Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

"Station Eleven", da HBO Max, é uma das melhores séries de 2021

"Station Eleven" ("Estação Onze") leva para a HBO Max o ótimo livro homônimo de Emily St. John Mandel. História mostra a reconstrução do mundo após uma pandemia

Vitória
Publicado em 23/12/2021 às 21h42
Série
Série "Station Eleven", da HBO Max. Crédito: HBO Max/Divulgação

Quando lançou seu quarto livro, “Estação Onze”, em 2014, Emily St. John Mandel obviamente não fazia ideia da pandemia que atingiria o mundo cinco anos depois. O livro é um drama de sobrevivência sobre uma gripe que se espalhou pelo globo e dizimou parte da humanidade. Com os direitos adquiridos pela HBO, a série ironicamente estava em produção quando foi interrompida pela Covid-19.

“Station Eleven”, a série, já esta disponível na HBO Max com seus três primeiros episódios. A minissérie é favorecida por um distanciamento dos piores dias da pandemia, o que não aconteceu, por exemplo, com “Utopia”, lançada pela Amazon em outubro do ano passado. Assim, ao invés de parecer aproveitador ou até mesmo ultrapassado, o texto da série criada por Patrick Sommerville (“Leftovers”, “Maniac”) aproxima o público de um terror, um medo natural do desconhecido, mas se afasta bastante da narrativa que se espera de uma trama do gênero.

Série
Série "Station Eleven", da HBO Max. Crédito: HBO Max/Divulgação

A minissérie mantém a estrutura do livro, com idas e vindas temporais e histórias contadas pelos olhos de diversos personagens às vezes com diferentes versões dos mesmos acontecimentos, o que nos ajuda a montar o quebra-cabeças e também oferece uma alternância narrativa. O recurso funciona bem e dá a impressão de um roteiro sempre em movimento.

Essas alternâncias são muito presentes nos episódios iniciais. No primeiro deles, o jornalista Jeevan (Himesh Patel), após presenciar a morte de um ator durante um espetáculo e se ver responsável por uma criança desconhecida, recebe uma ligação estranha da irmã dizendo para ele estocar suprimentos e se isolar. O episódio se passa durante o final do ano, em Chicago, uma época de encontros familiares que causam no público uma sensação de desconforto ao ver toda aquela movimentação e troca de carinhos de pessoas sem máscaras e despreocupadas. Não demora para a informação do vírus se espalhar e o caos se instaurar na cidade.

Apesar da seriedade do tema, "Station Eleven" encontra um bom tom para contar a história. A dinâmica entre Jeevan e a criança interpretada por Matilda Lawler é ótima, com um mix de sentimentos - ele percebendo a gravidade do que acontece ao redor e tentando protegê-la de tudo.

O segundo episódio já nos leva ao futuro, 2040, em um mundo transformado. O episódio acompanha Kirsten (Mackenzie Davis), integrante de uma trupe que viaja por comunidades isoladas nos interiores dos EUA com peças de Shakespeare - a ironia é que é durante uma apresentação de “Rei Lear”, texto do Bardo, que a pandemia se torna pública quando um popular ator colapsa no palco da peça assistida por Jeevan. Kirsten lida com transtorno de estresse pós-traumático e conhecemos os motivos disso por flashbacks.

Série
"Station Eleven" adapta o livro de Emily St. John Mandel para uma minissérie. Crédito: HBO Max/Divulgação

Já o terceiro, talvez o melhor dessa leva inicial, se distancia do livro para acompanhar Miranda (Danielle Deadwyler), uma artista que se encontra em uma viagem de negócios na Malásia quando o vírus começa a se espalhar. O texto surpreende com um desenvolvimento para a personagem e até por explorar questões sobre o valor da arte e a solidão - o episódio parece pensado como uma análise comportamental pandêmica, um desvio do texto original que se encaixa bem no estilo narrativo de “Station Eleven”.

A grande sacada da série da HBO Max é entender o mundo e não entregar mais uma série pós-apocalíptica com cenário à lá “The Walking Dead” - “Y: O Último Homem” não foi cancelada à toa. “Station Eleven” tem afeto, humor e reflexão que a tornam em uma história gostosa de se acompanhar. Os produtores foram inteligentes ao suavizar algumas das passagens mais violentas do livro de Emily St. John Mandel e se preocupar mais com os personagens e as relações entre eles, tornando a minissérie muito mais uma história de viver pós-pandemia do que uma trama de sobrevivência.

Série
"Station Eleven" adapta o livro de Emily St. John Mandel para uma minissérie. Crédito: HBO Max/Divulgação

Pelo menos nos episódios já lançados, a série passa pouco tempo na pandemia, mostrando o que a antecede e se preocupando com os efeitos dela no futuro das pessoas. Com tudo tão fresco e talvez ainda cicatrizando na cabeça do público, esse lembrete não é necessário. É curioso também como “Station Eleven” foge do habitual costume de usar recortes de noticiários para situar o espectador de tudo o que acontece em seu universo. Na adaptação, essa ambientação é feita por diálogos, ligações e mensagens de texto, recurso que, por mais que pareça um detalhe superficial, aproxima personagens e oferece um aconchego das relações sociais.

É interessante perceber como “Station Eleven” se distancia de obras como a já citada “The Walking Dead” ou diversas outras que dependem das péssimas escolhas dos personagens para fazer o texto caminhar. A nova série da HBO Max tem diversas situações em que essas muletas seriam confortáveis, mas raramente se utiliza delas. Ao fazer escolhas mais humanas, a série ganha contornos mais complexos e novamente se aproxima de um público às voltas com questões existenciais.

O livro tem outros arcos ainda não explorados pela série, como O Profeta, que deve ser desenvolvido nos próximos episódios - resta saber como o roteiro vai tratar o tema, se mantendo a pegada original ou adaptando-a. De qualquer forma, lançada como minissérie de 10 episódios, "Station Eleven" pode encontrar uma dração ideal pare reimaginar os escritos de Emily St. John Mandel.

“Station Eleven” é uma das melhores séries de 2021 e uma excelente surpresa, uma trama que soube ser trabalhada pela HBO para ser potencializada pela situação global. Pode haver um estranhamento inicial para quem nunca leu “Estação Onze”, mas não demora para que o espectador se sinta parte daquele mundo e até enxergue em sua vida paralelos com o que é mostrado na série. Não há identificação maior do que essa.

A Gazeta integra o

Saiba mais
Rafael Braz Streaming hbo max

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.

A Gazeta deseja enviar alertas sobre as principais notícias do Espirito Santo.