No início dos anos 2010, começaram a circular pela internet imagens de pinturas diferentes. De autoria do sueco Simon Stålenhag, as realistas obras misturavam elementos de ficção científica com a vida cotidiana. Por exemplo: a pintura de um jovem casal com um enorme robô ao fundo, ou carros passando por uma estrada que tem no horizonte uma gigante estrutura de aspecto futurista… O trabalho de Simon não trazia palavras, apenas imagens - não se sabe muito sobre aquela realidade em uma pequena cidade sueca sob a qual foi construído um acelerador de partículas, apenas entendemos que é algo muito próximo ao que vivemos.
As obras, posteriormente reunidas num livro chamado “Tales From the Loop”, agora ganham vida em uma série de mesmo nome. Disponível no Amazon Prime Video e criada por Nathaniel Halpern (“Legion”), a série traz oito episódios centrados na vida daquelas pessoas.
A primeira temporada é uma espécie de antologia, com tramas diferentes a cada hora, todas com início, meio e fim. Apesar disso, o texto de Halpern sutilmente as conecta as histórias - entendemos o comportamento de um personagem quando o conhecemos melhor na história de outro. Assim, aos poucos vamos nos ambientando àquele universo em que tudo gira em torno do “Loop”, o tal acelerador de partículas que possibilita que tudo aconteça. Como diz o personagem no Johnathan Pryce (“Dois Papas”) no episódio piloto, “nada é impossível”.
“Tales From the Loop” não é uma série fácil. Mesmo que sua ambientação lembre algo no estilo “Stranger Things” (cidade americana do interior, coisas fantásticas…), a série criada por Halpern é mais poética e pessoal. A ficção científica é apenas uma ferramenta de criação de universo e de narrativa que possibilita as histórias serem contadas como Halpern queria, sem amarras com a realidade, mas despertando questionamentos em quem as assiste.
Há histórias tristes, outras bonitas e até divertidas, todas contadas de maneira simples, contemplativa e com qualidade cinematográfica. A música de Philip Glass, por exemplo, é simples, mas marcante, pontuando todas as histórias. A série também tem Jeff Croneweth, parceiro habitual de David Fincher (“Garota Exemplar”) como diretor de fotografia, e Philip Messina (“Mãe!”), na direção de arte. O elenco traz nomes como Rebecca Hall ("Vicky Cristina Barcelona") e o já citado Jonathan Pryce.
Em conversa por telefone, o cineasta Mark Romanek, diretor do episódio piloto, contou que a construção de um mundo crível foi a grande preocupação dos produtores. “Matt (Reeves) e Nathaniel (Halpern) me pediram para dar esse tom como se fosse um grande filme de uma hora”, explicou. Com influências de Terrence Malick e Stanley Kubrick, Romanek dá o tom de “Tales From the Loop” em uma construção de mundo muito similar à de “Never Let Me Go” (2010). Apesar de fantástico, tudo é real.
Também em entrevista por telefone, Halpern explicou que é isso que o atrai na ficção científica: contar histórias pessoais que não poderiam ser contadas de outra maneira. “A ficção científica dá ao espectador um senso de segurança que o permite se identificar com aquela história de uma maneira diferente. Há muitas possibilidades no gênero”, ponderou.
Além de Romanek, a série tem episódios dirigidos por Jodie Foster (“Jogo do Dinheiro”), Tim Meliants (“Peaky Blinders”), Charlie McDowell (“Complicações do Amor”), Andrew Stanton (“Wall-E”), entre outros. Todos eles empregando sua assinatura à história que contam, mas respeitando a poesia e a intimidade do trabalho de Simon Stålenhag.
“Tales From the Loop” careça, talvez, de uma catarse. O público de ficção científica atualmente está acostumado a séries como “Westworld”, que deixou de lado qualquer questionamento filosófico da primeira temporada e abraçou a violência e a catarse nas outras duas. A ideia de Halpern, porém, nunca foi essa. O roteirista quer contar histórias, e o faz com maestria.
Robôs, realidades paralelas e eventos misteriosos servem apenas como catalisadores para tramas sobre pessoas, seus anseios e medos. “Tales From the Loop” se aproxima mais de uma obra de Terrence Malick do que da já citada “Stranger Things” ou qualquer outra aventura fantasiosa disponível. Tal qual as obras de Simon Stålenhag, a série oferece poucas explicações precisas e pouco ou nenhum didatismo. É poesia, arte em sua essência, para ser admirada e entendida com calma.
Este vídeo pode te interessar
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rápido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem.
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta.