Como pôde o oásis da América do Sul, sua suposta Suíça, ter se transformado em um campo de batalha? Para responder a tal questionamento, recorro a um livro de grande repercussão recente no Chile, “La dictadura” (2018), de Jorge Baradit. Em síntese, é difícil realizar mudanças sociais em um país espantosamente desigual.
O contexto da Guerra Fria representou um tempo sombrio na América do Sul. Ao final de 1972, houve uma greve de caminhoneiros que paralisou o Chile, obstruindo a distribuição de alimentos e artigos de primeira necessidade. A pressão derivada da sabotagem econômica era enorme, gerando inflação e desabastecimento. A escassez de crédito externo ajudava a estrangular o país. O espantalho do comunismo era manipulado pelos golpistas, provocando medo ao falar de cubanos inexistentes e tanques russos que cruzariam os Andes.
A paralisação dos transportes públicos agravou a situação do governo Allende. O primeiro momento do golpe foi de massacre indiscriminado. Segundo Baradit, “o vale de Santiago era um campo de concentração cercado por controles militares armados”. Os Chicago Boys entregaram um plano chamado “El Ladrillo”, a ser seguido após o golpe de 11 de setembro de 1973. Privatizações e redução do poder regulatório do Estado integravam esse plano. A implantação de um modelo econômico liberal selvagem transformou vários aspectos sociais básicos da vida coletiva em negócios privados. Em 1990, a ditadura entregou um país com índices de pobreza entre 40% e 45%.
A redemocratização chilena teria que lidar com a tutela das Forças Armadas, comandadas pelo general Pinochet. De acordo com Baradit, “os piores anos da economia chilena foram vividos durante a ditadura dos Chicago Boys”. Para o autor, nenhum governo democrático suportaria tais experimentos.
A distribuição de rendas e riquezas piorou sob a ditadura e os governos democráticos da Concertação foram pouco ousados para mexer na estrutura do modelo econômico herdado, por temerem o Exército e o poder econômico estabelecido. Segundo Baradit, “este país é dirigido economicamente por uma militância pinochetista agradecida pelos privilégios recebidos. Uma elite que tem o poder econômico, militar, dos meios de comunicação, das terras, das indústrias”.
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O Chile é um dos países mais desiguais do mundo. Uma pesquisa divulgada recentemente pelo instituto Ipsos revelou que 67% dos entrevistados naquele país “se cansaram de suas condições de vida nas áreas econômica, de saúde e aposentadoria”, que consideram “desiguais e injustas”. Assim como no Chile, o 1% mais rico da população detém mais de 25% da renda no Brasil.
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