Ela chegou, a inevitável temporada de filmes de Natal na Netflix, a temporada que em anos anteriores nos deu filmes como “Missão Presente de Natal”, “Uma Invenção de Natal”, “Klaus”, “Tudo Bem No Natal Que Vem”, “Amor Com Data Marcada”... Nem todos filmes bons, mas obras com a missão de levar para o espectador o espírito natalino e oferecer algum conforto em tempos difíceis (principalmente os lançados em 2020).
Dirigido por Hernan Jimenez, “Um Match Surpresa” é um filme divertido, que segue à risca as convenções das comédias românticas de encontros e desencontros para construir uma relação, mas que se sustenta em um argumento um tanto discutível.
Na trama, a jornalista Natalie Bauer (Nina Dobrev, de “Vampire Diaries”) vive pulando entre encontros ruins com homens que conhece em aplicativos. A frequência dessas roubadas é tamanha que Natalie transformou seus encontros em uma coluna de sucesso na publicação em que trabalha. O momento inicial, quando, o filme nos apresenta um pouco dessas roubadas, é um recorte ágil que mostra alguns problemas de um encontro presencial com alguém que se “conhece” apenas virtualmente.
Após quase desistir e ampliar o escopo de sua busca, Natalie dá um match em Josh, um bonitão gente boa e sensível com quem a moça desenvolve uma relação de cumplicidade e por quem ela se apaixona on-line, mas que mora do outro lado dos EUA. O problema começa quando ela decide fazer uma surpresa para ele no Natal e aparecer em sua pequena cidade sem nenhum aviso prévio.
Chegando lá, ela descobre que Josh (Jimmy O. Yang) não é o bonitão das fotos, mas sim um rapaz tímido que usava a foto do bonitão da cidade, Tag (Darren Barnet, de “Eu Nunca…”), para conhecer garotas no aplicativo. O pior é que, ao sair para beber e se esquecer por alguns instantes ter sido enganada, Natalie conhece o verdadeiro Tag e decide ficar na cidade para conquistá-lo. Como Josh é amigo de infância do rapaz e diz conhecê-lo como ninguém, eles fazem um acordo: ela finge ser a namorada dele nas festas de fim de ano e ele a ajuda a conquistar o galã.
“Um Match Surpresa” traz alguns bons momentos. O núcleo da família de Josh, por exemplo, é divertido e cheio de afeto familiar, o que traz um conforto natalino ao filme. Algumas situações criadas pela trama também rendem bons momentos, como as aventuras a que Natalie se sujeita para agradar Tag ou a sequência do karaokê. O texto também tem boas sacadas, como discutir sobre filmes de Natal - “Duro de Matar”, afinal, é ou não é uma trama natalina?
O filme de Hernan Jimenez tem problemas estruturais, claro, como algumas saídas fáceis, o caricato e onipresente chefe de Natalie, a melhor amiga de quem o texto se esquece após ela cumprir seu papel na trama e umas piadas que não funcionam - outras, no entanto, são engraçadas mesmo quando já esperamos por elas. O grande problema de “Um Match Surpresa” é sua premissa nascer de um engano, de um “catfishing”, gíria em inglês para pessoas mal-intencionadas que usam perfis falsos na internet para enganar outras pessoas.
Por mais que eles se deem bem, a química entre ambos como casal é inexistente. Nada impediria, porém, que cada um aprendesse uma lição e eles se tornassem bons amigos, como se fossem um milagre de Natal um para o outro, o que precisavam para seguir em frente, não necessariamente romanticamente, certo? Não é bem assim que o filme caminha…
À medida que conhece Tag, a protagonista percebe que ele talvez não fosse tudo aquilo que ela imaginava. O roteiro, vale ressaltar, não transforma o bonitão em um sujeito asqueroso, apenas o desenvolve como um cara com quem a protagonista não consegue criar um vínculo. Quando tudo ganha novos contornos, Natalie percebe que, apesar de ter sido enganada por ele, Josh era realmente o sujeito por quem ela teria se apaixonado, com quem conversava e trocava mensagens o dia inteiro.
A narrativa vai lentamente (tão lentamente quanto o gênero permite) criando uma intimidade entre Natalie e Josh, até justificando a atitude dele e dando motivos para que o casal fique junto. Pior, há um momento em que outro personagem diz a ela que ela precisava dessa experiência para rever alguns conceitos… Natalie foi enganada, atravessou o país, e não tem sequer o direito de se incomodar com isso.
Os roteiristas Rebecca Ewing e Daniel Mackey justificam a ação de Josh com um personagem acostumado a nunca ser centro das atenções. É válida a ideia de que alguém precisaria apenas se aproximar dele para ver a boa pessoa que ele é, mas o texto recompensa a falsidade. Sim, talvez seja exigir demais de uma comédia romântica natalina algum tipo de punição ao personagem, mas isso também não apaga a equivocada premissa do roteiro.
Deixando a análise mais aprofundada do conteúdo de lado, “Um Match Surpresa” diverte e agrada como filme natalino. Mesmo nunca convencendo como casal, Josh e Natalie são personagens interessantes e poderiam ser explorados de maneira não-romântica. Ao fim, a mensagem é dúbia: o texto tenta convencer o espectador de que vale a pena ser quem você é, mas, ao mesmo tempo, recompensa o personagem que fingiu ser outra pessoa.
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