Com o sucesso absoluto de “Ted Lasso” nos últimos anos, até que demorou bastante para o surgimento de alguma nova comédia de futebol para explorar o nicho e o vácuo deixado entre temporadas da série exibida pela AppleTV+. “The First Team”, recém-lançada pela HBO Max no Brasil, surge como a primeira a se arriscar, mas há um motivo para ela não ter se tornado popular: simplesmente não é boa o suficiente.
A estreia da série na HBO Max por aqui causa certa surpresa - “The First Team” foi lançada originalmente em maio de 2020, na Inglaterra, com críticas negativas e uma recepção pouco calorosa do público. Curiosamente, a plataforma, sem grandes explicações, ainda atrasa lançamentos originais da marca, como “Estação Onze”, já disponível em outros mercados e ignorada no Brasil. Cui
Criada e desenvolvida pela dupla Damon Beesley (“Flight of the Concords”) e Iain Morris (“The Inbetweeners”), “The First Team” acompanha um jovem jogador americano, Mattie Sullivan (Jake Short) que acaba de ser contratado por engano para um time fictício da Premier League inglesa. Mark (Will Arnett), americano dono do time, achou que Mattie fosse um jogador estabelecido na seleção americana e não um jovem recém-saído da universidade.
Em um vestiário complicado, comandado pelo veterano e não muito simpático Petey Brooks (Theo Barklem-Biggs), Mattie se aproxima do núcleo mais jovem do elenco, Jac Turner (Jack McMullen), uma promessa das categorias de base, e Benji Achebe (Shaquille Ali-Yebuah), que se considera o “Beckham camaronês”, leva vida de estrela, mas ainda vive com a mãe.
“The First Team” tem muito pouco de futebol jogado além de uma ou outra cena de treino. Na maior parte do tempo, o texto explora estereótipos bem incômodos e piadas de gosto muito duvidoso. É curiosa a maneira como a série britânica cria a dinâmica entre os personagens; é Mattie, o americano, o mais esperto e conciliador enquanto seus colegas de time parecem trogloditas machistas e pouco tato social.
O roteiro cria arcos descartáveis, como o do constrangedor episódio sobre o movimento #MeToo, e deixa de explorar seus personagens. Nada sabemos de Mattie além de seu celibato voluntário, enquanto Jack até ganha certa profundidade com a pressão que os torcedores depositam nele, pois, para amantes do futebol, nada é tão recompensador quanto ver um prata da casa se destacando. Tudo, porém, é mal desenvolvido em uma narrativa atropelada - em um episódio, um jogador fala pela primeira vez com uma mulher, e, no próximo, já a está pedindo em casamento.
A série também tem um olhar de preconceito caricato para outras etnias: o latino é bom de bola, mas tem um dono (não é um empresário, é um dono mesmo) e não sabe conviver em sociedade; o inglês de ascendência camaronesa é malandro, cheio dos esquemas e capaz de burlar as regras para se dar bem. Ao distorcer algumas das dinâmicas de vestiário de “Ted Lasso”, “The First Team” erra a mão e se aproxima da xenofobia e da homofobia. Uma piada sobre brincadeiras sexuais feitas pelos jogadores nos velhos tempos, por exemplo, surpreende e causa riso quando usada pela primeira vez, mas ela se torna recorrente e perde a graça inicial.
Os arcos da série lançada pela HBO Max também são bem pouco originais. Em um deles, um psicólogo chega para acompanhar os jogadores - qualquer semelhança com a série estrelada por Jason Sudekis é mera coincidência. Da mesma forma, algumas piadas são construídas a partir do pouco conhecimento do americano Mark, o dono do time, sobre as regras do futebol, não muito diferente do que “Ted Lasso” faz desde quando ainda era uma esquete criada para divulgar a Premier League nos EUA.
Curiosamente, apesar de chegar ao Brasil apenas agora, depois do sucesso de "Ted Lasso", "The First Team" foi lançada quase que simultaneamente à série da AppleTV+. Como boa parte das piadas da primeira temporada da série do treinador americano do AFC Richmond já estavam presentes nas esquetes que apresentaram o personagem, é impossível não pensar que elas serviram de "inspiração" para a trama que chega agora à HBO Max.
“The First Team” é uma série que oferece algumas boas piadas, mas dissipadas em um roteiro pouco inspirado e com personagens pouco interessantes, quase como se quisesse ser o anti-Ted Lasso. É curioso como o texto se propõe a ser sobre futebol ao mesmo tempo em que obriga um distanciamento do espectador, que nunca sabe nem sequer o nome do time que está acompanhando.
A opção por tornar o futebol secundário tira de “The First Team” qualquer carga dramática, pois os protagonistas praticamente nunca entram em campo e nós pouco nos importamos se aqueles jogadores ganham ou perdem, até porque pouco nos importamos com eles também, e isso é o rebaixamento para qualquer narrativa esportiva.
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