante, mas é bilionário e bonito, o que parece bastar para o texto e seu conflito: uma jovem batalhadora de origem humilde desperta o interesse do solteirão nobre e cobiçado. Há poucos conflitos reais na série, que escolhe não se aprofundar em nenhuma das questões sociais que aborda superficialmente. Novamente, essa fuga da realidade é justamente o que desperta e mantém o interesse do público.
“Sorriso Real” é uma série fácil para quem procura uma série fácil. A série nunca desafia o espectador e oferece a ele justamente o que ele procura. Quer uma história de amor ingênua, um conto de fadas moderno com convenções antigas? A série da Netflix é para você. Caso contrário, melhor nem arriscar, pois “Sorriso Real” consegue ser muito mais constrangedora do que divertida para um público mais exigente.
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