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Personalidades do ES falam sobre o racismo

Capixabas falam sobre também sobre as manifestações contra o racismo se espalharam pelo mundo logo após o assassinato do afro-americano George Floyd, nos Estados Unidos

Publicado em 13/06/2020 às 05h00
Atualizado em 13/06/2020 às 05h01
Fábio Carvalho, músico
Fábio Carvalho, músico. Crédito: Diego Nunes

“Racismo é problema de brancos e negros nesse país”. A frase da historiadora e professora da Ufes, Leonor Araújo, traduz bem a edição deste final de semana. Apesar de o tema ter voltado à pauta mundial com as manifestações contra o racismo, logo após o assassinato do afro-americano George Floyd por um policial branco em Minneapolis, nos Estados Unidos, o racismo é problema secular (e ainda não solucionado) no planeta. Para falar sobre o tema, RR convidou cinco personalidades negras para contribuir com esse debate.

STEPHANIE PIN/ MODELO E MISS

Stephanie Pin, modelo e miss
Stephanie Pin, modelo e miss. Crédito: Divulgação

"Trabalho no ramo da moda e, consequentemente, com beleza há 10 anos. Não ter uma cor que caracteriza uma mulher negra sempre me provocou a sensação de não estar nem lá nem cá. Isso porque para a maioria sou morena, supostamente. Mas, nas vias de fato, sofri preconceito tanto quanto outras mulheres pretas. Iniciando da premissa que não sou branca, tenho raízes capilares afro e trabalho em um ramo que segrega as pessoas sem vergonha. Segui durante muitos anos padrões de beleza que me fizeram obter mais sucesso como modelo e como miss. Nessa primeira profissão, me vi constantemente em situações desagradáveis. Precisei alisar o cabelo - já nem sabia mais como era o meu cabelo é natural - pra não dar “trabalho” para as equipes de beleza e para o caso de eu suar durante uma campanha e não ficar com a raiz aparente. Durante o verão, me privei de tomar sol diversas vezes para que minha cor de pele não fosse ainda mais escura e eu perdesse trabalhos, descaracterizando meu material principal feito durante o ano com a pele um pouco mais clara. Esse tipo de situação imposta pelo showbiz por muitos anos foram determinantes para que eu realmente temesse ser contrária às “regras”. Na Turquia, ouvia coisas como “você é muito escura pra fazer campanha de pijamas” e falando sobre racismo hoje ainda sou contestada como se fosse possível medir quem pode ou não sofrer esse tipo de preconceito. Em 2016 e 2017, assistimos, após Deise Nunes, mulheres negras sendo coroadas no Miss Brasil novamente. Hoje, com a avalanche dos protestos ainda ouço algumas pessoas dizendo que é um exagero, que já é o suficiente e que ninguém aguenta mais ouvir falar do assunto. Ninguém aguenta mais viver o assunto. Ninguém merece o assunto. E se alguns já pensam ser o suficiente ouvindo falar, imagine para àqueles que sentem e se mantêm de pé - revela-se aí uma rotina de heróis, e esses heróis são pretos. Deixo minhas palavras aqui apenas para lembrá-los, olhar em volta significa ter empatia. Publicar fotos no Instagram e a hashtag da moda não é posicionamento. O dia a dia se mostra palco para a verdadeira militância que deveria ser manifestada por todos os seres humanos. Preciso dizer que somos iguais? Para os que ainda não sabem, estaremos com as bandeiras hasteadas para lembrá-los. Racistas não passarão.

LEONOR ARAÚJO/ HISTORIADORA

Leonor Araújo, historiadora
Leonor Araújo, historiadora. Crédito: Divulgação

"Foi necessário que um negro norte-americano morresse assassinado pela polícia para que alguns brasileiros falassem sobre racismo. Isso mostra o olhar seletivo do brasileiro sobre seu país, sobre seu povo. É o que chamamos do Pacto Narcisístico da Branquitude, onde parte importante dos que governam esse país habitam; aquele mundinho dos bairros nobres onde a polícia é serviçal de seus moradores e onde, por séculos, reina o silêncio sobre o extermínio da população negra desse país. Mesmo que essa população esteja nos seus lares todos os dias como empregadas domésticas, porteiros, eletricistas, pedreiros, babás e tanto outros.

São aproximadamente 128 negros mortos por dia, 70% do número de assassinatos diários no Brasil, um genocídio que mata muito mais que guerras civis em outros lugares do mundo.

O racismo não mudou e muito menos os seus efeitos, como diz Will Smith ele agora está sendo filmado, televisionado e divulgado nas redes sociais. E você que é branco, ou se acha branco, mudou? Repetimos sempre que não basta falar, postar e se indignar nas redes sociais contra o racismo, é necessário que as pessoas sejam antirracistas.

Ser antirracista é primeiro ter consciência que se é racista, pois isso, e somente isso, fará com que você mude de atitude. Mudar de atitude é quebrar o silêncio, desaprovar em público atitudes racistas, saber que sua empregada, babá, diarista tem o mesmo direito de estar em isolamento social em seus lares, recebendo seu salário, porque seus filhos também não têm escola e ela não sobrevive sem o dinheiro mensal. Ser antirracista é se rebelar contra a morte de milhares de jovens negros por ano e não apenas olhar a página policial e associar a morte ao tráfico. Nada, absolutamente nada, justifica uma morte violenta, principalmente se ela vem pelas mãos daqueles que são pagos para te proteger com o dinheiro dos nossos impostos, e hoje as mulheres negras proporcionalmente são as que mais pagam.

Ser antirracista é ir pra rua por João Pedro, por Marielle, por todos negros e negras que são assassinados todos os dias. Ser antirracista é romper a falsa ideia da Democracia Racial e saber que o Racismo é problema de brancos e negros nesse país."

POLY POLYCARPO, EMPRESÁRIA E INFLUENCIADORA

Poly Polycarpo, influenciadora e empresária
Poly Polycarpo, influenciadora e empresária. Crédito: Divulgação

"Eu, como mulher negra, gestante e influenciadora vejo esse novo cenário que estamos vivendo necessário e muito importante. Essa é uma ótima oportunidade de revermos nossas escolhas de como consumimos conteúdo nas redes sociais e também na criação dos nossos filhos. Que tal rever quem são as pessoas que você assiste nos stories? Quem você segue é majoritariamente branco ou negro? Seus filhos leem e assistem desenhos/filmes com pessoas negras? Isso é primordial para darmos voz e visibilidade pra quem está aí produzindo conteúdo e não tem as mesmas oportunidades de pessoas brancas. Assim a gente começa a mudar o sistema por nós mesmos."

ANDRÉ ADIKTO/PROFESSOR E MC

André Adikto, professor e MC
André Adikto, professor e MC. Crédito: Divulgação

"O racismo vai muito além de julgamento esteriótipos físicos. Quando mais jovem, um colega de escola na Praia do Canto já se referiu a mim como “beiço de nego”, mas o maior problema não está aí. Esse é ruim também. O grande vilão é que a educação do brasileiro foi sabotada. O conteúdo das ciências humanas, principalmente, da história, é contado por pensadores brancos e de forma distorcida. Tanto que até hoje tem escola que comemora o 13 de maio (Dia da Abolição da Escravatura) e celebra Princesa Isabel como heroína. O que eu quero dizer com isso é que as fakenews sempre existiram. E o povo preto foi o que mais sofreu com elas. O poder da comunicação sempre esteve nas mãos de brancos e o povo negro nunca teve chance de se explicar".

FÁBIO CARVALHO/ MÚSICO

Fabinho Carvalho
Fabinho Carvalho. Crédito: Monica Zorzanelli

"O racismo está aí instituído no nosso país e no mundo há mais de 300 anos, desde a chegada dos negros escravizados da África para as Américas. O racismo é uma pauta urgente, temos que falar sobre ele sempre, pois vivemos em uma sociedade racista e preconceituosa, vivemos em meio a um racismo estrutural no país. Falar sobre racismo não é “mimimi” como se diz por aí, só nós, negros, sabemos o que passamos nos nosso dia a dia. Falo porque sofro na pele e sei o que digo. O negro tem direito à educação, saúde, a cargos de comando em empresas privadas e no estado, e não ser olhado na rua sempre como um suspeito ou bandido pela cor de nossa pele. E, o mais importante, temos o direito à vida. O genocídio ao povo negro por parte do Estado é estarrecedor: a cada três minutos morre um jovem negro no Brasil e muitos deles pela arma de um policial. É importante a sociedade não ser racista. Mais que isso: a sociedade precisa ser antirracista, pois nossas Vidas Negras Importam".

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