Era madrugada no distrito de Santa Isabel, em Domingos Martins, Região Serrana do Estado. Por volta das 2h40, um prédio de quatro pavimentos e seis apartamentos desabou, arrastando os 22 moradores para os escombros. Dois deles morreram: uma criança de 7 anos e sua avó, de 47. Dezessete anos após a tragédia, a Justiça estadual concluiu que a instalação de uma academia em um dos apartamentos ocasionou o desabamento.
O relato está na sentença de um dos doze denunciados pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES) e o único a receber uma condenação. Ele residia em um dos apartamentos no andar mais alto do prédio. O documento cita as conclusões do laudo pericial que indicou a causa determinante para o desabamento.
“Conclui-se que os indícios apontam que a sobrecarga na estrutura do imóvel, provocada pela instalação e funcionamento da academia de ginástica, foi determinante para o desabamento do prédio”.
Foi informado ainda no mesmo texto que, se a estrutura da edificação não tivesse sido submetida aos incrementos de carga da academia, de 2.298,68 quilos, o prédio provavelmente não teria desabado.
“Pois, esta estrutura manteve-se inabalada por quase 15 anos, considerando-se que desde o início da construção e mais de 12 anos considerando a conclusão de toda a obra, e só veio apresentar sinais de anomalias em sua estrutura concomitantemente à instalação da academia de ginástica”, é relatado no laudo pericial e na sentença, confirmada pelo Tribunal de Justiça no mês de julho.
A construção do prédio e suas ampliações, segundo informações da denúncia, foram feitas de forma irregular, e foi ocupado por moradores sem a expedição do "habite-se".
A tragédia aconteceu no dia 20 de julho de 2007, quando a maioria dos moradores dormia. Oito pessoas ficaram feridas, e uma delas gravemente por ter tido as pernas esmagadas.
A academia
Quatro meses antes do desabamento, Alex Sandro Martins, que alugava um dos apartamentos, montou uma academia no imóvel que ocupava, segundo a denúncia do MPES.
“Uma academia de ginástica, dotada de diversos aparelhos, cujo peso total alcançava 2.298,68 Kg, sem possuir habilitação para exercício da profissão e sem possuir, ainda, o competente alvará para funcionamento”, foi dito na denúncia.
Ele foi denunciado junto com outras onze pessoas como responsáveis pelos fatos, entre dono da edificação, engenheira, e os secretários de obras da cidade. Os processos foram separados em três blocos.
No caso de Alex Sandro, a Justiça decidiu que ele não teria que enfrentar o Tribunal do Júri, destinado a crimes contra a vida. Mas o condenou pelas ações que resultaram no desabamento, mortes e lesões nas vítimas.
A condenação foi de nove meses de detenção por lesão corporal grave e mais dois anos de detenção pelas duas mortes. Sentença mantida após os recursos e que poderá ser cumprida em liberdade.
O MPES apresentou novos recursos, com o argumento de que ele deveria sentar no banco dos réus.
Segundo a advogada Georgia Ataide Ferreira, que faz a defesa de Alex Sandro, não existia academia no local. “Meu cliente informou à Justiça que equipamentos estavam sendo guardados no local. Também questionamos a informação relacionada à sobrecarga, tendo em vista que o imóvel, tecnicamente, não era uma obra regular, não foram apresentados alvarás, e era obra não concluída”, explicou.
E os outros denunciados?
Outros onze denunciados pelo MPES pela tragédia foram absolvidos pela Justiça estadual. Um dos processos envolve Sérgio Roberto Helmer, proprietário do prédio, e a engenheira Valéria Medeiros de Almeida. “Não se evidenciou os elementos do tipo a possibilitar a condenação pretendida”, foi informado na sentença, confirmada pelo Tribunal no final de outubro.
O advogado Rafael Almeida de Souza, fez a defesa da engenheira. Ele relata que no processo foi provado que houve falsificação da ART, o documento de responsabilidade técnica pela obra.
“E a perícia comprovou que o desabamento foi em virtude da instalação academia particular em um dos apartamentos. Ela não poderia ser condenada por ações que não eram de sua responsabilidade”, observou.
Outro processo foi destinado a todos os secretários de obras da cidade desde o início da construção do prédio. Entre os nove denunciados estavam Elizandro Belshoff, Fabio Anselmo Trarbach, Jaqueline Maria Stein, José Fraga Carolino, Jouberto José Comper, Moacir Da Silva Alvarenga, Tadeu Antonio Pinto, José Soares Barcellos e Nilton Falcão.
Para dois deles o processo foi extinto, um por prescrição e outro por morte. Os demais foram absolvidos. “Impõe-se a absolvição dos réus, considerando ter restado provado durante a instrução processual, que os réus não foram autores e nem tiveram participação nos fatos descritos na denúncia”, informa a sentença. Houve recurso, mas a decisão também foi confirmada pela corte estadual.
Os demais advogados não foram localizados, mas o espaço segue aberto à manifestação.
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